Até esta terça-feira, a ideia generalizada de todos os que têm acompanhado a Volta a França era de que, entre Tadej Pogacar e Jonas Vingegaard, o vencedor da prova seria decidido nos detalhes. No único contrarrelógio da edição de 2023, porém, o dinamarquês da Jumbo-Visma optou por facilitar as contas — e ganhou a etapa com um impressionante minuto e meio de distância para o esloveno, reforçando a camisola amarela à entrada para a etapa rainha desta quarta-feira.

O triunfo foi tão retumbante que até o próximo Vingegaard, entrevistado depois do contrarrelógio, assumiu que não estava à espera de uma distância tão grande. “Acho que hoje até me surpreendi a mim próprio. Não esperava sair-me tão bem, para ser honesto. Desde manhã que me sentia bem, desde as primeiras pedaladas. Queria dar o máximo no início, conversar alguma energia na parte plana… Os meus números estavam tão elevados que até pensei que o medidor de potência da bicicleta estava estragado. Se o Tour está resolvido? Não, ainda faltam muitas etapas duras. Temos de continuar nas próximas etapas. Estou ansioso”, atirou o ciclista de 26 anos.

De se lhe tirar o capacete: Vingegaard apostou tudo no contrarrelógio, deu ao pedal mais do que todos e fugiu a Pogacar

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Já Pogacar, que sofreu um duro golpe nas ambições de chegar à terceira vitória na Volta a França, procurou manter o otimismo. “Não podia fazer muito mais, estava a dar o máximo. Não foi meu melhor dia, mas o Tour não acabou. Ganhou-me muito tempo, mas vamos tratar de recuperá-lo. No entanto, é evidente que será muito mais duro do que no ano passado. Ainda faltam duas etapas duras… Na minha opinião, as mais difíceis deste Tour. Tudo pode acontecer. Qualquer um pode ter um dia mau”, explicou o esloveno, que ficou a 1 minutos e 48 segundos da liderança de Vingegaard depois de vários dias em que a diferença entre os dois não passou de escassos segundos.

Esta quarta-feira, na 17.ª etapa da prova, Vingegaard tinha a oportunidade de dar o golpe de misericórdia a Pogacar e Pogacar tinha a oportunidade de provar que Vingegaard ainda não pode festejar. Os 166 quilómetros entre Saint-Gervais Mont-Blanc e Courchevel incluíam a subida aos 2.304 metros do Col de la Loze, o ponto mais alto de todo o percurso da Volta, e depressa se percebeu que o tal “dia mau” de que o esloveno tinha falado poderia mesmo acontecer… Com ele.

Pogacar caiu logo na reta inicial da etapa, perdendo equilíbrio ao tocar na roda de outro ciclista, mas depressa voltou à bicicleta (apesar das marcas visíveis no joelho esquerdo) e retomou o percurso, reintegrando o pelotão alguns quilómetros mais à frente. A descida do Col des Saisies trouxe a primeira tentativa de fuga, com Julian Alaphilippe, Giulio Ciccone e Krits Neilands e cavarem cerca de 20 de vantagem para um pelotão onde estavam Vingegaard e Pogacar.

O grupo dos três fugitivos contava já com 10 elementos por volta do quilómetro 50, abrindo-se um pelotão intermédio a cerca de 18 segundos onde estavam Pello Bilbao, Simon Yates e David Gaudu. A Jumbo-Visma ia marcando o ritmo do grupo que liderava a corrida, sem que a UAE Emirates esboçasse alguma intenção de responder — tornando-se cada vez mais claro o cenário de que Tadej Pogacar iria apostar ou provável tudo ou nada na subida ao Col de la Loze.

Egan Bernal caiu a cerca de 50 quilómetros do fim, depressa regressando à bicicleta para continuar o percurso, e foi nessa altura (e depois de já ter estado a mais de três minutos da fuga) que o pelotão começou a mostrar vontade de intensificar o ritmo e lançar alguém para a vitória. A subida ao Col de la Loze — 28,3 quilómetros com uma média de 6% de elevação — trouxe uma quebra sustentada da vantagem do grupo da frente. E trouxe o momento claro em que o Tour acabou.

A cerca de 15 quilómetros da meta, Felix Gall (AG2R) soltou-se do grupo dos fugitivos e iniciou um claro ataque à vitória. Mais atrás, o grupo dos favoritos onde estavam Vingegaard e Pogacar mantinha a recuperação — até que Pogacar começou a ficar para trás. O esloveno foi perdendo ritmo e terreno até ficar a 40 segundos de Vingegaard, distância que se alargou para mais de dois minutos quando o dinamarquês optou por atacar sozinho e acelerar para ir atrás da liderança de Gall (com Majka e Yates ainda pelo meio).

Felix Gall chegou ao topo do Col de la Loze a liderar e já não deixou fugir a primeira vitória numa grande volta na curta e rápida e descida até à meta, seguido por Simon Yates e Pello Bilbao e com Vingegaard a terminar em quarto e à frente de David Gaudu e Chris Harper. O piloto dinamarquês voltou a vincar a superioridade face a Pogacar, reforçou a camisola amarela e deixou a distância para o esloveno nuns impossíveis sete minutos e 35 segundos, tendo a revalidação da conquista da Volta a França praticamente confirmada a quatro etapas do final.