Os autarcas social-democratas (ASD) fizeram esta segunda-feira um balanço negativo da descentralização na Educação e na Saúde e acusam o Governo de atrasar o pagamento de verbas acordadas, pondo em causa a sustentabilidade financeira dos municípios.

A Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e o Governo assinaram um acordo em 22 de julho de 2022 sobre as áreas da Educação e da Saúde, que atualizou os termos em que estas competências seriam descentralizadas para os municípios.

Municípios e Governo assinam acordo para requalificar 451 escolas um ano após compromisso na educação

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Um ano depois, os ASD consideram que o balanço é “extremamente negativo”, afirmam que “estão cansados de que ‘a palavra dada não seja palavra honrada'” e admitem que, “se a situação não for rapidamente resolvida”, podem “devolver ao Governo as competências recebidas“.

Fazem um balanço negativo, porque o Governo comprometeu-se em apresentar propostas concretas nas duas áreas principais, falamos de Educação e de Saúde, e não as cumpriu em muitas situações. E esta situação de incumprimento põe em causa a sustentabilidade financeira das autarquias locais, mas também a credibilidade, direi eu, do próprio Governo, bem como a relação de confiança e estabilidade entre as partes”, disse à Lusa Hélder Sousa Silva, presidente da Associação de Autarcas Social-Democratas.

O também autarca de Mafra destacou a falta de atualização de verbas para refeições escolares e para o transporte dos alunos com necessidades educativas especiais, afirmou que não estão a ser transferidas as verbas dos equipamentos escolares que o Governo se tinha comprometido a transferir, não foi publicada uma portaria com os rácios de pessoal não docente para os alunos com necessidades educativas, nem foram transferidas verbas relativas a seguro de acidentes de trabalho, despesas com higiene, segurança e medicina no trabalho.

Nós estimamos, do levantamento que fizemos, que mais de 130 milhões de euros estão em dívida aos municípios, particularmente só nestas duas áreas, refeições escolares e transportes escolares”, estimou.

Na próxima sexta-feira será assinado um acordo de financiamento para a recuperação e reabilitação, pelo Governo, de 451 escolas transferidas para os municípios.

“Julgamos que muitos de nós já deveriam ter começado a fazer as intervenções nas suas escolas e perdemos o ano a decidir e a encontrar caminhos para o financiamento. E há outros autarcas que já avançaram através do quadro comunitário 2020, que ainda está em vigor, e que, neste momento, não sabem como é que vai ser feito o acerto de contas relativamente à comparticipação nacional, porque nada está dito sobre essa matéria”, acrescentou.

Hélder Sousa destacou ainda que as comissões de acompanhamento do processo de descentralização ficaram de apurar, até ao final de 2022, a relação entre a receita e a despesa que os municípios realizaram para desempenhar esta competência, mas ainda não foram feitos acertos de contas.

Certo é que todos nós apurámos essa relação entre a receita e a despesa. Por exemplo, no caso de Mafra, foi apurada uma diferença de um milhão de euros, foi pedido que fossem feitos os acertos desde dezembro do ano passado e até agora ainda não foi feito. Poderei dizer que, de todos os municípios, não se conhece um único acerto no final de um ano de execução da descentralização na área da Educação”, afirmou, destacando que “a ausência de resposta” da Direção-Geral das Autarquias Locais (DGAL) “é total”.

Quanto à Saúde, “aí a situação ainda é mais crítica“, considerou.

Entre os principais motivos estão a ausência de mapeamento e programa de financiamento para obras de requalificação de edifícios dos centros de saúde e das unidades de saúde em mau estado, que o Governo deveria ter apresentado à ANMP até 31 de dezembro para validação, além de faltar também definir critérios e rácios de trabalhadores e de viaturas por centro de saúde e ainda os seguros, higiene e medicina dos trabalhadores.

“Por outro lado, também o que tem levado muitos dos meus colegas a não aceitarem a assinatura dos autos são a discrepância das rubricas e dos valores propostos pelas ARS [Administração Regional de Saúde] que são diversos a nível nacional”, disse.

“Também notámos alguns relatos de pressão política que nós não aceitamos relativamente aos municípios que ainda não assinaram o auto, sob pena de não poderem aceder ao PRR para requalificação dos edifícios dos centros de saúde. Portanto, esta questão de dizer que só há PRR se assinar o auto quando os autarcas não se reveem nos autos, parece-nos a nós que não é caminho que deve trilhado“, acrescentou.

Relativamente às transferências na Ação Social, que não fez parte deste acordo, mas de um outro assinado com o Governo em 3 de janeiro deste ano, Hélder Sousa afirmou que “as queixas que chegam têm sido reduzidas”, pelo que os ASD fazem, para já, uma avaliação positiva, uma vez que as verbas quase que duplicaram, para cerca de 93 milhões de euros.

Entre as 22 competências que o Governo passou para os municípios, Hélder Sousa Silva destacou ainda que, quanto às vias rodoviárias, uma área que considerou crucial, o processo está “parado”, o que atribuiu a alguma ambiguidade no processo e a “uma perfeita dessintonia entre o Governo e a própria Infraestruturas de Portugal”, sem que tenham sido estabelecidos prazos para a conclusão do processo.