Estão a avolumar-se os sinais de aproximação entre o Ministério da Saúde e os sindicatos médicos, o que pode indiciar que na reunião extraordinária, marcada para esta quinta-feira, as duas partes deem passos importantes — embora não definitivos — em direção a um acordo que, nomeadamente, evite a paralisação das urgências hospitalares. Se, do lado do governo, o ministro da Saúde garante que está “muito disponível” para se aproximar das reivindicações dos médicos, os sindicatos parecem também estar dispostos a suavizar as exigências, pelo menos em relação à velocidade dos aumentos salariais que propõem.
Na segunda-feira, o Ministério da Saúde convocou os dois sindicatos médicos (a Federação Nacional dos Médicos e o Sindicato Independente dos Médicos) para uma reunião extraordinária, no dia 12 de outubro, às 15 horas, depois de mais de 17 meses de um processo negocial que terminou em meados de setembro, sem acordo, e que levou os médicos de novo às greves e à criação de um movimento inorgânico (do qual já fazem parte mais de 2500 profissionais) que recusa fazer mais horas extra do que as estipuladas na lei, e que está a criar dificuldades no preenchimento das escalas de muitas urgências hospitalares.
Governo “parte com proposta diferente”, sindicatos admitem aproximação
Perante uma situação cada vez mais difícil nos hospitais, que se agravou de forma significativa na última semana, Manuel Pizarro chamou de novo os médicos para negociações. O ministro da Saúde admitiu, esta terça-feira, que o governo “parte para esta ronda negocial com uma proposta diferente”, embora se recuse a revelar qual. “Para haver acordo são precisas duas partes e, portanto, procurarei fazer a minha parte”, disse o governante, citado pela Lusa, à margem de uma visita ao hospital de Santa Maria. Já esta quarta-feira, o ministro da Saúde reafirmou que a tutela está “muito disponível para se aproximar das preocupações dos profissionais”, num sinal claro de que o governo se prepara para ceder nalguns dos pontos em discussão.
Em declarações ao Observador, também os responsáveis máximos dos dois sindicatos médicos mostram disponibilidade para se aproximarem da posição do governo. Para cima da mesa, o Sindicato Independente dos Médicos (SIM) levará uma proposta de aumento faseado do rendimento dos médicos ao longo dos próximos anos, deixando cair, assim, a exigência de um aumento imediato de 22% que, sublinha o secretário-geral do SIM, se justificaria, de modo a recuperar o poder de compra perdido pelos médicos ao longo da última década. “O SIM entende que é necessária a recuperação dos 22% de poder de compra perdido ao longo dos anos, mas aceitamos mitigar o ajuste salarial ao longo dos próximos três anos, somando, naturalmente, a inflação que se vai verificar”, sublinha Jorge Roque da Cunha, que diz ter a expectativa de que Manuel Pizarro “apresente uma proposta séria, que faça os médicos ficarem no SNS”.
Sempre mais radical, a Federação Nacional dos Médicos (FNAM), que exige um aumento de 30% para todos os médicos, mantém as reivindicações. No entanto, a presidente da estrutura sindical admite que, tal como a tutela terá de ceder perante os sindicatos, também a FNAM terá de se aproximar da posição do governo. “O ideal seria haver uma cedência do Ministério da Saúde em todos as reivindicações. Mas sabemos que isso não vai acontecer, tem de haver uma aproximação de posições“, reconhece Joana Bordalo e Sá.
A Federação Nacional dos Médicos não abdica de um aumento salarial superior à atual proposta do governo, que propõe uma atualização transversal de 3,6% para os médicos que não aderirem ao novo regime de dedicação plena. A FNAM insiste, no entanto, que o regime de dedicação plena proposto pelo Ministério da Saúde (e que contempla um aumento remuneratório de 33%) não garante a conciliação da vida profissional com a vida pessoal, uma vez que os clínicos que aderirem a esse regime terão de realizar mais horas extra (250 anuais em vez das atuais 150), para além de ficarem sem descanso compensatório depois de uma noite de trabalho. Para além disso, sublinha Joana Bordalo e Sá, este modelo prevê um aumento da jornada laboral para nove horas diárias e trabalho ao sábado para os profissionais que não trabalhem no serviço de urgência.
Apesar da aparente aproximação de posições, a reunião desta quinta-feira não deverá ser suficiente para o governo e os médicos chegarem a um acordo que coloque fim à contestação dos profissionais e ao cenário de crise que se vive em várias urgências hospitalares e que, nas próximos dias, pode estender-se à região de Lisboa. Uma fonte do Ministério da Saúde, ouvida pelo Observador, admite os temas a tratar são “sensíveis” e que se devem seguir outras reuniões entre as partes.