O Governo, na proposta para o Orçamento do Estado para 2024, garantia que “o novo Quadro Plurianual das Despesas Públicas (QPDP), definindo os limites de despesa para cada missão de base orgânica, nos termos da nova Lei do Enquadramento Orçamental, dá continuidade ao desenvolvimento consistente de uma perspetiva plurianual no processo de planeamento orçamental, contribuindo dessa forma para a definição de prioridades de política pública numa perspetiva de médio prazo”. No relatório que acompanha a proposta orçamental o Governo diz mais. Assume que “os limites da despesa fixados em abril de 2023 foram assumidos como vinculativos para o ano económico seguinte (2024), o que constitui uma inovação relevante para a gestão de prioridades e de recursos dos vários setores e um fator determinante de estabilidade e viabilização do trabalho de distribuição de dotações orçamentais pelas entidades e subsequente preparação dos seus orçamentos. O quadro plurianual fixado em abril constituiu efetivamente, pela primeira vez a base do Orçamento do Estado para o ano económico seguinte”

Só que desde a publicação desse quadro plurianual até à proposta de Orçamento houve um desvio de 9,4 mil milhões de euros na projeção da despesa.

O alerta é deixado pelo Conselho das Finanças Públicas (CFP), no parecer divulgado esta quarta-feira, 25 de outubro, sobre a proposta de Orçamento, que o Governo apresentou a 10 de outubro.

A despesa teria, segundo o documento de abril, de ficar limita aos 347.290 milhões de euros, mas no Orçamento faz-se deslizar esse limite para os 356.702 milhões.

“O desrespeito pelo limite anual de despesa total para o ano económico seguinte, que à partida deveria ser vinculativo, demonstra a prevalência da lógica orçamental anual em detrimento da perspetiva de médio e longo prazo, ainda que legalmente possível em virtude da redação introduzida na Lei de Enquadramento Orçamental em 2022”, o que “compromete a responsabilização orçamental no médio e longo prazo e reflete desde logo a difícil capacidade de planear a despesa em termos plurianuais, calendarizando-a e procedendo à respetiva programação financeira”.

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A Lei de Enquadramento Orçamental, recorda o CFP, já indica, por seu lado, o destino dos excedentes orçamentais. Mas o CFP faz um alerta: “Em caso de materialização dos riscos descendentes, o excedente pode não se concretizar ou o cumprimento da meta de 0,2% do PIB pode levar a uma execução orçamental constrangida – e.g. níveis de investimento público aquém do previsto ou limites demasiado apertados à disponibilização de fundos – com impacto no funcionamento dos serviços públicos no curto e no médio prazo”. Ainda assim, para 2023 o CFP admite que o excedente orçamental possa chegar 1%, contra a anterior previsão (de setembro) de 0,9% e face à projeção do próprio Governo de 0,8%.

Nestas novas projeções, a dívida pública, segundo o CFP, deve ficar em 2023 nos 102,6%.

“O recálculo da projeção de saldo para 2023 aponta para um ponto de partida para a previsão orçamental de 2024 mais favorável do que o antecipado pelo Ministério das Finanças”, acrescenta o CFP que, no entanto, revê em baixa o excedente orçamental para 2024 para 0,1%, mas também acredita que a dívida ficará abaixo dos 100%, baixando para 98,7%.

O CFP alerta para os riscos na execução do orçamento em 2024, nomeadamente do lado da despesa, nomeadamente com a eventualidade de serem necessárias medidas adicionais de apoio às famílias e empresas “para mitigar as repercussões económicas (com especial incidência nos
preços) decorrentes do prolongamento do conflito militar entre a Rússia e a Ucrânia, bem como do recente recrudescimento do conflito israelo-palestiniano e de uma eventual escalada das tensões na região do Médio Oriente”.

De acordo com as contas do CFP, “as novas medidas de política orçamental (excluindo one-offs) deverão implicar um aumento líquido da despesa de 1.614 milhões em 2024 face a este ano”. Já na receita o impacto das novas políticas será negativo em 588 milhões.