“Seguuuuuuura coração”. Horas antes de começarem a sair os resultados das eleições brasileiras, o jovem Nikolas Ferreira estava nervoso — ou pelo menos era isso que demonstrava no Twitter, onde deixava mensagens ao milhão de seguidores com que conta naquela rede social. Mas não era preciso: contas feitas, o mineiro de 26 anos não só conseguiu ser eleito deputado federal, como foi mesmo o deputado mais votado do país, com 1,5 milhões de votos.

Mas quem é, afinal, o deputado que o Brasil — neste caso, no estado de Minas Gerais — elegeu com mais votos? Basta recorrer às redes sociais, o instrumento mais poderoso que Nikolas Ferreira teve em mãos, e que usou abundantemente durante a campanha (inclusivamente para alimentar polémicas em série) para começar a perceber.

Foi lá que o deputado, que já era vereador em Belo Horizonte, fez na véspera das eleições um livestream com Jair Bolsonaro, em que dizia ao presidente: “Tenho 26 anos, a juventude é muito forte aqui no meu Instagram, sou cristão e sei o quanto o senhor batalha por isso”.

As referências à religião são, aliás, uma constante nos perfis e nas intervenções públicas de Nikolas. Na madrugada desta segunda-feira, ao comemorar no Twitter a sua estrondosa eleição, escrevia assim: “O deputado federal mais votado da história de Minas é cristão e conservador. E esse ano, o mais votado do Brasil: 1.5 milhões de votos. Devo toda minha lealdade a vocês. Obrigado, Senhor. Tu és fiel”.

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Sem esquecer Bolsonaro, que apesar de ter surpreendido com um resultado mais alto do que era esperado nesta primeira volta ficou, ainda assim, atrás de Lula: “Vencemos a batalha, mas não a guerra. Continuaremos na luta. Estamos com você, @jairbolsonaro”.

Ferreira recorre tanto à sua ligação com a religião que tem inclusivamente um livro publicado — “O Cristão e a Política” — e dá palestras e cursos online com o mesmo nome. No site onde vende o curso, promete que com ele o aluno aprenderá a “proteger sua família da influência da esquerda, ter confiança para se posicionar e estar preparado para qualquer debate” e que ajudará o “cristão comum” a defender os seus valores “em qualquer lugar em que precise de debater”.

O próprio Nikolas Ferreira, que no mesmo site conta ter nascido “em berço cristão e conservador” na cidade de Belo Horizonte, diz já ter tido os seus embates enquanto debatia. E queixa-se de ter sido “cancelado”: “Cursei direito pela PUC Minas e, dentro da faculdade, fui cancelado diversas vezes por expor minhas crenças e combater as ideias de esquerda, como o feminismo, a ideologia de género, o socialismo e o aborto”.

Na sua “livraria online” — outro site em que vende o seu livro e expõe algumas recomendações de leitura — existe, de resto, uma secção dedicada especialmente a livros “contra o aborto”, tendo muitas das escolhas a ver com críticas à “perversão” e às “mentiras” do feminismo.

Como Ferreira conta, agora, aos 26 anos, é vereador — foi eleito, já pelo PL de Bolsonaro, em 2020, “sendo o segundo vereador mais votado da história de Belo Horizonte, com quase 30 mil votos”. Além de se destacar pelas referências aos temas da religião, moral e costumes, além de uma perspetiva liberal da economia, como recorda o Estadão foi um “duro crítico” das medidas de distanciamento social adotadas no pico da pandemia, no Brasil, por prefeitos e governadores por conselho dos peritos em Saúde.

Nos últimos dias, Ferreira vinha agitando as redes sociais (também tem Instagram e Tik Tok, além de gravar muitos vídeos para o Youtube) com comentários sobre a campanha.

Sobre o último debate entre os candidatos, publicou um vídeo em que ironizava: “No debate de ontem vimos que nenhum candidato é perfeito, falta sempre qualquer coisa. Por exemplo: para o Ciro falta controlo; para a Simone, competência; (…) para Lula falta honestidade, para o Bolsonaro… faltam dois dias!”. O vídeo angariou 35.500 gostos.

Já nas últimas horas, enquanto acompanhava a votação, parecia questionar a veracidade dos resultados: “Zema, Cleitinho, Bruno e eu disparados na frente, e Lula ganhando em Minas? Estranho…”, insinuava no Twitter. Conhecida a votação final, e assegurada a sua vitória como deputado, deixava uma promessa sobre a disputa renhida que se seguirá para a segunda volta: “Agora a guerra começou”.