O Bloco de Esquerda considera que já se pode concluir que houve “uma atividade ilegal da parte do SIS (Serviços de Informação)” na recuperação do computador do ex-assessor de João Galamba e que, “no quadro de um estado de direito isso deve ter consequências”.

Independentemente das contradições e versões dentro do Governo, sobre o que (ou quem) esteve na origem dessa intervenção,  Pedro Filipe Soares diz que há factos “incontestados pelos diversos intervenientes” de que houve uma intervenção do SIS na noite de 26 de abril. “É óbvio que ninguém conseguiu dar uma explicação sobre em que moldes e qual o enquadramento jurídico dessa atuação do SIS. O SIS é um serviço de informações da República, não é uma polícia, não tem capacidade para andar a bater à porta dos cidadãos para ir buscar computadores”.

Ouça aqui o episódio desta semana do programa Cheque In.

Os santos e os pecadores

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Em declarações ao programa Cheque-in da Rádio Observador sobre a semana de audições na comissão parlamentar de inquérito à TAP, o deputado do Bloco explica porque é que o partido acha que seria interessante voltar a ouvir na CPI da TAP João Galamba e a sua chefe de gabinete, Eugénia Correia, (como propôs o Chega e o PS recusou). “Há declarações que não batem certo com declarações que fomos ouvindo de outros membros do Governo e faria sentido dar-lhes a possibilidade de, com estas novas informações, poderem esclarecer porque disseram o que disseram na CPI”.

Além de que, considera, o SIS não está fora do âmbito da CPI à TAP. Frederico Pinheiro, João Galamba e Eugénia Correia “falaram abertamente sobre o que aconteceu no dia 26”. Por outro lado, “todos nós temos dúvidas sobre de facto que documentos classificados” estavam no computador de Frederico Pinheiro e que relação têm com o objeto da comissão de inquérito — tutela política da gestão pública da TAP. Em particular, se as notam se resumem à reunião preparatória com a ex-presidente executiva da TAP ou há notas de reuniões realizadas antes da tomada de posse de João Galamba, já que Frederico Pinheiro era o adjunto para a TAP de Pedro Nuno Santos e de Hugo Mendes.

No entanto, para Pedro Filipe Soares essas novas inquirições não são indispensáveis para tirar conclusões sobre esta parte do processo. Daí que o Bloco de Esquerda esteja a ultimar a apresentação de uma queixa na Procuradoria Geral da República sobre a atuação dos Serviços Secretos. Para o partido, cabe às instâncias judiciais avaliar “quem tem razão e quem diz a verdade”.

E se o Bloco de Esquerda votará a favor das iniciativas (do Chega e da Iniciativa Liberal) para a criação de uma comissão parlamentar de inquérito para averiguar a atuação do SIS, Pedro Filipe Soares receia que uma CPI “que incida sobre a atuação do SIS possa ser facilmente torpedeada pelo Governo, e em particular o primeiro-ministro, dizendo que essa atuação está debaixo do segredo de Estado. Se isso acontecer, a comissão fica naturalmente limitada na sua atuação”.

Daí achar  que o “caminho mais forte para chegar a conclusões sobre o cumprimento do estado de direito” é a queixa junto da PGR. Até porque, realça, outra das conclusões do Bloco sobre todo este processo é que “o Governo não quer esclarecer o que aconteceu no dia 26 de abril e a forma como o SIS foi acionado e o que é que o SIS estava a defender porque, na verdade, passam-se semanas e quem quer prolongar esta novela é o Governo, e em particular, o primeiro-ministro”.

A propósito das contradições entre o testemunho do secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro, António Mendonça Mendes, e o ministro das Infraestruturas sobre de quem partiu a sugestão para acionar os serviços secretos, Pedro Filipe Soares afirma que não compete ao Bloco avaliar quem diz a verdade e remete mais uma vez as responsabilidades para António Costa.

“Compete-nos avaliar factos, e os factos são que o Governo prolonga uma novela para lá do aceitável, que deixa apodrecer a situação política transformando tudo isto numa espécie de pântano na expetativa que as pessoas se cansem, mas é o Governo que promove esta degradação da situação política, e que há um ministro que está sequestrado no Governo, que reconheceu que não tinha condições para continuar, que o país reconhece que não tem condições, mas que o primeiro-ministro teima em não deixar sair”.

Existiu na TAP uma “displicência total” para  “um mundo de privilégios”

O deputado que substituiu Mariana Mortágua na coordenação dos trabalhos do Bloco na CPI, garante que o partido continua focado no tema que deu origem à comissão de inquérito à TAP — a indemnização de meio milhão de euros a Alexandra Reis. Uma das conclusões do partido é a de que existe numa empresa que pediu um conjunto de sacrifícios aos trabalhadores, um “mundo de privilégios na administração” e  “uma cultura de benesses a administradores, quer estejam no desempenho de funções, quer à saída, que perpassa período em que os privados mandavam na TAP”.

Pedro Filipe Soares diz que os membros nomeados pelo Estado para os conselhos de administração “iam tendo conhecimento destes casos”. Mas percebemos que “ao contrário do que se perspetiva na vida de um comum cidadão”, a quem a Autoridade Tributária pode “fazer a vida negra” por qualquer cêntimo, “aqui havia uma displicência total na forma como às vezes milhões eram geridos e pagos a determinadas pessoas”. E promete mais revelações sobre o tema destas benesses para as audições com os responsáveis políticos que vão ser ouvidos na última semana de audições — Hugo Mendes, Pedro Nuno Santos e Fernando Medina — a partir da auditoria pedida pela própria TAP à EY e que já chegou à CPI, mas com o selo de classificado.

Entre as outras conclusões que o Bloco coloca já em cima da mesa como “factos comprovados” está a entrega da maioria do capital da TAP a privados com dinheiro da própria empresa — os chamados Fundos Airbus — “numa jogada que é criticável e, creio eu, também é criminalmente sancionável”. E as críticas não ficam limitadas à privatização promovida pelo Executivo de Pedro Passos Coelho em 2015.

Há “outro facto político relevante” decidido pelo Governo socialista que se seguiu que foi uma recompra da participação social na TAP que não acautelou a “possibilidade de os acionistas privados terem posições contrárias aos interesses da TAP e materializarem-se um conjunto de direitos” — os 224 milhões de euros da capitalização privada — que “estão na origem dos direitos reivindicados” por David Neeleman em 2020 quando a empresa estava na iminência de falir. E que “ele para proteger o seu interesse próprio e contra os interesses da empresa se colocou na lógica de conseguir ainda retirar ao Estado 55 milhões de euros.”