O Tribunal Judicial de Leiria condenou esta terça-feira oito dos dez arguidos julgados num caso do rapto de uma menor para forçar casamento a penas de prisão efetiva entre cinco anos e meio e nove anos e nove meses.
O coletivo de juízes deu como provados a maioria dos crimes de rapto agravado, na forma tentada e consumada, homicídio qualificado na forma tentada, com ameaça de arma de fogo, detenção de arma proibida, dano simples e ofensas à integridade física qualificada, com alguns crimes a sofrerem alteração jurídica, condenando oito arguidos a penas de prisão entre os cinco anos e seis meses e os nove anos e nove meses.
A condenação mais baixa, em cúmulo jurídico, foi de cinco anos e seis meses de prisão, tendo a pena mais alta sido de nove anos e nove meses. A advogada que vinha acusada de um crime de favorecimento pessoal na forma tentada foi absolvida, assim como outro arguido por falta de provas do seu envolvimento.
A falta de comparência e a não notificação de uma das acusadas levou a que a juíza presidente decidisse, na primeira sessão, pela separação no processo e um julgamento à parte desta arguida.
O coletivo de juízes deu credibilidade aos depoimentos dos menores que seriam forçados a casamento. “A memória estava mais fresca e desperta” e os menores, “de forma isenta, credível e descomprometida, relataram os factos que presenciaram de uma forma muito linear e clara, que mereceram credibilidade”, considerou o coletivo de juízes.
“O tribunal ficou convencido que os depoimentos dos menores são o mais aproximado do que aconteceu naqueles dois dias e por isso valorou os factos”, reforçou a juíza.
Segundo a presidente do coletivo de juízes, “a menor tinha dito que [os arguidos] já apresentaram desculpas e que os perdoava, mas os factos são demasiado graves para serem perdoados”.
O tribunal de Leiria deu como provado a acusação do Ministério Público (MP), que refere que, no dia 29 de maio de 2021, um dos arguidos, “de acordo com os costumes e tradição ciganos”, pediu ao ofendido que a sua filha, à data com 13 anos, “ficasse noiva” do seu filho, também de 13 anos, “com vista a futuro casamento entre os menores”, tendo o ofendido concordado.
Mais tarde, o ofendido telefonou a um dos arguidos e “disse-lhe que já não pretendia dar a filha em noivado”.
Nessa sequência, alguns dos arguidos em “conjugação de esforços” (…) “engendraram um plano para subtraírem a menor” da sua residência, em Santa Eufémia, concelho de Leiria.
O objetivo, segundo o despacho, era levá-la até ao outro menor, por forma a que “mantivessem relações sexuais de cópula e, assim, levar a que os progenitores da menor acabassem por consentir no almejado casamento a celebrar segundo os costumes e tradições da etnia cigana e por força dos mesmos”.
Os arguidos deslocaram-se a casa da família e o pai do menor apontou a arma à barriga do pai da rapariga, mas a pistola encravou. Após desencravá-la, o arguido efetuou “um disparo para a parede ao lado da qual se encontrava o ofendido, provocando um buraco na parede”. E com um novo disparo atingiu o ofendido no joelho direito, lê-se na acusação.
Outro arguido tentou entrar no quarto, onde se encontrava a menor, os seus dois irmãos e o pai, chegando mesmo a “alcançar um braço da menor”.
“Alertados pelo barulho, acorreram ao local vários vizinhos e familiares dos ofendidos” e os arguidos acabaram por abandonar o local, sem antes ameaçarem os ofendidos e danificado o veículo dos mesmos.
Segundo o MP, depois de ser ameaçada, a jovem foi levada para uma residencial na Marinha Grande, onde a esperava o menor, para que ambos passassem a noite. Aquele, a “dado momento, perguntou-lhe se esta queria ‘fazer coisas’, o que significava e foi por esta entendido como ter relações sexuais, o que a menor negou”. O jovem não insistiu, adianta o MP. “Os menores não casaram de acordo com os costumes e tradições ciganos”, refere a acusação.