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O que se tem debatido no Estoril desde 2009?

Este artigo tem mais de 1 ano

As conversas nas Conferências do Estoril começaram há 14 anos. Todos os grandes temas que preocuparam, agitaram e entusiasmaram o mundo passaram por aqui. Este ano, há mais debates.

Em 2002, as conferências foram retomadas após a pandemia
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Em 2002, as conferências foram retomadas após a pandemia

joao.vasco

Em 2002, as conferências foram retomadas após a pandemia

joao.vasco

Em 2009, o mundo era suficientemente diferente do de hoje para que a primeira edição das Conferências do Estoril, realizada nesse ano, tivesse debatido aquilo a que se chamou “o momento Obama” (Barack Obama fora eleito Presidente dos Estados Unidos meses antes) e a reação à crise dos subprime que, na Europa, ainda não atingira o ponto mais crítico. Mas, como lembrou Miguel Pinto Luz, vice-presidente da Câmara de Cascais e presidente da Fundação Nova SBE, na abertura da edição de 2022,  se os tempos são outros, “as Conferências do Estoril souberam sempre acompanhá-los”.

Neste mundo em permanente mudança, ao longo das sete edições já realizadas, este evento, até aqui de periodicidade bianual, também conseguiu manter algumas constantes que se tornaram o seu ADN, como a preocupação com as liberdades e garantias dos cidadãos de todo o mundo ou a necessidade de encontrar respostas globais para problemas que também o são. Por isso, quando se escrever a história das Conferências, haverá que recordar momentos como aquele em que o escritor moçambicano Mia Couto, em 2011, falou sobre o excessivo poder do medo nas nossas vidas; ou outro, já em 2017, em que, com a colaboração do artista Vhils, foi lançado um alerta em forma de vídeo, sobre a tragédia dos refugiados. O mote era a frase “Estamos todos no mesmo barco” e o  impacto dessas palavras crescia quando nas jangadas víamos pessoas aterrorizadas que podiam ser os nossos vizinhos ou familiares. Afinal, o lema dessa edição era, precisamente, “Migration: Leaving home in a globalized world”. O que não é de somenos para um concelho, como Cascais, que gosta de lembrar como, durante a Segunda Guerra Mundial, foi porto de abrigo para milhares de pessoas que tentavam escapar a uma Europa em guerra.

13 mil participantes, de 105 nacionalidades

Ao longo do tempo, estas conferências souberam cativar intervenientes das áreas política, empresarial, universitária e da sociedade civil, num total de mais de 13 mil participantes, de 105 nacionalidades diferentes, entre os quais vários Prémios Nobel e investigadores de diferentes áreas disciplinares, mas também muitos decisores de topo. A primeira edição realizou-se a 7, 8 e 9 maio de 2009.

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Com lugar no Centro de Congressos do Estoril, essa 1.ª edição das Conferências do Estoril contou com cerca de 30 oradores, entre os quais Belmiro de Azevedo, José María Aznar, Joseph Stiglitz, Mary Robinson, Radha Kumar, Tariq Ramadan ou Tony Blair. Os três dias de conferências foram divididos em quatro painéis: “Arquitetura Multilateral e Desafios Globais”, “Negócio Internacional e Desafios Locais”, “Recursos e Sustentabilidade” e “Valores, Identidades e Mercados: a Globalização é Governável?”.

Tony Blair paticipou na 1.ª edição das Conferências do Estoril

Este formato (divisão em poucos painéis, mas todos eles de temática tão abrangente como impactante, desde a globalização às migrações, passando pelos desafios colocados às democracias) manter-se-ia nos anos seguintes. Em 2011, quando se realizou a segunda edição, os piores receios de uma crise mundial tinham-se confirmado, obrigando ao socorro financeiro de vários países da zona Euro, incluindo Portugal. Como não poderia deixar de ser, este tornar-se-ia um dos temas principais destas conferências, que reuniram figuras como Dominique de Villepin, Francis Fukuyama, Mia Couto, Mohamed ElBaradei ou Nouriel Roubini. Em foco estiveram ainda desafios políticos como a Primavera Árabe e a construção da União Europeia no período que se seguiria à crise financeira. O que ainda não se sabia é que esse futuro teria de ser construído sem um player de peso: a Grã-Bretanha.

A capacidade de atrair grandes nomes internacionais manter-se-ia na terceira edição, realizada nos dias 20, 21 e 22 de Maio de 2013, com a participação de Ana Palacio, Anthony Giddens, Christopher Pissarides, Frederik De Klerk, Hans Rosling, Herman Van Rompuy, Kolinda Grabar-Kitarovic, Lech Walesa, Shirin Ebadi. Os temas, sempre em torno da globalização, focaram-se na educação e no futuro do trabalho para os millennials; as desigualdades sociais e os problemas que estas colocam ao bom funcionamento da democracias. Em cima da mesa esteve também o papel da China nas relações internacionais, partindo do pressuposto de que esta é, cada vez mais, uma potência mundial.

