A polícia da cidade de Memphis, no estado norte-americano do Tennessee, desmantelou a unidade policial “SCORPION” — a controversa equipa especial que no início deste mês matou o jovem afroamericano Tyre Nichols na sequência de uma operação STOP, situação que originou nos últimos dias uma onda de protestos contra a violência policial em todo o país.

Como explica a BBC, a SCORPION (acrónimo para Street Crimes Operation to Restore Peace in Our Neighborhoods, algo como operação de crimes de rua para restaurar a paz nos nossos bairros) era uma equipa com cerca de 50 elementos que tinha como principal missão policiar um conjunto de áreas específicas da cidade para procurar reduzir o crime violento.

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Porém, este sábado, depois de ter sido divulgado o vídeo das câmaras corporais dos agentes que mataram Tyre Nichols, a polícia de Memphis anunciou o desmantelamento da unidade especial.

“Hoje [sábado], os agentes da polícia de Memphis alocados à Unidade SCORPION reuniram-se com o chefe Cerelyn ‘C.J.’ Davis para discutir o caminho de futuro do nosso departamento e da nossa comunidade na sequência da trágica morte de Tyre Nichols”, lê-se num comunicado difundido pela polícia da cidade.

“No processo de ouvir intensamente a família de Tyre Nichols, os líderes comunitários e os agentes não envolvidos [na morte] que têm feito um trabalho de qualidade nas suas missões, é do melhor interesse de todos desativar permanentemente a Unidade SCORPION”, acrescenta a nota.

Segundo a polícia de Memphis, “os agentes atualmente alocados à unidade concordaram sem reservas com este próximo passo”. A autoridade explica que “as ações hediondas de uns poucos lançaram uma nuvem de desonra sobre o nome SCORPION” e, por isso, é “imperioso” que a polícia “atue de forma proativa no processo de cura para todos os que foram impactados”.

A Sky News explica que a Unidade SCORPION foi criada pela polícia de Memphis em outubro de 2021, depois de nesse ano a cidade ter registado um novo máximo do número de homicídios: foram 346 em 2021.

A unidade, dividida em quatro equipas especiais, foi criada com o especial objetivo de combater o grave problema do crime violento na cidade de Memphis, investigando homicídios, roubos de viaturas e outras formas de criminalidade. O presidente da câmara de Memphis, Jim Strickland, já usou os sucessos da unidade especial, nomeadamente as centenas de detenções e de apreensões de carros e armas, como meio de promover a sua política de combate duro à criminalidade violenta na cidade.

Àquela televisão britânica, um antigo sargento da polícia de Memphis, Mark LeSure, descreveu a unidade especial como uma equipa de “tolerância zero” que, na prática, se traduzia numa realidade: os agentes “fazem o que podem para prender pessoas”. LeSure também revelou que a unidade era composta, em grande parte, por agentes jovens, sem experiência, uma vez que há uma preocupante falta de agentes seniores nos quadros da polícia de Memphis.

Outro antigo polícia, E. Winslow Chapman, que liderou o departamento da polícia de Memphis entre 1976 e 1983, disse também à Sky News que a Unidade SCORPION era, na verdade, uma desculpa para polícias violentos assediarem os cidadãos da cidade e abusarem do seu poder.

“Os polícias estão a ser usados para transmitir a mensagem de que estamos aqui e que não vamos tolerar atividades criminosas. E isso pode, facilmente, passar dos limites, algo que obviamente aconteceu neste caso”, disse Chapman. “Eles perseguem os residentes comuns e chamam a isso policiamento de alto nível.”

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Tyre Nichols morreu no dia 10 de janeiro deste ano, no hospital, por não ter resistido à gravidade dos ferimentos que sofrera três dias antes, a 7 de janeiro. O jovem foi espancado por cinco agentes da polícia de Memphis, também eles afroamericanos, que o mandaram parar durante uma operação Stop, devido à condução imprudente do jovem. Nichols estava a regressar a casa após ter passado a tarde num parque.

O jovem de 29 anos de idade repetiu várias vezes aos polícias que estava apenas a regressar a casa e que não tinha feito nada que justificasse a violência, mas os agentes ignoraram-no, continuaram a agredi-lo — incluindo com pontapés na cabeça — e ameaçaram atingi-lo com uma arma de taser.

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O caso, mais um numa série de mortes de pessoas afroamericanas às mãos da polícia nos últimos anos, gerou grande indignação pública nos Estados Unidos. Nos últimos dias têm-se repetido protestos em várias cidades do país contra a violência policial — e este sábado por protestos ainda mais violentos na sequência da divulgação do vídeo.

Os cinco agentes policiais que mataram Tyre Nichols foram despedidos da polícia e neste momento encontram-se detidos, enfrentando acusações de homicídio em segundo grau, agressão agravada, sequestro agravado, má conduta e opressão. A polícia de Memphis confirmou que os agentes tinham violado “múltiplas políticas do departamento, incluindo o uso excessivo de força, o dever de intervir e o dever de prestar ajuda”.