O papel pioneiro de Portugal e Espanha na utilização de novos produtos alimentares e a forma como promoveram o intercâmbio alimentar entre continentes é destacado no livro “História Global da Alimentação Portuguesa”.

A obra, sob direção de José Eduardo Franco e coordenação de Isabel Drumond Braga, vai desde a formação de Portugal “até quanto possível, à atualidade”, incluindo por exemplo um capítulo em que aborda o papel da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE).

A obra apresenta 101 textos e conta com a colaboração de 69 autores — 59 nacionais e 10 estrangeiros.

A alimentação “faz parte do quotidiano de todos”, é um “direito humano, [a] satisfação de uma necessidade fisiológica, fonte de preconceitos, interditos e prazer, motivo de exclusão e fator de diferenciação”, mas também “objeto de criatividade e arma política”, escreveu Isabel Braga na apresentação do livro, salientando a complexidade do seu tratamento, do ponto de vista cultural “e ultrapassando leituras lineares, centradas na ótica nacional”.

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A obra realça o papel de portugueses e castelhanos que encontraram novos produtos em África, Ásia ou nas Américas, e os trouxeram para a Europa e para outros espaços. Este intercâmbio de alimentos nunca excluiu rejeições e adaptações.

Do pão, ao qual é dedicado o primeiro capítulo, ao queijo e mel, a obra aborda ainda a revolução trazida pelas especiarias, o papel do azeite português no mundo, ou os receituários conventuais, não esquecendo a presença das tradições muçulmana e judaica na alimentação nacional, o cultivo do chá nos Açores e o vinho, nomeadamente do Douro, a mais antiga região vinhateira.

A historiadora Isabel Drumond Braga chama a atenção que, como noutras áreas do conhecimento, “na história da alimentação, diversos temas abrangem épocas e espaços que não se podem espartilhar nas divisões tradicionais das épocas medieval, moderna e contemporânea”, daí metodologicamente, esta obra ter optado por “perspetivar os temas sem barreiras cronológicas”.

Os autores apresentam “sínteses analíticas atualizadas, procurando mostrar os encontros, as trocas, as adaptações e as transformações”, propondo uma compreensão do “impacto dos fenómenos gerais nos espaços mais circunscritos”.

Além dos produtos, como a “omnipresente e quase invisível água”, a obra aborda práticas, como a passagem da matança [de gado] privada ao matadouro municipal”, o fumeiro, uma técnica ancestral de conservação, a “comida e a diplomacia”, a comida portuguesa no Brasil, ou a expansão do sal português na Europa, o “dar de comer aos famintos”, a alimentação dos doentes, a alimentação dos estudantes, o aspeto cénico da mesa.

São dedicados capítulos a Gil Vicente, “comidas e metáforas”, a Francisco Borges Henriques e os produtos do Novo Mundo, a João da Matta, autor de “Arte de Cosinha” (1888) e criador da receita “ameijoas à Bulhão Pato” ou dos pastéis de bacalhau, à gastrónoma Maria de Lourdes Modesto (1930-2022), ao livro de cozinha da infanta D. Maria (1538-1577), mas também “às refeições servidas pela TAP”, “O pioneirismo da revista Banquete”, entre outros.

A obra dedica textos à certificação DOP (Denominação de Origem Protegida), “à luta contra o desperdício”, nomeadamente a campanha Fruta Feia, a comida portuguesa em Itália, a dieta mediterrânica, “os doces e salgados portugueses no Oriente” ou sobre “um novo conceito de refeição: os ‘hamburguers'”.

O livro “História Global da Alimentação” é apresentado esta terça-feira, às 18h30, no El Corte Inglés, em Lisboa.