O Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) decidiu na segunda-feira, em assembleia-geral extraordinária, desconvocar a greve de tripulantes da TAP cujo início estava previsto para esta quarta-feira, 25 de janeiro e que iria decorrer até 31 de janeiro.
O acordo alcançado entre sindicato e administração foi aceite pelos associados do SNPVAC, que, no entanto, deixa já a ameaça de que o cumprimento do que foi acertado será seguido ao milímetro e caso falhe a luta voltará ao terreno. Também fica já a indicação de que este é um acordo que vigorará até 31 de dezembro de 2024 ou até um momento anterior, caso seja acertado o novo Acordo de Empresa. No momento vigora o acordo temporário de emergência, no seguimento da denúncia do acordo anterior por via da situação de resgate financeiro à companhia.
Agora, e depois da entrega do pré-aviso de greve, os tripulantes iriam avançar para uma greve de sete dias, que a TAP estimou ter um custo direto de 48 milhões de euros, devido ao cancelamento de 1.300 voos.
Depois de desconvocada a greve, a TAP prometeu abertura no diálogo com os representantes dos trabalhadores.
O sindicato admitiu que houve cedências de parte a parte para desbloquear o impasse que levaria à greve, mas já disse que “houve acordo, mas continua a haver muita insatisfação” e os “problemas não desapareceram” e “ao mínimo deslize voltaremos à luta”.
O que mudou de uma semana para a outra?
As negociações entre sindicato e administração continuaram depois de na quinta-feira os tripulantes terem decidido, em assembleia-geral, manter a greve. O fim de semana foi de reuniões e na segunda-feira o sindicato voltou a pedir a opinião dos associados, que desta feita decidiram desconvocar a greve.
De uma proposta de acordo (apresentada na quinta-feira) para a que foi apresentada aos associados na segunda-feira mudaram alguns pontos. Entre eles, e que o sindicato salientou como dos mais relevantes, foi a inclusão de um ponto em que a TAP se mostra disponível “a aceitar preliminar e negocialmente” descongelar a progressão na carreira.
“No âmbito do novo Acordo de Empresa, [a TAP] aceita considerar a antiguidade de serviço transcorrida no período de vigência da ATE [acordo temporário de emergência], para efeitos de reconhecimento do tempo de carreira e de progressão profissional, aspetos que ficaram congelados ao abrigo daquele instrumento”.
Ficou também determinado, neste acordo aprovado, que a TAP suspende a partir de 1 de março deste ano (e até que haja acordo de empresa) a redução de 25% nos valores da ajuda de custo complementar (o designado per diem, que é o pagamento de uma ajuda de custo diária por cada dia em viagem). Este é um ponto novo, face à proposta anterior, e que o sindicato admite ter sido “um ganho substancial”. Na proposta chumbada já estava previsto — tal como ficou na final estipulado — que o corte salarial previsto no acordo temporário passaria a abranger salários com valores acima dos 1.520 euros e não 1.410 euros, uma decisão que tem subjacente o aumento de 7,8% do salário mínimo nacional e que foi transposto para os limites dos cortes. No acordo temporário estava estipulado que só os ordenados abaixo de 1.330 euros não seriam abrangidos pelo corte. A TAP já tinha acordado aumentar esse limite para os 1.410 euros.
Os oito milhões de euros de compensação extraordinária que a TAP já tinha aceitado atribuir aos tripulantes de cabine até 31 de janeiro deste ano será paga, a cada um dos trabalhadores, numa única prestação até, no máximo, ao mês de março (“até ao segundo mês após a aprovação do presente acordo”). A compensação desse valor já tinha ficado estabelecida, mas no primeiro acordo deixava-se para futura determinação entre as partes “o critério de elegibilidade e os prazos de pagamento”. Agora define-se o prazo de pagamento e deixa-se nas mãos do sindicato “a matriz de repartição”. De acordo com os documentos consultados pelo Observador, deixou de constar neste clausulado a menção expressa de que esta compensação seria também paga aos tripulantes que não fossem do SNPVAC.
