O Banco de Portugal está mais otimista face ao desempenho da economia neste ano. No Boletim Económico de Março, divulgado esta sexta-feira, o supervisor financeiro liderado por Mário Centeno passa a apontar para um crescimento de 1,8% em 2023, uma melhoria de três décimas que é justificada pelo desempenho melhor do que o previsto no turismo e, em menor medida, no consumo privado. A inflação será de 5,5% em 2023 – menos do que a anterior previsão – mas irá cair para 3,2% no próximo ano, antecipa o Banco de Portugal.

A revisão em alta da projeção do Banco de Portugal já tinha sido sinalizada pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, em declarações feitas a partir da República Dominicana. Questionado pelo Observador na conferência de imprensa, sobre a oportunidade da revelação antecipada de Marcelo, Mário Centeno disse que não tem “por costume comentar as declarações do sr. Presidente da República, não me coloquem nessa difícil tarefa”. “Mantemos uma extraordinária relação institucional com o Presidente Marcelo e vamos mantê-la”, concluiu Mário Centeno

O Presidente da República também tinha apontado no sentido daquilo que o Boletim Económico agora confirma: que a tendência do crescimento económico é positiva e em 2024 o Produto Interno Bruto (PIB) deverá crescer 2%. Essa projeção relativamente a 2024 não mudou, face ao antecipado em dezembro, porém é mais otimista pelo facto de partir de uma base melhor (um crescimento superior ao previsto em 2023).

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Este Boletim Económico de Março atualiza, também, a previsão de crescimento do PIB para 2025, que passa a ser de 2% (melhor do que os 1,9% anteriormente previsto).

A evolução crescente da atividade beneficia da redução esperada da incerteza, do maior crescimento do rendimento real das famílias e do recebimento de fundos europeus, mas será condicionada pelo ambiente financeiro mais restritivo”, diz o Banco de Portugal, relativamente ao ano de 2023.

Em 2023, a inflação situa-se em 5,5%, diminuindo para 3,2% em 2024 e 2,1% em 2025, antecipa o supervisor: “a redução da inflação este ano é mais expressiva do que o projetado em dezembro, traduzindo o ajustamento nos mercados energéticos”.

A expectativa do Banco de Portugal é que “nos próximos trimestres, esta trajetória de redução assentará na evolução dos preços dos bens energéticos e alimentares, mas deverá generalizar-se posteriormente, num contexto de normalização da política monetária”.

O governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, apresenta o Boletim Económico de junho atualiza as projeções para economia portuguesa até 2024, em Lisboa, 15 de junho de 2022. TIAGO PETINGA/LUSA

BdP tem “leitura da situação económica benigna e positiva”, diz Mário Centeno.

O Banco de Portugal reconhece que os riscos destas projeções pendem para o lado negativo, no crescimento, e para o lado positivo na inflação. Porém, o otimismo do supervisor apoia-se numa expectativa de que o emprego se deverá manter “elevado”, projetando-se ganhos do salário médio real. “A taxa de desemprego aumenta para 7% em 2023, reduzindo-se nos anos seguintes, para se fixar em 6,7% em 2025”, antecipa o Banco de Portugal.

Esse é um fator importante que suporta a expectativa do Banco de Portugal de que o consumo privado irá aumentar 0,3% em 2023, num contexto de “crescimento contido do rendimento disponível real [ajustado à inflação] e pela recuperação da taxa de poupança”.

O abrandamento dos preços e a evolução dos salários contribuem para um maior crescimento do rendimento disponível real em 2024-25, permitindo um aumento do consumo privado de 1,2%, em média, a par de uma recuperação da taxa de poupança para um valor próximo do observado antes da pandemia”, diz o Banco de Portugal.