O tema das relações internacionais voltaria a estar em força na edição de 2015, com o antigo campeão do mundo de xadrez e ativista russo, Gary Kasparov, o antigo secretário-geral da NATO, Anders Rasmussen, e José Manuel Durão Barroso a debaterem questões como a anexação da Crimeia pela Rússia ou a intervenção deste mesmo Estado na zona leste da Ucrânia. Também o então primeiro-ministro português, Pedro Passos Coelho, participou nas Conferências, integrando o painel que discutiu as questões relacionadas com a resolução de problemas globais num mundo em rede.

O surfista McNamara já esteve nas Conferências do Estoril

HENRIQUE CASINHAS / OBSERVADOR

Numa iniciativa aberta à polémica e ao contraditório, nomeadamente em torno de temas políticos ou económicos, um dos assuntos mais consensuais (e cada vez mais presente) é o das alterações climáticas e o da luta pela sustentabilidade  ambiental. A edição de 2017 foi muito marcada pela intervenção de Rajendra Pachauri, Prémio Nobel da Paz 2007, que realçou a importância vital e a urgência desta luta: “Façam pressão sobre os líderes mundiais”, exortou. “Os jovens têm a força da persuasão e esse é um poder inimaginável. Levantem os braços os que estão dispostos a aderir ao Movimento “. Referindo-se a Portugal como um dos países mais vulneráveis devido à extensão da sua costa, Pachauri apontou a subida do nível do mar como um dos efeitos inevitáveis do aquecimento global. Rajendra Pachauri, que viria a morrer em 2020, interveio também no painel “O Poder dos Prémios Nobel” onde, em conjunto com Bernard Kouchner (Fundador dos Médicos Sem Fronteiras, Prémio Nobel da Paz 1999), José Ramos Horta (Prémio Nobel da Paz 1996 e antigo Presidente da República de Timor-Leste) e Jody Williams (Nobel da Paz 1997, Presidente da Nobel Women’s Initiative, nos Estados Unidos), debateu a atualidade, os desafios do futuro e o papel dos vencedores deste prémio na promoção da mudança.

Nessa edição de 2017, um dos discursos mais aclamados pelo público seria ainda o de Fareeda Khalaf, “a rapariga que venceu o Estado Islâmico”, título do livro em que conta as atrocidades que viveu aos 19 anos,  quando combatentes do Estado Islâmico atacaram e saquearam a sua aldeia, no Norte do Iraque, perto da Síria.  Pertencente à minoria iazidi, Fareeda denunciou não apenas a violência a que foi sujeita mas também o ostracismo a que mulheres vítimas de violação, como ela, são alvo no seio da sua própria comunidade.

Uma nova casa para as conferências

Por razões diferentes, a sexta edição, em 2019, foi uma das mais marcantes, já que foi aquela em que a recém-inaugurada Nova School of Business & Economics (Nova SBE), em Carcavelos, se tornou a casa do evento, assumindo também a sua organização, em colaboração com a Câmara Municipal de Cascais. Na ocasião, o presidente da autarquia, Carlos Carreiras, frisou: “Esta é uma nova casa, com o mesmo compromisso com a liberdade, o pluralismo e o humanismo”.

Nesse novo espaço, foram tratados temas como a justiça global no palco da Lusofonia, num painel em que participaram a cantora e compositora brasileira Adriana Calcanhotto, o escritor angolano José Eduardo Agualusa e o presidente da Câmara de Cascais, que afirmou que o que tem faltado à comunidade lusófona é “ambição e a falta de noção de que somos uma grande potência económica e, sobretudo, cultural”.  Nesta mesma conferência em nova sede, Anne Applebaum, colunista do The Washington Post e Prémio Pulitzer de Não Ficção em 2014, defendeu uma visão otimista sobre o futuro da democracia, mas alertando para o facto “de esta se ter tornado tão bem-sucedida que votar já não é visto como um privilégio ou um direito, mas sim uma chatice”, acrescentando ainda que, mesmo assim, “as maiores ameaças à democracia costumam vir de dentro do sistema”.

A cooperação internacional é um dos temas sempre presentes.

joao.vasco

Em  2022, depois da interrupção, ditada pela pandemia, a Nova SBE voltou a receber mais de 50 oradores que participaram em mais de 20 sessões sobre temas tão diversos, mas sempre ligados entre si, como as alterações climáticas, os desafios dos sistemas económicos e o modo como estes são desenhados, o caminho para a sustentabilidade e a responsabilidade das empresas, bem como a relevância da tecnologia para escalar o impacto social e ambiental. Mas a edição de 2022 foi ensombrada pela necessidade de enfrentar uma nova realidade: a de uma nova guerra na Europa. O que talvez não se esperasse é que, um ano depois, o conflito entre Rússia e Ucrânia continue sem fim à vista.

Agora com periodicidade anual, as Conferências do Estoril voltam à Nova SBE, já nos próximos dias 1 e 2. Com o tema genérico “Re-humanize our world”, há muito para discutir, como poder ver no programa completo.

Este artigo faz parte de uma série sobre as Conferências do Estoril, evento do qual o Observador é media partner. Resulta de uma parceria com a Nova Medical School, a Nova School of Business and Economics e a Câmara Municipal de Cascais. É um conteúdo editorial independente.

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