A reposição de tripulante em voos de longo curso em aviões Airbus 321 LR ficou determinada, redigindo-se o acordo alcançado de forma a que fique sem dúvidas assumido que estes voos de seis horas ou mais (além do de Televive e outros similares) terão um total de cinco tripulantes — um chefe de cabine (CC) e mais quatro comissários e assistentes de bordo (CAB). Se na primeira versão dizia-se apenas que seria integrado mais um tripulante, agora fica expresso que serão 4 comissários e assistentes de bordo. O sindicato vai já dizendo que “caso este ponto não seja cumprido, é simples — nenhum voo sairá da base com quatro tripulantes”. A TAP “desenvolverá os seus melhores esforços” para que este elemento seja integrado em maio ou no limite em junho, pela necessidade de formação.
O tripulante que vá em lugar de passageiro pronto a entrar em serviço caso necessário (chamado de dead head crew ou DHC) — com mais de 10 horas planeadas — terá esse período de voo na contagem de tempo de trabalho e garante-lhe o descanso adicional.
Uma outra alteração do acordo final face ao inicial diz respeito ao infantário. Caso a TAP decida encerrar a creche, a empresa “aceitará os pedidos de horários flexíveis” dos pais com filhos “que estejam ou já tenham frequentado” o infantário. Com a existência do infantário, a TAP compromete-se a manter vigentes as atuais regalias.
O que está e estava já previsto de mudança ao acordo temporário?
Estas mudanças aconteceram no acordo final face à proposta chumbada na semana passada. Mas nessa proposta a TAP já se tinha comprometido a algumas medidas para tentar chegar a acordo com os tripulantes.
Haverá um prémio para os tripulantes quando for alcançado os termos para novo Acordo de Empresa. É o chamado prémio de assinatura que será atribuído aos tripulantes “associado ao inicio e conclusão” da negociação do acordo que terá de começar até 31 de janeiro. O valor não está ainda definido, mas será pago “caso o novo acordo de empresa venha a ser celebrado até 31 de dezembro de 2023”. Mas este prémio só será atribuído aos associados do SNPVAC.
Com efeitos a 1 de janeiro a TAP já se comprometeu com nova tabela para as ajudas de custo. Num voo em Portugal, a pernoita caso não fique na base passará a ser paga a 11 euros, com uma ajuda para refeição de 31 euros. Mas uma pernoita, consoante o destino, pode chegar aos 34 euros (Angola). Além disso, ficou acordado que quem voe para o Brasil tem, este ano, um aumento temporário da ajuda de custo que pode ser de 40 ou 36 euros, consoante o local. Ficou já determinado que “sem prejuízo do poder de decisão da TAP, as partes comprometem-se a partir de 1 de janeiro de 2024, a promover anualmente um acompanhamento conjunto da tabela de ajudas de custo”.
A TAP pagará 290 euros a cada tripulante por conta da formação e-learning. O sindicado fala em compensação do ano 2021. No acordo fica determinado que será pago esse valor referente a 16 horas de formação, sendo metade já pago no primeiro semestre, e o restante será pago no mês da primeira formação. Isto este ano. Para 2024 e seguintes, serão pagos 145 euros por 8 horas de formação e-learning. E sem cortes. O Sindicato compromete-se a retirar a ação em tribunal que tinha contra a transportadora por conta da ausência de formação.
Serão integrados onze trabalhadores que estão com contratos a prazo nos quadros da companhia. E a TAP compromete-se a tornar efetivos os contratos que estejam a prazo e que sejam necessários para fazer face ao aumento da tripulação nos Airbus 321 LR. O sindicato estima em 80. Haverá uma nova reunião a 26 de janeiro porque TAP e sindicato não se entendem quanto à passagem a CAB I de quem passa de um contrato a prazo a efetivo.
Desde que os calços são colocados no avião, haverá um período de 30 minutos que será incluído no tempo de trabalho remunerado.
A TAP comprometeu-se a avançar no primeiro semestre deste ano com a formação de uma nova turma de supervisores de cabine.
O tempo da atividade sindical será contado para efeitos de descanso não remunerado pela TAP.
Todos estes pontos foram agora acordados, com a certeza que serão base para as negociações que terão de começar até ao final deste mês de janeiro para alcançar um novo Acordo de Empresa.