Morreu Fernando Gomes, antigo jogador do FC Porto e bibota de ouro, aos 66 anos. “O FC Porto está de luto pela perda de uma das maiores figuras da sua história e endereça as mais sentidas condolências à família, aos amigos e a todos os admiradores de Fernando Gomes”, escreve o FC Porto no site oficial.
Na rede social Instragram, o clube usou uma imagem do jogador com a frase “A minha missão era marcar golos e eu marquei-os. Cumpri a minha missão”. “O céu levou-nos o 9. Os golos ficam na memória de todos”, escreve o clube como legenda.
Ao longo de 40 anos, Pinto da Costa foi tomando milhares e milhares de decisões enquanto presidente do FC Porto. Nem todas terão sido as melhores, a maioria revelou-se acertada, algumas ficaram como legado de todas as outras. A contratação de Fernando Gomes em 1982, naquela que era uma das quatro curtas promessas que apresentava na corrida ao primeiro mandato como líder dos dragões, foi uma delas. E a própria forma como conseguiu resgatar aquele que continuava a ver como um dos maiores pontas de lança portugueses de sempre apesar das notícias das lesões que vinham de Espanha espelham não só a forma como andou muitas vezes à frente do tempo como também a importância do jogador para o clube.
Pinto da Costa chamou-lhe a “Operações Gijón”. Na companhia de Álvaro Pinto e Eduardo Poças, rumou a Espanha para um encontro com o presidente do Sporting local, Manolo Vega Arango, e acertou o valor da transferência nos 20.000 contos de forma faseada mais um jogo de apresentação na Invicta. Até aqui, tudo certo. Problema? Os espanhóis tinham dúvidas sobre o avançado após uma lesão no tendão de Aquiles, dissipadas com um hat-trick no jogo seguinte contra o Las Palmas. Com isso, arrependidos do que estava acordado, exigiram que o pagamento fosse feito a pronto pagamento. Todos sabiam que o FC Porto não tinha essa margem, Pinto da Costa acedeu a essa vontade – faltava apenas arranjar uma solução.
“A decisão estava tomada, era um ponto de honra no meu programa a vinda do Fernando Gomes e tinha a certeza de, com ele, podermos arrancar grandes êxitos. Tinha dois dias para conseguir os 20.000 contos (…) No almoço entre as direções dos dois clubes entreguei o cheque ao presidente, que me confessou ter informações de que não tínhamos possibilidade de o obter. Felizmente que a minha decisão deu para bem pois o Fernando Gomes foi a semente de imensos êxitos”, contou no livro “31 anos, 31 decisões”, onde explicou que isso só foi possível mediante um empréstimo contraído junto do Banco Português do Atlântico com uma livrança avalizada por Neca Couto, dono das Indústrias Couto e seu amigo pessoal.
O filho pródigo voltava novamente a casa depois de dois anos em Espanha e trazia consigo o melhor que tinha ainda para dar, reforçando o estatuto de um dos melhores avançados nacionais de sempre. Morreu hoje aos 65 anos, depois de ter lutado contra um cancro do pâncreas nos últimos três anos e sofrer um enfarte que o deixou internado sob observação nos cuidados intensivos de um hospital no Porto.
Nascido no Porto a 22 de novembro de 1956, Fernando Gomes esteve sempre ligado ao clube desde miúdo apesar de ter começado a jogar futsal e precisou mesmo de uma autorização especial para jogar na equipa de juvenis tendo apenas idade de iniciado (14 anos), naquele que foi o primeiro salto de muitos que foi conseguindo alcançar na carreira. Aos 17 anos, já com três títulos de campeão nacional alcançados pelo clube do coração, fez a estreia como sénior frente à CUF num triunfo por 2-1 onde foi a maior figura com dois golos. Entre 1974 e 1980, ganhou dois Campeonatos e uma Taça de Portugal, sagrou-se de forma consecutiva o melhor marcador do Campeonato entre 1977 e 1979 e conseguiu 125 golos. Depois, na sequência do que ficou conhecido como Verão Quente no FC Porto, foi vendido ao Sporting Gijón.
Após a final da Taça de Portugal com o Benfica, que acabou com José Maria Pedroto e Pinto da Costa a deixarem o futebol dos azuis e brancos em colisão com o presidente Américo de Sá, Fernando Gomes fez parte do grupo de 15 jogadores que se rebelaram também com as mexidas feitas nos dragões e que não compareceram no início dos trabalhos. António Oliveira e Octávio Machado saíram mesmo, o avançado retratou-se pela situação mas foi mesmo vendido para Espanha, onde praticamente não jogou em 1980/81 devido a uma grave lesão mas fez 15 golos em 29 jogos logo na temporada seguinte.
Quando voltou aos azuis e brancos, foi ainda mais arrebatador. Em termos individuais, voltou a ganhar por três vezes consecutivas a Bola de Prata de melhor marcador nacional entre 1983 e 1985 e garantiu também em 1983 (50 golos em 36 jogos) e em 1985 (46 golos em 42 jogos) a Bota de Ouro de melhor marcador na Europa que lhe valeria a alcunha do Bibota. Em paralelo, e além dos três Campeonatos, duas Taças e três Supertaças até 1989, Gomes esteve nas primeiras conquistas europeias do FC Porto como a Taça dos Clubes Campeões Europeus de 1987 (não jogou a final por lesão mas contribuiu e muito ao longo dessa caminhada), a Taça Intercontinental de 1987 e também a Supertaça Europeia de 1987. Ao todo marcou 355 golos em 452 jogos oficiais realizados em 12 épocas pelos azuis e brancos, importantes também numa fase inicial para derrubar o jejum de quase duas décadas do clube sem ganhar o Campeonato.
No final da carreira, entre 1989 e 1991, acabou por representar ainda o Sporting, numa primeira época muito aquém do esperado (nove golos em 29 jogos) mas numa segunda onde demonstrou ainda tudo o que podia fazer no futebol com 29 golos em 50 encontros de grande importância na campanha que chegou às meias da Taça UEFA. A razão voltou a ser interna, com uma “pega” com o então adjunto Octávio Machado ,depois de o capitão ter protestado com o facto de os jogadores não terem sido os primeiros a serem servidos sendo já tarde e havendo jogo no dia a seguir. Ao serviço da Seleção os números foram mais modestos, com 13 golos em 48 jogos e as presenças no Europeu de 1984 e no Mundial de 1986 com uma das maiores gerações de avançados que contava ainda como Jordão, Nené ou Manuel Fernandes.
Mais recentemente, e entre notícias pesadas como a morte da filha ou um cancro no pâncreas contra o qual luta desde 2019, voltou a ser pai e integrou pela primeira vez os órgãos sociais e a Direção do FC Porto na liderança de Pinto da Costa, ficando responsável pelo pelouro do futebol de formação depois de antes ter sido o responsável pelas Relações Externas, representando o clube nos sorteios dos dragões.