Enviado especial do Observador em Doha, no Qatar

A história foi contada no popular canal de Youtube de Jero Freixas e escrita depois pelo jornal ABC. Uma jovem que ia acabar a sua formação receberia diploma este dia 26 de novembro ao meio-dia na Argentina, à mesma hora do jogo da Argentina com o México. O pai, apesar de ter custado, não tinha dúvidas sobre o que preferia assistir. “Amo-te até ao infinito e mais um bocado, juro. Sou capaz de sacar um rim e dar-te se me pedires. Isto não, não me peças isto. Peço-te por favor. Amo-te com tudo, vou à gala, vou onde quiseres, mas a este… Nem fui receber o diploma da Universidade, podes perguntar ao avô. E vou falar com a escola, só podem estar doidos em pôr a esta hora. Eles que mudem”, atirou. Assim é o povo argentino.

Este é um país que teve um Diós chamado Maradona e um Messias chamado Lionel. No entanto, o futebol é uma religião com eles, não por eles. É isso que confere a um qualquer jogo da Argentina mais decisivo aquele carácter de última de uma vida, como o mais importante da história. Depois, é entrar no carrossel. Até ao apito inicial não há ninguém como eles, capazes de dar o que têm e o que não têm para ver aquilo que mais querem ter. A partir daí, há desespero, há tristeza, há ânimo, há esperança, há receio. Há de tudo um pouco como aconteceu com o México até a inevitável camisola 10 voltar a resgatar toda a Argentina de mais um ataque de nervos. Nesse golo, Pablo Aimar, hoje adjunto, ficou com as lágrimas nos olhos. A seguir, no 2-0 de Enzo Fernández, foi a vez de Scaloni não evitar a emoção e chorar. Assim é a equipa argentina.

É na simbiose de ambas que se vê o reflexo do que podem fazer 11 em campo por milhões fora dele e o que podem fazer os milhares presentes em Doha pelos 11. Desta vez, ao contrário do que aconteceu com a Arábia Saudita, correu bem. E a própria zona mista foi também diferente (no México quase ninguém falou).

Já depois de ter passado pela zona mista no seguimento da flash interview sem falar com os meios de comunicação internacionais, o médio do Benfica lá parou menos de um minuto junto ao local onde estavam os jornalistas portugueses para falar do jogo… e não só. “Foi um dos golos mais importantes da minha carreira e estou muito feliz por isso. Interesse de outros clubes? Não, tenho a cabeça centrada na AFA [Associação de Futebol da Argentina] e só quero aproveitar agora com os meus companheiros a pensar no último jogo com a Polónia. Titular no último jogo? Não sei…”, comentou antes de sair para o autocarro, numa noite onde marcou à quinta internacionalização e se tornou o décimo jogador do Benfica a marcar na fase final de um Mundial, apenas o segundo entre estrangeiros depois de Maxi Pereira.

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“Não esperávamos começar o Mundial a perder. Tínhamos vontade de dar a volta à situação. Sabíamos que era importante ganhar, porque, não ganhando, a situação ficava muito difícil. A vitória foi um alívio para toda a equipa, porque voltámos a depender de nós. Conheço muito bem o Enzo, tanto aqui da seleção como de já ter jogado contra ele, na Liga dos Campeões [pelo PSG]. Não me surpreende o que o Enzo tem vindo a fazer. Conheço-o e vejo-o a treinar todos os dias. Merece, é um miúdo espetacular, um jogador importantíssimo para nós. Estou muito feliz por ele e por nós, o golo que ele deu-nos tranquilidade no jogo”, elogiou na conferência de imprensa após a partida o capitão de equipa Lionel Messi.

“Hoje era um jogo importante para somarmos os três pontos depois de não termos conseguido isso com a Arábia Saudita. Tínhamos essa sensação de tristeza porque foi o primeiro jogo, é sempre difícil, há o fator da ansiedade mas hoje jogámos um encontro com muita convicção e com muita esperança e conseguimos somar os três pontos que é o mais importante. Agora temos quarta-feira com uma final com a Polónia, teremos de enfrentar com a mesma mentalidade positiva e tentar somar mais três pontos. Afirmação do Enzo? Eu partilho o meu dia a dia com ele, sei como trabalha, sei a humildade que tem e hoje acho que ainda não tomou bem noção do golaço que marcou num Mundial”, salientou depois Nico Otamendi.

Entre todos os outros muito jogadores com ligações a Portugal, mais nenhum acabou por parar mas quase todos deixaram uma mensagem ao seu respetivo clube (Raúl Jiménez foi a exceção). “Boa sorte para Portugal, boa sorte sempre para o FC Porto”, atirou Héctor Herrera. “Sim, sigo sempre sportinguista”, referiu Marcos Acuña. “O Benfica foi muito importante para mim”, soltou Ángel di María. Com Messi a ir à conferência de imprensa após ter sido eleito o MVP do encontro com o México, a zona mista estava “feita”.