Depois de anos em que os casacos de malha eram rotulados como “casaco de avô” e em que as camisolas feitas pelas tias e avós estavam condenadas ao fundo da gaveta, a revolta que começou há algumas estações está agora completa e a camisola de malha tricotada é que é a peça tendência com licença para matar e conquistar.

O Telegraph defendia há poucas semanas que “a camisola de malha grossa é a peça mais sexy que um homem pode usar” — vai mais longe e chama a confortável peça tricotada “o mais potente afrodisíaco num guarda-roupa masculino”. É caso para dizer que as camisolas de malha andam a provocar calor não apenas em quem as usa. Mas será verdade que se estão a instalar na pole position das escolhas de vestuário dos homens?

No passado mês de março, para marcar o seu 75º aniversário Billy Crystal recriou uma imagem icónica do filme “When Harry met Sally” (1989) na qual está com uma camisola de malha bege cheia de texturas. O público respondeu com entusiasmo confirmando que a escolha foi um sucesso e dando a prova de que um bom clássico é intemporal, e entenda-se a camisola, porque é disso que estamos a tratar.

Os super heróis invadiram o ideal de beleza masculino com os seus físicos hiper musculados sob fatos completos em lycra. As camisolas de malha de gola alta, ao estilo cavalheiro dos anos 70 fizeram a sua ingressão no século XXI há poucos anos e com muito sucesso em várias gerações. Tal como há algumas décadas a série Miami Vice conseguiu introduzir a t-shirt de algodão como complemento aceitável de um fato. Também agora a camisola em malha tricotada ganha estatuto de protagonista no look e chuta os blazers para as boxes das corridas de estilo. Quanto aos coletes de malha, calma, talvez venham a ter o seu tempo. E as camisolas divertidas com a temática do Natal, também se devem manter reservadas para a quadra.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

É tempo da elegância descontraída conquistar o vestuário masculino e às clássicas camisolas com tranças e texturas juntam-se os exemplares em uma só cor para os mais reservados e os jogos de padrões e texturas para os mais arrojados. Se James Bond usou uma camisola azul escura de malha com arma em punho no mais recente “No time to die” e Lewis Hamilton exibe a sua excentricidade nos bastidores da pista de Silverstone com uma camisola em tons de rosa, podemos concluir que as camisolas de malha são opção para todos os gostos e situações. Os astros alinharam-se e a camisola tricotada reúne em si uma mistura de tradição, glamour e bem estar interior que é tendência.

A camisola de Chris Evans que acendeu a chama

Em 2019 o thriller divertido de Rian Johnson, Knives Out, foi um sucesso no cinema. Mas a queda de Daniel Craig para a comédia não foi a única surpresa positiva. Há também Chris Evans e a sua camisola de malha tricotada bege. O ator encarna o neto de um escritor famoso rico cuja morte é a trama deste mistério. Lá pelo meio do filme aparece com uma camisola toda texturada e inspirada no estilo das Ilhas Aran. São três ilhas ao largo da costa da Irlanda que têm um estilo tradicional de camisola e casaco em malha cheios de efeitos e em tom cru. As camisolas serão originais mais precisamente da ilha de Inishmore, e eram usadas por quem tratava o peixe. Um pouco ao estilo da camisola poveira que cativou Tory Burch e lançou uma grande confusão transatlântica.

O filme chegou aos cinemas no outono, mesmo a tempo desta camisola se tornar apetecível para o frio, a figura de Chris Evans terá dado uma ajuda e a camisola tornou-se viral. A marca Blarney Woollen Mills, que segundo o seu site se considera “a casa das malhas irlandesas” e existe desde 1823, viu as vendas da camisola Blasket Honeycomb Stitch Aran, tal e qual como a do filme, aumentar 150% desde a sua estreia. A conta de Twitter do filme terá dado na altura 100 camisolas acompanhadas de uma fotografia do ator com a sua vestida, conta a revista New Yorker e acrescenta que houve até em Los Angeles uma projeção do filme que tinha como dress code “sweaters only”, precisamente para convidar o público a usar camisolas à medida da de Ransom Thrombey, a personagem de Evans. Outros exemplos houve de como esta peça passou de bafienta a cool muito rapidamente, mas vale a pena lembrar que Steve McQueen tinha usado uma muito semelhante no filme “O caso Thomas Crown” de 1968.

