A Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária (ASFIC/PJ) reiterou esta quinta-feira as preocupações relativamente à retirada dos gabinetes da Europol e Interpol da PJ para o Sistema de Segurança Interna, apesar das alterações propostas pelo PS.

Em declarações à Lusa, a presidente da ASFIC/PJ, Carla Pinto, referiu que as alterações apresentadas pelo PS ao diploma do Governo sobre o Ponto Único de Contacto para a Cooperação Policial Internacional (PUC-CPI) – que está em análise na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias — não respondem a todas as reservas manifestadas, assinalando que o funcionamento destas estruturas decorria na PJ sem falhas.

“A grande diferença é que deixa de estar prevista a coordenação num decreto-lei e passa a estar prevista na lei. O resto mantém-se mais ou menos como estava, portanto, continuamos a estar muito preocupados com esta saída da Interpol e da Europol da PJ. E já não somos só nós“, disse a inspetora-chefe, aludindo às “explicações” pedidas pelo Parlamento Europeu ao Governo: “As preocupações já não são só em Portugal, já extravasam o território nacional”.

Segundo a proposta de alteração do PS, que foi avançada pelo Diário de Notícias, “a chefia do Gabinete Europol e Interpol compete, por inerência, ao Coordenador de Gabinete da Polícia Judiciária”, fixando ainda que cabe ao secretário-geral do SSI, Paulo Viseu Pinheiro, definir sobre o Gabinete Nacional de Ligação “o respetivo modo de funcionamento interno e designação da chefia, a qual é exercida por um quadro da Polícia Judiciária”.

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“Continuamos a ter a questão de quem serão os operadores que vão trabalhar com estas informações. Não está garantido em lado nenhum que os operadores serão da PJ”, observou, acrescentando: “O regulamento e como tudo se passará a nível interno não está definido em lado nenhum e continuamos a achar que esta mudança não é necessária para cumprir as recomendações [europeias]”.

Por outro lado, Carla Pinto lembrou o risco de interferências ou acessos externos às informações com a passagem destes gabinetes da PJ para o SSI, que está, por sua vez, sob tutela política do primeiro-ministro. Em causa poderá estar uma separação de poderes e o comprometimento da estrutura, com um potencial risco acrescido de fugas de informação.

“Toda a informação que tem sido solicitada no âmbito da cooperação da Europol e Interpol pela PJ tem sido sempre prestada de forma célere sem qualquer reclamação ou fuga de informação (interna ou externa) e isto é algo que se deve manter. Nós não podemos assegurar isto se sair da PJ, obviamente”, alertou.

A presidente da ASFIC/PJ argumentou ainda que a reestruturação deveria ter seguido um caminho diferente, passando não pela saída dos gabinetes da Europol e Interpol da PJ e sim pela inclusão do Gabinete Nacional SIRENE no seio da Judiciária. Carla Pinto invocou ainda os exemplos de outros países, como França, Itália ou Alemanha, onde os gabinetes de Europol e Interpol e o gabinete SIRENE estão todos no mesmo órgão de polícia criminal.

“Em vez de haver uma transferência da Interpol e da Europol havia uma transferência do SIRENE. A PJ já tem a estrutura, tem os funcionários e as coisas têm funcionado sempre bem. Todo o segredo de justiça de todas as investigações que estão em curso tem-se mantido, nunca houve qualquer suspeição, irregularidade ou atraso na prestação deste tipo de informação pelos funcionários da PJ, portanto, as coisas estavam a funcionar bem”, concluiu.

No debate na generalidade da proposta, o Governo negou qualquer intenção de “politizar o sistema de justiça” ou de violar o princípio da separação de poderes com a proposta do Ponto Único de Contacto para os gabinetes da Europol e Interpol.

A garantia foi repetida diversas vezes pela ministra-adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, num debate parlamentar sobre a proposta de lei do Governo que uniu todos os partidos da oposição na crítica a uma alegada tentativa de controlo político da investigação criminal e ataque ao Estado de direito. Os partidos consideram ser esta uma alteração sem justificação da tutela destes gabinetes de cooperação policial internacional.

Todos os partidos da oposição se opuseram à proposta do Governo, tendo o Livre e o Bloco de Esquerda anunciado antecipadamente voto contra, manifestando, tal como outras bancadas, dúvidas constitucionais e esperando que a lei seja enviada pelo Presidente da República para fiscalização pelo Tribunal Constitucional.

Alguns partidos alertaram para o facto de alguém nomeado diretamente pelo primeiro-ministro e que a ele reporta, como o secretário-geral do SSI, passar a ter acesso a informação criminal que pode envolver titulares de cargos políticos.