O Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS), conhecido como a “almofada” que serve para pagar pensões caso o sistema entre em défices recorrentes, foi reforçado este ano em 2,6 mil milhões de euros e, segundo cálculos do Governo, em 2024, se tivesse de ser ativado, garantiria o pagamento de pensões durante um ano e dez meses. A expectativa é que cumpra o seu objetivo de assegurar dois anos de pensões em 2025. Para reforçar esta almofada, o Governo vai, no próximo ano, transferir uma “receita fiscal nova” que advém de parte do IRS.
“É uma receita nova que é criada e que não está a redirecionar uma receita existente. É criada e será afeta ao Fundo com esta prioridade que temos assumido sempre, de estarmos a procurar reforçar o FEFSS, o que tem dado bons resultados”, explicou a ministra da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, durante a apresentação da proposta de Orçamento de 2024 para a pasta que tutela, esta quarta-feira.
A “nova receita fiscal” a que Mendes Godinho se refere advém do englobamento de mais-valias. Determina a proposta de Orçamento que “constitui receita do FEFSS a parte proporcional da coleta do IRS que corresponder ao englobamento obrigatório dos rendimentos previstos no n.º 14 do artigo 72.º do Código do IRS”, sendo que a “parte da coleta proporcional do IRS” é “determinada em função do peso dos rendimentos obrigatoriamente englobados”, “no total de rendimentos líquidos auferidos pelo sujeito passivo”.
A lei do OE de 2022 tornou obrigatório o englobamento dos rendimentos resultantes de mais-valias mobiliárias quando os ativos em causa forem de curta duração. A alteração entrou em vigor em 2023 pelo que só haverá liquidação em 2024. Por isso, o Governo diz ainda não ter uma previsão do valor que será depositado no FEFSS a partir desta nova fonte de financiamento.
Esta nova receita do FEFSS terá de ser “aplicada em títulos representativos de dívida pública portuguesa, ou outros garantidos pelo Estado Português”.
FEFSS garantirá 22 meses de pensões em 2024. Objetivo dos dois anos poderá ser atingido daqui a dois anos
O FEFSS foi criado nos finais da década de 80 como uma reserva para que o Estado conseguisse assegurar o pagamento de pensões caso o sistema previdencial entrasse em défices recorrentes (devido a uma despesa, por exemplo, com pensões superior às receitas de contribuições sociais). Até ao momento nunca foi utilizado.
O FEFSS é alimentado por fontes que advêm do previsto na lei de bases da Segurança Social, incluindo os saldos anuais do sistema, mas também por outras fontes complementares definidas em sede de Orçamento do Estado, como as transferências do Adicional ao IMI, uma parcela do IRC e o adicional de solidariedade sobre o setor bancário. Mantendo-se essas condições, “estima-se que o Fundo não se esgote até ao fim do horizonte da projeção aqui considerado” (que vai até 2070), prevê o relatório. Para esta projeção assumiu-se uma rentabilidade média anual intrínseca de 4,39%, ainda que mais baixa no início do período.
Em 2023, o FEFSS foi reforçado, por estas vias, em 2,6 mil milhões de euros, um valor que segundo o secretário de Estado da Segurança Social, Gabriel Bastos, resultou dos seguintes contributos: 2 mil milhões provenientes de transferências de saldos e cerca de 600 milhões da consignação do adicional sobre o setor bancário, o AIMI e a parcela de IRC. Há uma semana, o Eco noticiou que o FEFSS fechou 2022 com perdas de 13% devido à elevada exposição à dívida nacional. Nesse ano, segundo as contas do Governo, foram transferidos mais de 3 mil milhões de euros para esta almofada.
Segundo o relatório sobre a sustentabilidade da Segurança Social que acompanha a proposta de Orçamento do Estado, o Governo estima que o FEFSS terá, em 2024, 33 mil milhões de euros que poderiam, em tese, ser usados de forma a evitar que os défices da Segurança Social sejam suportados pelo Orçamento do Estado.
“Em 2024, estima-se que o valor do FEFSS corresponda a 11,8% do PIB e a 183,3% dos gastos anuais com as pensões do sistema previdencial (não estão consideradas transferências para a CGA, Marconi e outras situações com transferências do Orçamento do Estado), atingindo dois anos da despesa com pensões antes de 2030. Na década de 2060 prevê-se que o valor do fundo possa corresponder a mais de 20% do PIB e a cerca de dois anos e meio dos gastos com as pensões do sistema previdencial”, lê-se.
Segundo a ministra Ana Mendes Godinho, em 2024, no cenário teórico em que o FEFSS tivesse de ser ativado, conseguiria assegurar 22 meses de pensões, um valor acima dos 14 meses de 2015.
A ministra elencou como uma prioridade a diversificação das fontes de financiamento do FEFSS. Para isso, foi criada uma comissão que vai apresentar conclusões no final de janeiro. Em função dessas conclusões, o Governo decidirá sobre “outras medidas” que “poderão ser adotadas para continuar este caminho”.
Em 2024, o Governo estima que, pela primeira vez, as receitas da Segurança Social ultrapassem os 40 mil milhões de euros fruto do aumento do emprego e dos salários, enquanto as despesas vão chegar aos 36,6 mil milhões, também um recorde. Segundo o relatório que acompanha a proposta de Orçamento, os primeiros saldos negativos do sistema previdencial são esperados “até meados da década de 2030, podendo atingir valores negativos inferiores a 1% do PIB a meio da década de 2040″.