O investimento cresce 2,3% este ano, condicionado pela subida dos custos de financiamento. Porém, em 2024-25 o investimento “acelera para 4,7%, em média, continuando a beneficiar de fundos da União Europeia, em particular dos associados ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)”. Já as “exportações totais crescem acima da procura externa no horizonte de projeção (4,1% face a 2,9%, respetivamente, em média, em 2023-25), salientando-se o dinamismo das exportações de serviços”, isto é, o turismo.

“Os principais riscos para a atividade incluem o impacto da normalização da política monetária, o aumento das fricções nos mercados financeiros e o escalar do conflito na Ucrânia”, afirma o Banco de Portugal, acrescentando que “as recentes tensões nos mercados financeiros implicam riscos adicionais de magnitude incerta”. E, “na inflação, o principal risco advém de pressões internas, via salários e margens das empresas e de políticas orçamentais que estimulem a procura”.

Centeno. BdP tem “leitura da situação económica benigna e positiva”

O Banco de Portugal faz uma “leitura da situação económica que é benigna e positiva”, afirmou Mário Centeno na conferência de imprensa em Lisboa que estava originalmente marcada para as 11h00 mas que foi adiada para as 15h30, ao que não foi alheio o facto de o Governo ter marcado para esta manhã o anúncio de novas medidas para mitigar o impacto da inflação.

Mário Centeno afirmou que, no horizonte da projeção (até 2025), a economia portuguesa “retoma algumas das trajetórias que existiam antes da pandemia”. Nas contas do Banco de Portugal, o crescimento acumulado até 2025 será se 5,8% – um crescimento que se baseia na formação bruta de capital fixo (investimento), que crescerá 12,1% e nas exportações há um aumento de 12,7%. Já o consumo privado cresce “apenas”, diz Mário Centeno, 2,6%.

A composição do crescimento é compatível com um crescimento sustentável da economia portuguesa nos próximos anos“, rematou o governador do Banco de Portugal.

Banco de Portugal volta a atirar às margens de lucro das empresas

Mário Centeno voltou, porém, a atirar às margens de lucro das empresas e às tentativas de ganhos salariais acima do crescimento da produtividade – só atentando a esses dois fatores é que esse crescimento sustentável da economia portuguesa.

O governador falou nesses dois pontos mas deixou claro que o que o preocupa mais é o primeiro. Salientando que nos últimos meses houve uma reversão do choque de preços que existiu há um ano, com preços de muitas matérias-primas (energéticas e alimentares, por exemplo) a caírem de forma acentuada. Isto é algo que “tem de se traduzir nos preços pagos pelos consumidores“, sublinhou Mário Centeno, repetindo e intensificando uma ideia que já tinha lançado no passado.

O choque de preços de há um ano reverteu-se. É expectável que todos os preços que dependem destes preços também possam reverter-se nos próximos meses”, atirou o governador do Banco de Portugal.

“As margens de lucro devem seguir um processo cíclico que representou um aumento das margens de lucro nos anos passado mas que deverá, nos próximos anos, já nesta fase, iniciar um processo também ele de acomodação à nova fase que agora iniciamos e que não se compadece com aumentos das margens de lucro”, afirmou Mário Centeno, salientando que a única forma de aproveitar o ímpeto económico positivo é, “coordenadamente”, garantir que esta variável é controlada. Outra coisa será algo “míope”, que depois dos ganhos de curto prazo levarão a perdas maiores no longo prazo.

Spbre os salários, “a mensagem é simples: os salários devem evitar crescer acima da produtividade, porque colocarão nesse contexto uma pressão sobre os preços e portanto uma pressão sobre a política monetária – que não é uma pressão sobre os bancos centrais mas sobre todos nós”, afirmou Mário Centeno.

Este Boletim Económico inclui um Tema em Destaque que já tinha sido apresentado, de forma antecipada, pelo Banco de Portugal na última segunda-feira. Nesta “caixa”, o Banco de Portugal revela que o salário médio real dos trabalhadores com ensino superior ainda está 134 euros abaixo do pré-troika.

Salário médio real dos trabalhadores com ensino superior ainda está 134 euros abaixo do pré-troika