Portugal e Espanha voltam a reunir-se numa cimeira esta semana, em Lanzarote, nas Canárias, com o alinhamento nos temas europeus, novos acordos na estratégia transfronteiriça comum e uma celebração do escritor José Saramago na agenda.

A 34.ª cimeira entre os governos de Portugal e Espanha ocorre apenas quatro meses depois da anterior, em novembro em Viana do Castelo, por imperativos da “intensa agenda interna” espanhola deste ano, com eleições regionais e municipais em 28 de maio e presidência da União Europeia (UE) no segundo semestre, e pela vontade de os dois países quererem manter a periodicidade anual do encontro, segundo explicaram esta segunda-feira fontes do executivo espanhol, em Madrid.

Que haja cimeira ibérica em 2023, num ano em que Espanha terá ainda eleições legislativas gerais em dezembro, “é muito positivo como mensagem”, defenderam as mesmas fontes, que realçaram como há “relações excelentes” e “grande sintonia” entre os dois governos e “grande atividade bilateral“, sobretudo no desenvolvimento da estratégia comum acordada para os territórios de fronteira em 2020, como ficará plasmado mais uma vez na declaração final do encontro e com os vários acordos que serão assinados em Lanzarote, apesar de terem passado “muito poucos meses” desde o encontro de Viana do Castelo.

Os trabalhos formais da cimeira decorrerão na quarta-feira, mas o encontro entre os dois governos arranca na véspera, com uma agenda prévia que inclui, antes de um jantar das duas comitivas, uma visita dos líderes dos Governos de Portugal e de Espanha, os socialistas António Costa e Pedro Sánchez, à casa museu do escritor português José Saramago, Nobel da Literatura em 1988 e que viveu em Lanzarote.

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Cimeira Ibérica. Costa com dez ministros em Lanzarote e uma agenda com foco na cultura

Celebrar Saramago” é celebrar uma “figura que une muito também os dois países”, realçaram as fontes da Moncloa (a sede do Governo espanhol), que explicaram que o escritor foi um dos motivos que levou à escolha de Lanzarote para local da cimeira ibérica deste ano, a que se aliou o facto de Portugal e Espanha serem dois países da UE com “ilhas importantes no Atlântico” (os arquipélagos das Canárias, Madeira e Açores).

A agenda da UE será, precisamente, um dos temas centrais no encontro, quando Espanha está a poucos meses de assumir a presidência semestral do Conselho da UE, disseram as mesmas fontes.

Em Lanzarote, Sánchez deverá “trocar opiniões” com Costa sobre a agenda europeia, “um pouco na linha” daquilo que está a fazer com périplos por capitais europeias para ouvir homólogos no âmbito da presidência espanhola da UE.

Sánchez pretende passar por cerca de 15 capitais europeias até julho, antes de Espanha assumir a presidência do Conselho da UE, e já esteve, neste âmbito, na Irlanda, Dinamarca, Finlândia, Áustria, Eslovénia e Croácia.

O objetivo destas deslocações de Sánchez é apresentar aos homólogos as prioridades da presidência espanhola e ouvir aquilo que defendem os outros Governos sobre alguns dossiês da agenda europeia, como as negociações para um pacto de migração e asilo ou o fortalecimento da “autonomia estratégica” da União.

As fontes da Moncloa sublinharam esta segunda-feira o alinhamento de Portugal e Espanha nas agendas europeias, como acontece com o debate em curso sobre as designadas regras fiscais ou de governação económica (relacionadas com limites de défice e dívidas públicas, por exemplo) ou com a energia, havendo mesmo neste caso, marcos com que os dois países se podem “congratular”, como o “mecanismo ibérico” para limitar o preço do gás usado para produzir eletricidade ou o projeto dos gasodutos para transportar hidrogénio entre a Península Ibérica e França (H2MED), alcançado entre Lisboa, Madrid e Paris.

A versão final da declaração que sairá de Lanzarote ainda está a ser negociada, mas deverá, segundo as mesmas fontes, ter referências ao compromisso com a concretização do projeto H2MED, sobretudo, a ligação entre Celorico da Beira e Zamora (CelZa), para transportar hidrogénio, que Portugal e Espanha querem que seja “hidrogénio verde”, ou seja, produzido com fontes de energia renováveis, como eólica e solar, enquanto França tem dito que gostaria que abrangesse também hidrogénio produzido com energia nuclear.

Quanto ao “mecanismo ibérico” aplicado ao preço do gás, em vigor até maio deste ano, Portugal e Espanha pediram a Bruxelas um prolongamento até, pelo menos, o final de 2023, não havendo ainda resposta.

Para além das declarações políticas, sairão da cimeira de Lanzarote novos memorandos de entendimento e “declarações de intenções” dos dois países relacionadas, sobretudo, com a estratégia de desenvolvimento em regiões de fronteira, anunciada pelos dois países em 2020, na cimeira da Guarda.

É o caso de uma agenda cultural comum para territórios de fronteira, para 2023, que contempla cerca de 40 atividades; de um memorando para impulsionar o projeto das escolas bilingues e interculturais na fronteira; de um projeto de revitalização de aldeias transfronteiriças; ou da extensão da iniciativa espanhola “campus rural” universitário a territórios transfronteiriços, que envolve a realização de estágios do ensino superior em pequenos municípios.

Desde que foi anunciada em 2020, a Estratégia Comum de Desenvolvimento Transfronteiriço de Portugal e Espanha tem sido protagonista dos acordos saídos das cimeiras bilaterais.

A estratégia abrange 1.551 freguesias, cerca de metade das freguesias portuguesas, e abarca uma área correspondente a 62% do território nacional. Do lado espanhol, inclui 1.231 municípios, correspondentes a 17% da superfície de Espanha.

Portugal e Espanha partilham a maior fronteira terrestre da UE, um território marcado, na sua maioria, pelo despovoamento. Na 34.ª cimeira ibérica, de Lanzarote, participarão, além dos líderes dos dois governos, 18 ministros dos dois países, com as pastas do Trabalho, Energia, Coesão territorial, Justiça, Infraestruturas, Educação, Cultura, Saúde e Ciência, entre outros.