O Hospital de Santa Cruz realizou uma técnica inovadora no tratamento de doentes com taquicardia ventricular resistente às terapêuticas convencionais, que passam muito tempo internados e têm “mau prognóstico”, avançou esta sexta-feira à Lusa o cardiologista Pedro Adragão.
“A grande vantagem da eletroporação focal é que permite usar os cateteres que usamos todos os dias, sem aumentar muito o custo e com uma grande eficácia”, adiantou o chefe do Serviço de Cardiologia e diretor da Unidade de Arritmologia de Intervenção do Hospital de Santa Cruz, que integra o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental (CHLO).
Segundo o especialista, a eletroporação começou a ser utilizada no Hospital Santa Cruz há seis meses e neste momento está a ter “uma evolução”, nomeadamente “tratar das arritmias mais complexas, com os utensílios mais apropriados e com energia mais segura e tendencialmente mais eficaz“.
Já foram feitos três tratamentos com esta terapêutica inovadora. O primeiro foi para testar a qualidade do tratamento, num doente com fibrilhação auricular.
“Ficámos muito bem impressionados. Os outros dois foram para tratar doentes que estavam à espera deste tratamento há algum tempo porque tinham tido recidivas de taquicardia ventricular após terem sido submetidos a ablações convencionais com radiofrequência. Um deles já teve alta do hospital“, salientou o cardiologista.
Pedro Adragão explicou que “a taquicardia ventricular é uma arritmia em que o coração bate depressa, muitas vezes relacionada com cicatrizes que estão no ventrículo”, sendo a causa mais frequente dessas cicatrizes o doente ter tido um enfarte do miocárdio.
“Passados anos, essa cicatriz pode levar ao aparecimento de ritmos muito rápidos e que têm risco de vida. As pessoas vão sentir-se mal e podem mesmo morrer subitamente”, salientou.
Para tratar essas taquicardias, há várias formas, sendo a “mais eficiente” tentar modificar a cicatriz, através de cateterismo.
“A forma de eliminar essa taquicardia é aplicar energia, atualmente a ablação com radiofrequência. Esta energia provoca uma queimadura e destrói as células musculares que mantêm a taquicardia“.
Contudo, a técnica tem várias limitações, nomeadamente a dificuldade de penetrar nos tecidos com cicatriz e em tratar toda a parede do músculo cardíaco, tendo por isso uma taxa de recidiva elevada: Um terço dos doentes vai voltar a ter taquicardias, disse.
A eletroporação focal é baseada numa descarga elétrica com “uma voltagem muito alta” e consegue obter o mesmo efeito sem ter efeito térmico e sem fazer coagulação.
“Faz uma necrose que é parecida com a apoptose (do envelhecimento celular), que atravessa melhor a cicatriz e que tem capacidade de penetrar profundamente nos tecidos. Eventualmente pode ser mais eficaz a evitar recidivas”, realçou.
Segundo disse, os médicos estão esperançados porque, por um lado, a técnica “é menos arriscada, não provoca coágulos e, por outro lado, tem uma capacidade ainda não totalmente conhecida, mas muito esperada de fazer uma lesão homogénea”.
“Se isso for obtido estamos numa inovação que vai permitir tratar melhor os doentes com mais eficácia e com menos risco e isso é muito importante porque estes doentes estão muitas vezes muito tempo internados, usam unidades de cuidados intensivos e têm um mau prognóstico, com uma mortalidade muito elevada”, sublinhou.