Pooja Gaud sempre soube que fora sequestrada. Quando foi levada por um casal, aos sete anos, a jovem indiana percebeu o que lhe estava a acontecer. Mas não teve como fugir. Conseguiu, finalmente, fazê-lo nove anos depois. Aproveitando um momento em que os seus sequestradores estavam a dormir, tirou-lhes o telemóvel e pesquisou o seu nome no YouTube. Rapidamente foi confrontada com vídeos sobre o seu desaparecimento, em Mumbai, e cartazes com contactos telefónicos.

Sete meses. Foi quanto precisou até ter coragem para pedir ajuda a Pramila Devendra, uma empregada doméstica que trabalhava na casa para onde Pooja tinha sido levada — e onde acabou a trabalhar como babysitter do filho do casal que a sequestrou. Pramila Devendra concordou em ajudá-la, sem pensar duas vezes e ligou para um dos números que aparecia no cartaz: atendeu um vizinho da mãe de Pooja, que pôs mãe e filha em contacto, conta a BBC. As duas falaram por videochamada e depois marcaram um encontro.

Todas as minhas dúvidas desapareceram imediatamente. Eu sabia que havia encontrado minha filha”, disse a mãe, Poonam Gaud, à BBC, explicando que teve a certeza que estava perante a sua filha devido a uma marca de nascença.

Após o encontro, a jovem indiana, alguns membros da família e a empregada doméstica que a ajudou a fugir foram à polícia para apresentar queixa. “Contei tudo à polícia. Até contei onde moravam meus sequestradores”, disse Pooja à BBC. Os detalhes que forneceu levou à identificação do casal, Harry e Soni D’Souza, entretanto acusado​ de sequestro, ameaças, violência física e desrespeito às leis de trabalho infantil. A polícia anunciou que o homem foi preso, mas não adiantou as razões pelas quais a mulher não foi também detida.

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Desta forma, a 4 de agosto, a jovem indiana agora com 16 anos reencontrou-se com a família. Já não voltou, porém, a ver o pai: tinha morrido há quatro meses, de cancro. Sem o único sustento da família, a mãe vende agora comida numa estação ferroviária para se sustentar a si e aos três filhos.

Sequestradores atraíram-na com um gelado. Pooja passou a ser escrava deles: “Bateram-me com um rolo de massa e as minhas costas começaram a sangrar”

Pooja estava a chegar à escola com o seu irmão mais velho, quando foi sequestrada. Só que os dois chatearam-se e o rapaz entrou na escola, deixando a irmã para trás, até porque estava atrasado. Agora, à BBC, a jovem contou o que aconteceu: estava no exterior da escola na capital do estado de Maharashtra, quando um casal lhe ofereceu um gelado. Foi desta forma que a atraíram para o seu carro. Primeiro, foi levada para Goa e depois para Karnataka, estados no oeste e sul da Índia, respetivamente. Na viagem, ameaçaram bater-lhe se chorasse ou desse nas vistas.

Durante os primeiros tempos com os seus sequestradores, Pooja foi autorizada a frequentar a escola. Mas por um curto período de tempo. Depois de o casal ter tido um filho, foi retirada da escola e todos se mudaram para Mumbai — exatamente onde vivia com a sua família antes do sequestro. Ali, tornou-se escrava do casal e do filho.

Eles batiam-me com um cinto, davam-me pontapés e socos. Uma vez eles bateram-me com um rolo de massa com tanta força que as minhas costas começaram a sangrar. Também fui obrigada a fazer tarefas domésticas e trabalhar de 12 a 24 horas seguidas”, contou à BBC.

Pooja descobriu agora que a casa onde estava sob sequestro era, na realidade, próxima da da sua família. Só que a jovem indiana não só não conhecia as estradas — Mumbai é a maior cidade da Índia —, como estava sempre a ser vigiada e não tinha dinheiro para fazer sequer uma chamada telefónica. Assim, durante nove anos, não conseguiu pedir ajuda ou tentar encontrar o caminho de casa.