Após a revolta e a incerteza iniciais, o núcleo duro de Rui Rio está agora tranquilo quanto às buscas da manhã desta quarta-feira à casa do ex-presidente do PSD e de parte do seu núcleo duro. A reação da ala rioista teve uma estratégia clara: criticar a ação da Polícia Judiciária e do Ministério Público, insistir que este é um ataque ad hominem e normalizar os factos que são, até agora, conhecidos. As buscas da manhã, como explica um antigo dirigente de Rui Rio ao Observador, caíram como uma “bomba atómica”, mas a tensão baixou quando “se percebeu o que era”. Os mesmos que acreditam que tudo será “em breve arquivado” também admitem que este processo “tornou a hipótese de uma candidatura a Belém impossível“.
O primeiro argumento rioista para a defesa do ex-líder é que a PJ e o MP nem sequer ouviram as pessoas que estavam diretamente envolvidas nas contratações. O antigo secretário-geral do PSD, José Silvano, por exemplo, garantiu ao Observador que as entidades judiciais não o contactaram nem fizeram buscas na sua casa — o que considera “estranho” já que seria ele o responsável pelas contratações do PSD e pela gestão das pessoas em causa. Além disso, questiona-se entre os rioistas: “Se os contratos estão todos na Assembleia da República porque razão as buscas são nas sedes e na casa das pessoas e não no Parlamento?”
O argumento de que os envolvidos não foram ouvidos só esbarra nas declarações do antigo secretário-geral e homem forte das finanças de Rui Rio, Hugo Carneiro, quando disse esta quarta-feira no Parlamento que “já esperava há muito tempo que isto pudesse acontecer porque praticamente todos os colaboradores quer do grupo parlamentar, quer do PSD há muitos meses foram chamados ao MP e à PJ para prestar declarações.”
“Recebiam o salário de dois lados: uma parte pela Assembleia, outra pelo partido”
Um segundo argumento utilizado pelos rioistas é que os funcionários que estavam naquela situação também seriam remunerados, parcialmente, pelo PSD. Um membro da antiga direção de Rio que acompanhou o processo considera, em declarações ao Observador, que as suspeitas “não fazem qualquer sentido”, uma vez que “o presidente do partido teve o cuidado de garantir que estas pessoas recebiam o salário de dois lados: uma parte pela Assembleia, outra pelo partido”.
O terceiro argumento é que esta é uma prática comum nos partidos. “Isto é uma coisa corriqueira nos partidos todos”, diz um antigo dirigente. Quando regressou a casa num carro clássico (um Sinca 1000), horas depois das buscas e das aparições bem humoradas à varanda de casa, Rui Rio puxava por este argumento: “Está em causa uma prática na Assembleia, dos partidos todos, as pessoas podem considerar bem ou mal”.
O quarto argumento é que tudo isto é uma represália por o presidente do PSD criticar o modo de atuação do Ministério Público e dos seus procuradores. “Tudo isto é para afetar a minha imagem, se afeta ou não, não sei. (…) Isto é para produzir notícias, estou fora da política, não conto voltar à política de certeza, estou farto disto. (…) Nem percebo do que é que andam à procura”. É a tese de que este é um ataque ad hominem para atingir o antigo presidente do PSD.
Um aspeto que vários rioistas com quem o Observador falou destacam é que, “mesmo que o processo seja arquivado amanhã”, as buscas “afetam sempre a imagem de Rui Rio”. “É algo que vai ficar para sempre”, diz um deles. “A ideia de ele poder ir Belém, que já era difícil, agora é impossível”, dizia ainda a quente, pela manhã, um rioista ao Observador.
A reação de Montenegro vista pelos rioistas e o caso de Pedro Alves
O núcleo duro de Rui Rio também manifestou algum desagrado pela forma como a direção de Luís Montenegro reagiu à notícia. “Houve falta de solidariedade. Devia ter dito logo que é prática do partido e que continua”, disse ao Observador um antigo membro do núcleo duro do ex-presidente do PSD.
Luís Montenegro quis restringir o estrago à antiga liderança e — com base na informação que chegou no mandado de busca — a sua direção escreveu que “a investigação em curso visa factos que remontam ao período de 2018 a 2021.” Esta — que foi uma das três frases que o PSD verteu em comunicado — foi assim descrita pelos rioistas como “pouco solidária”.
A reação de Montenegro levou mesmo os rioistas a denunciar que uma situação similar ocorre atualmente no grupo parlamentar. O coordenador autárquico e presidente da distrital do PSD de Viseu, Pedro Alves, foi contratado como consultor do grupo parlamentar do partido a 7 de setembro de 2022. O jornal Expresso chegou a escrever que o deputado ganha 4150 euros mensais.
Pedro Alves é pago pelo grupo parlamentar, mas faz a sua atividade como consultor fora do Parlamento. “Não tem gabinete e só cá vem quando o presidente vem”, diz um dos deputados rioistas ao Observador. A lógica é simples: se Montenegro tem telhados de vidro, não pode estar a situar as pedras entre 2018 e 2021.
O Observador questionou Pedro Alves, mas não obteve uma resposta antes da publicação deste artigo.