A maioria dos partidos rejeitou esta sexta-feira incluir na Constituição limites ao défice e à despesa pública, propostos pela IL, ou limites plurianuais ao endividamento, sugeridos pelo PSD, com o Chega isolado na defesa de uma “taxa plana” no IRS.
Na reunião desta sexta-feira da comissão eventual para a revisão constitucional, foi o sistema financeiro e fiscal que ocupou grande parte das mais de três horas de reunião, com propostas de alteração de PSD, Chega e IL em artigos sobre impostos e organização do Orçamento do Estado.
Pelo PSD, o líder parlamentar, Joaquim Miranda Sarmento, defendeu as propostas do partido, que passavam por incluir na Constituição o princípio de “um limite plurianual ao endividamento público no respeito pela solidariedade entre gerações”, bem como a inclusão de uma entidade independente que teria de validar o cenário macroeconómico e avaliar a proposta de Orçamento do Estado.
“A nossa democracia é marcada por um desequilíbrio estrutural das contas públicas, é importante que o país crie um consenso em torno de um equilíbrio orçamental e as mudanças neste artigo justificam-se pela solidariedade entre gerações”, defendeu.
Já a IL pretendia introduzir na Constituição que “o Orçamento não poderá prever a existência de défice orçamental, nem um volume de despesa pública que exceda 35% do produto interno bruto”, salvo em casos excecionais como catástrofes naturais ou situações de emergência.
“Não há nada mais irresponsável do que deixar dívida para as gerações futuras”, defendeu João Cotrim Figueiredo.
Na resposta, a deputada do PS Isabel Moreira recusou todas as propostas para inscrever limitações na Constituição, lembrando que o país já tem de respeitar regras europeias em matéria de défice e dívida.
“Não nos faz sentido nenhuma inscrição de qualquer tipo de dirigismo constitucional de limites quer à despesa, ao endividamento, quer no défice”, afirmou Isabel Moreira, considerando que seriam “uma prisão às opções do legislador”.
Na mesma linha, o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, considerou “o paradigma das propostas errado” e defendeu que seria uma forma “de retirar liberdade às escolhas democráticas.
“Se tal fosse aprovado reduziria em muito o caráter democrático da política orçamental”, criticou o deputado do PCP Duarte Alves, o que motivou o protesto do ex-presidente da IL por todos os outros artigos incluídos na Constituição que condicionam opções governativas futuras e contra os quais se tem batido.
Em matéria de impostos, quer PSD quer IL mantinham na Constituição o caráter progressivo do IRS, com os liberais a quererem retirar que este visa “a diminuição das desigualdades”, por considerarem que a sua principal função é recolher receitas para despesa pública, proposta também sem apoio para ser aprovada.
Mas foi a proposta do Chega, que o deputado Rui Afonso disse pretender criar a chamada flat tax no IRS (uma taxa plana, idêntica para todos os contribuintes), que gerou mais críticas, até pela forma como foi formulada, já que o texto fala num imposto “único e proporcional, combinado com um nível de isenção tributária a definir em lei especial”.
A proposta recebeu críticas políticas, com PS, PCP e BE a acusar o partido de querer “beneficiar quem ganha mais”, mas também técnicas, da parte do líder parlamentar do PSD, com o deputado do Chega Rui Afonso a acabar por admitir que a proposta mantinha algum nível de progressividade.
Pelo caminho ficarão também propostas do PSD e IL que diziam querer “reforçar a independência do Banco de Portugal” — os liberais queriam mesmo que os membros dirigentes deste órgão fossem escolhidos por concurso.
Pelo PAN, a deputada Inês Sousa Real manifestou concordância com estas últimas propostas sobre o regulador da banca, mas também se opôs a qualquer introdução de limites ao défice e ao endividamento, considerando que apresentam “perigos do ponto de vista democrático”.
“Estamos completamente confortáveis com a estrutura atual na Constituição”, foi a frase mais repetida pela deputada Isabel Moreira, numa fase da revisão constitucional em que o PS já não quaisquer propostas de alteração e apenas se tem mostrado disponível para pequenos acertos.
Foi o que aconteceu na parte inicial da reunião, em que se discutiram propostas da IL, PCP e PAN sobre a política comercial e industrial.
Se os liberais pretendiam revogar ambos os artigos — com o princípio geral de que as orientações de políticas setoriais não devem estar inscritas na Constituição -, os comunistas queriam acrescentar um novo artigo dedicado à “política do mar e das pescas” e o PAN incluir preocupações ambientais nas orientações para a indústria.
PS e PSD até manifestaram abertura para incluir as preocupações com o mar e pescas num outro artigo, mas rejeitaram criar um novo, enquanto BE, PAN e Livre manifestaram preocupações por os comunistas se referirem ao aproveitamento económico dos recursos “na água, solo e subsolo marinhos de toda a plataforma continental”.