Morreu o escritor Milan Kundera, aos 94 anos. A morte do autor de “A Insustentável Leveza do Ser” foi noticiada pela televisão pública checa, país onde o escritor nasceu em 1929 (exilando-se, em 1975, em França). Kundera levava uma vida com pouca exposição pública e desde 1985 não dava uma entrevista.

“Infelizmente, posso confirmar que o Sr. Milan Kundera morreu ontem [terça-feira] após uma longa doença”, disse à AFP Anna Mrazova, porta-voz da Biblioteca Milan Kundera, inaugurada na sua cidade natal este ano. Já em 2021 o jornal El País referia que a saúde do escritor tinha piorado.

Milan Kundera nasceu a 1 de abril de 1929, em Brnö, na antiga Checoslováquia, filho do pianista Ludvík Kundera. Estudou em Praga, onde traduziu o poeta francês Apollinaire, escreveu poesia e foi professor de História do Cinema na Academia de Música e Arte Dramática e no Instituto de Estudos Cinematográficos.

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Foi filiado no Partido Comunista aos 18 anos, mas expulso em 1948 por “atividades anti-partidárias”. Voltou a juntar-se ao partido em 1956, mas foi novamente expulso em 1970, depois de ter participado na Primavera de Praga.

“Eu também, estava na roda. Estávamos em 1948, os comunistas tinham acabado de triunfar no meu país e eu estava de mãos dadas com outros estudantes comunistas. Então um dia disse algo errado, fui expulso da festa e tive que sair da roda” (tradução livre), escreveu o autor no livro “O Livro do Riso e do Esquecimento”, de 1978, o primeiro livro escrito já em França.

Quando a União Soviética invadiu a então Checoslováquia, em 1968, os livros de Kundera foram proibidos e retirados de circulação — e só voltaram a ser publicados no país nos anos 1990. O escritor acabou por se exilar em França em 1975, juntamente com a segunda mulher Věra Hrabánková. Durante quatro anos foi professor assistente na Universidade de Rennes, mas depois fixou-se permanentemente em Paris.

O antigo Presidente francês François Mitterrand atribuiu, em 1981, a nacionalidade francesa a Milan Kundera. Em 1979, depois da publicação de “O Livro do Riso e do Esquecimento”, as autoridades comunistas checas tinham-lhe retirado (a ele e à mulher) a nacionalidade checa, mas 40 anos mais tarde, num gesto simbólico, o governo da República Checa devolveu a nacionalidade a Kundera.

“Milan Kundera foi um escritor que alcançou gerações inteiras de leitores em todos os continentes e alcançou fama global”, disse o primeiro-ministro checo, Petr Fiala, citado pela Reuters. “Ele deixa para trás não apenas ficção notável, mas também um trabalho de ensaio significativo.”

Autor de uma vasta obra, que abrange o romance, o ensaio e a poesia, Kundera é considerado um dos mais importantes escritores do século XX e um dos autores checos mais conhecidos no mundo, depois de Franz Kafka (que morreu cinco anos antes de Kundera ter nascido).

“A Brincadeira”, de 1967, foi o primeiro romance de Kundera. O trabalho explora, com humor negro, um Estado de partido único, ao mesmo tempo que reflete a sua desilusão com o socialismo. Depois disso publicou “O Livro dos Amores Risíveis”, em 1971, “A Vida Não É Aqui”, em 1973, e “A Valsa do Adeus”, em 1976, e pensou em deixar de escrever. Mas voltou a fazê-lo, em 1979, já em França.

“A Insustentável Leveza do Ser”, de 1984, é a sua obra mais aclamada pelos leitores e pela crítica, e em muito contribuiu para o tornar num autor reconhecido internacionalmente. O romance, que se baseia na Primavera de Praga, foi adaptado ao cinema em 1988 por Philippe Kaufman e Jean-Claude Carrière. O último livro, “A Festa da Insignificância”, foi publicado em 2013, depois de mais de uma década de interregno.

Milan Kundera e Martin Amis lideram apostas para o Prémio Nobel da Literatura

Ao longo da sua vida Milan Kundera recebeu várias distinções: o Prémio Médicis (1973), o Prémio Mondello (1978), o Prémio Common Wealth (1981), o Prémio Jerusalém (1985), o Prémio Independent de Literatura Estrangeira (1991), o Grande Prémio de Literatura da Academia Francesa (2001), o Prémio Mundial Cino Del Duca (2009), o Prémio da Biblioteca Nacional da França (2012) e o Prémio Kafka (2021). Só nunca conseguiu alcançar o prémio Nobel da Literatura.

Última atualização às 12h40