O futebol pode ser o maior dos calmantes em alturas conturbadas, mas confere um alívio pouco duradouro. Os efeitos resistem apenas 90 minutos. Pelo menos ali, no intervalo entre o primeiro e o último apito do árbitro, não há luta que exceda os limites do relvado. O FC Porto recebia na quarta eliminatória da Taça de Portugal o Montalegre. Se, como se veio a comprovar (4-0), o adversário do Campeonato de Portugal tinha hipóteses do tamanho de um grão de areia de chegar ao Estádio do Dragão e provocar um abanão, as disputas internas é que têm sido o grande fenómeno agitador num clube a enfrentar uma espécie de guerra civil.

A Assembleia-Geral Extraordinária caiu como uma bomba. Agressões colocaram sócios contra sócios e acicataram a disputa pela presidência do clube. “O que me importa é que o Sérgio Conceição desde que veio tem dez títulos no Museu. Os sócios que vão ao Museu vão ver as taças, que são 2.000 pessoas por dia, não os capitais que são negativos”, atirou Pinto da Costa numa entrevista à SIC onde se manifestou sobre o ambiente que atinge o clube. Na mesma circunstância, o dirigente azul e branco disse que o treinador do FC Porto não devia ser envolvido na crispação. “Acha que algum treinador de algum clube vai renovar contrato sem saber com quem vai trabalhar? Há algo que não quero. Primeiro não estou em período eleitoral, nem entendo que a seis meses ou mais se possa estar. Não quero envolver nenhum profissional nesta matéria”.

“Os sócios vão ao Museu ver títulos, não vão consultar extratos”: a entrevista de Pinto da Costa (com AG, Sérgio, Villas-Boas e rivais)

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De qualquer modo, na antevisão ao jogo com o Montalegre, o futebol ficou em segundo plano. Sérgio Conceição, como por certo estaria a prever, foi confrontado com a atual situação do clube. “Olhamos para aquilo que se passa à nossa volta, eu como empregado do FC Porto tenho que me focar na equipa. O meu papel é ser treinador, tenho de preparar a equipa da melhor forma, olhando para estes acontecimentos que fazem parte ou que estão a fazer parte deste ambiente e do clube, e que me deixam absolutamente triste. Obviamente que repudio qualquer tipo de violência e o que vi na Assembleia-Geral, como sócio há 27 anos, deixa-me triste e é condenável”, referiu o técnico.

Além de se tratar do primeiro jogo do FC Porto depois da Assembleia-Geral, era também a primeira vez que os jogadores entravam em campo após a paragem para as seleções. Durante o período em que alguns membros da equipa estiveram emprestados aos compromissos internacionais, Sérgio Conceição preparou no Olival um onze com oito mudanças face ao triunfo (1-2) em Guimarães, contra o Vitória SC. Na baliza, Cláudio Ramos reforçou o estatuto de guarda-redes da Taça de Portugal. Ao nível da defesa, João Mendes foi titular no lado esquerdo em função das ausências de Wendell e Zaidu. Zé Pedro, no centro da linha mais recuada, teve também oportunidade de somar minutos.

Francisco, o filho pródigo que voltou a casa para afogar as mágoas do pai (a crónica do V. Guimarães-FC Porto)

Ficha de Jogo

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FC Porto-Montalegre, 4-0

4.ª eliminatória da Taça de Portugal

Estádio do Dragão, no Porto

Árbitro: Hélder Carvalho (AF Santarém)

FC Porto: Cláudio Ramos, João Mário (Alan Varela, 77′), Zé Pedro, Fábio Cardoso, João Mendes (Gonçalo Borges, 64′), Grujic, Romário Baró (Nico González, 59′), André Franco, Galeno (Francisco Conceição, 59′), Danny Namaso e Evanilson (Fran Navarro, 59′)

Suplentes não utilizados: Diogo Costa, David Carmo, Taremi e Pepê

Treinador: Sérgio Conceição

Montalegre: Bruno Pio, David Santos, Alex Reis, Fábio Fonseca (Maurício, 45′), André Dias (Angola, 63′), Edu Machado, Rúben Neves, Zack Ngom, Lassana Mané (David Moura, 56′), Isaac Boakye (Tiago Luís, 63′) e Douglão

Suplentes não utilizados: Benjamin, Flávio Rodrigues, Edu Ribeiro, João Riça e Nuno Machado

Treinador: Tony

Golos: Danny Namaso (13′), Evanilson (18′ e 44′) e Fran Navarro (62′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Zack (83′)

O Montalegre causou perigo antes de estar completo o primeiro minuto de jogo. Isaac Boakye esgueirou-se e forçou Cláudio Ramos a defender. A partir daí, o FC Porto assentou o jogo e carregou no ataque. Numa tentativa da equipa do distrito de Vila Real sair para o ataque, Grujic recuperou a bola. André Franco variou a zona de pressão, rodando sobre si próprio, e entregou em Galeno que, de primeira, deixou Danny Namaso (13′) na cara do guarda-redes Bruno Pio. Cinco minutos mais tarde, o avançado inglês resgatou uma segunda bola que surgiu de um lance aéreo e assistiu Evanilson (18′) para o segundo.

O Montalegre, orientado por Tony, antigo jogador, apresentava-se num bloco curto, mas com a linha defensiva relativamente subida para uma equipa do Campeonato de Portugal que visita o Estádio do Dragão. Assim, quando os médios e os avançados azuis e brancos recebiam a bola de frente para o jogo, o setor recuado dos transmontanos sofria. André Franco encantava pela maneira como criava a partir da direita. Grujic também se mostrou muito consistente, não só ao nível da recuperação, mas também da distribuição, tal como foi notório no passe vertical que desmarcou a Galeno e deixou o extremo em condições de assistir Evanilson (44′) para o terceiro. Ao intervalo, os dois jogadores mais adiantados do 4x4x2 de Sérgio Conceição iam resolvendo a questão, sendo que Danny Namaso até se deu ao luxo de falhar um golo com a baliza completamente aberta.

Mesmo a jogar num ritmo baixo, o FC Porto parecia circular a bola a uma velocidade alucinante do ponto de vista do Montalegre, tal a diferença entre os dois conjuntos. Sérgio Conceição tinha acabado de realizar três substituições, fazendo entrar Fran Navarro, Francisco Conceição e Nico González. Garantida que estava a frescura dos jogadores dentro do campo, um lance definido ao primeiro toque entre Francisco Conceição, André Franco e Fran Navarro (62′) acabou com a estreia a marcar do avançado espanhol com a camisola azul e branca.

Depois de derrotar o Vilar de Perdizes, o FC Porto volta a eliminar um adversário de divisões secundárias e segue para os oitavos de final da Taça de Portugal. Acima de tudo, os dragões mostraram-se imunes aos tremores que o clube tem sentido e que nunca foram uma questão que ao futebol diga respeito.