A figurinista do filme, Jenny Eagan, foi questionada sobre a nova tendência que tinha lançado, mas não tinha uma história romântica para contar. Recordou que a camisola foi escolhida por ela e pelo ator durante uma prova de roupa tão rápida que nem a marca da peça ficou registada na sua memória. Parece que apenas se lembrava vagamente de a ter comprado e nem sabia se era uma peça nova ou vintage. O ator confessou ter ficado com grande parte do guarda-roupa da sua personagem. Não sabemos se terá ficado com a famosa camisola…

E a tendência continua entre cinema, desporto e realeza

Delia Barry, uma octogenária a viver em Greystones, na Irlanda, tricotou ela própria quatro camisolas para o filme “Os espíritos de Inisherin” (2022). Três destas foram usadas pelos protagonistas, os atores Colin Farrell e Brendan Gleeson. A figurinista, Ni Mhaoldomhnaigh, deu à Sra. Barry imagens de pescadores irlandeses da década de 1920 que as esteve a estudar com uma lupa. A Sra. Barry aprendeu a tricotar na escola aos sete anos, na adolescência fazia a suas roupas e nunca deixou de tricotar, mas foi depois da morte do marido, em 2010, que fez do tricot uma missão. Hoje o seu talento ajuda a angariar fundos para a Greystones Cancer Support, uma associação que foi fundamental quando o marido foi diagnosticado com a doença, e para onde encaminhou boa parte do seu ganho com o filme, segundo contou ao New York Times.

Confessou que a primeira vez que foi ver o filme só estava à procura das camisolas e, por isso, queria ir ver uma segunda vez. Não terá sido a única. As peças e a sua criadora ficaram virais no Instagram e no Tik Tok, território dos mais jovens, e terão contribuído para tornar as camisolas de malha apetecíveis. A revista Esquire rendeu-se num artigo onde o autor considera que este é o filme ”com a melhor rotação de vestuário de inverno em malha”. A Sra. Barry já vestiu personagens interpretadas por Meryl Streep, Christian Bale e Jude Law e até deu aulas a Emily Watson, para esta tricotar na série “Mulherzinhas”, mas quem Delia queria mesmo vestir era Pierce Brosnan.

As camisolas de “Os espíritos de Inisherin” (2022) foram feitas durante um dos confinamentos da pandemia de Covid-19 e a sua criadora dedicou uma semana a cada uma. “Mantiveram-me sã”, confessou Delia Barry. É verdade, o tricot também tem um lado terapêutico. Que o diga Tom Daley, campeão olímpico de mergulho pela Grã-Bretanha que, nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2021, ficou tão famoso pela sua medalha de ouro no salto sincronizado de uma prancha a 10 metros de altura, como pelo seu tricot. Daley descreveu o tricot como a sua “arma secreta”. A sua imagem com agulhas e novelo em punho, a tricotar, nas bancadas do Centro Aquático de Tóquio rapidamente chamaram a atenção e deram a volta ao mundo. “O que me manteve são durante todo este processo foi o meu amor por tricotar, fazer crochet e coisas relacionadas com a costura”, disse o atleta num vídeo publicado um dia depois de se sagrar campeão olímpico e na sua página de Instagram “Made with love by Tom Daley”. O assunto é sério e há até uma marca com este nome e com um espaço online onde podem ser comprados produtos.

Já que falamos de malhas a norte do Canal da Mancha é incontornável referir a clássica camisola Fair Isle. O nome é realmente de uma ilha no arquipélago de Shetland, no norte da Escócia, onde no século XIX, as camisolas dos pescadores ganharam o padrão geométrico e colorido que ainda hoje conhecemos. Já percebemos que, no que toca às camisolas de malha, os pescadores são verdadeiros trendsetters, e o padrão tornou-se famoso dando o nome da ilha a todo um estilo de camisola. Atualmente a ilha tem cerca de 55 habitantes e ainda há por lá quem produza estas camisolas, com uma lista de espera que pode demorar três anos, segundo conta a Town & Country.

As camisolas Fair Isle têm muitos fãs na família real, no entanto quem tornou estas camisolas populares foi Eduardo VIII na década de 1920. O famoso duque de Windsor deixou o trono de Inglaterra por amor, e deixou também a sua marca no universo das malhas. O mais jovem membro da família, o príncipe Louis, continua as pisadas do longínquo tio. No passado mês de abril, na fotografia divulgada para assinalar o seu aniversário o filho mais novo dos príncipes de Gales usava uma camisola em estilo Fair Isle azul que já havia sido descontinuada pela marca Lallie London, mas os pedidos foram tantos que a peça 100% algodão e made in Escócia voltou ao mercado e ainda pode ser comprada por 92,95 euros.

Inspire-se em alguns modelos com o shopping da fotogaleria em cima.