O Presidente da Guiana, Irfaan Ali, instou, esta quarta-feira, o homólogo da Venezuela, Nicolás Maduro, a respeitar o Direito Internacional e evitar quaisquer “passos em falso” em relação ao território de Essequibo. Advertiu-o também de que as Forças Armadas do país já estão em “alerta máximo” e que, ao nível político, existem contactos com a ONU e os Estados Unidos.

Ali proferiu um discurso à nação em resposta direta aos anúncios efetuados na terça-feira por Maduro, que apresentou à Assembleia Nacional uma lei orgânica para a criação do Estado de Guiana Essequiba, na sequência dos resultados do referendo do passado domingo, que, aos olhos de Caracas, passou de consultivo a vinculativo.

“Não permitiremos que o nosso território seja violado, nem que o desenvolvimento do nosso país possa ser obstruído por esta ameaça desesperada”, afirmou o Presidente guianês. “A nossa única ambição é que a região continue a ser uma zona de paz. Não pedimos nem mais, nem menos”, sentenciou.

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No seu discurso, Ali dirigiu-se diretamente a Maduro, a quem acusou de seguir um caminho “preocupante”, que implica “desafiar” a ordem internacional, em particular as medidas cautelares ditadas na semana passada pelo Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) instando as autoridades da Venezuela a abster-se de qualquer passo unilateral neste diferendo.

Acusou também Maduro de ameaçar diretamente a atividade empresarial na zona, rica em recursos naturais. Maduro autorizou a criação de divisões da companhia petrolífera estatal Petróleos da Venezuela (PDVSA) e da Corporación Venezolana de Guayana (CVG) para o Essequibo, às quais ordenou que fossem concedidas licenças para a prospeção e exploração de petróleo, gás e minerais.

“O mundo deve saber, a República da Guiana deve saber que, quanto aos direitos históricos sobre a Guiana de Essequiba, a Venezuela tem uma única voz: o Essequibo é nosso, apesar das divergências”, sustentou Maduro no seu discurso, em que também anunciou a criação de uma Zona de Defesa Integral para o território.

Em resposta, Ali indicou que o primeiro passo que dará será levar o assunto ao Conselho de Segurança da ONU para que aquele organismo adote “as medidas adequadas”. Referiu igualmente que falou com o secretário-geral da ONU, António Guterres, e vários outros líderes, para alertar para “estes perigosos acontecimentos e as ações desesperadas do Presidente Maduro”.

Caracas: “Guiana está a arremeter, de forma imprudente, contra o direito internacional”

A Venezuela insiste em que o seu plano de ação foi concebido em função do resultado do referendo não vinculativo de domingo, que defendia a anexação do território ao mapa nacional. O conflito territorial remonta ao século XIX, quando uma sentença de 1899, emitida em Georgetown, estipulou que a Venezuela renunciava a Essequibo, embora tenha sido posteriormente retirada. Por seu lado, Caracas baseia-se no Acordo de Genebra de 1966, assinado entre o Reino Unido (antiga potência colonial da Guiana) e a Venezuela, que reconheceu Essequibo como um território em disputa.

Num comunicado o Governo da Venezuela criticou, também esta quarta-feira, que a Guiana tenha “dado luz verde à presença” do Comando Sul dos Estados Unidos em Essequibo — um território de quase 160.000 quilómetros quadrados -, depois de o Presidente guianês ter advertido de que o seu país estava em contacto com esse comando militar norte-americano.

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Condenando as recentes declarações de Irfaan Ali, de que as Forças Armadas da Guiana estão em “alerta máximo” e em contacto com os homólogos militares de outros países, incluindo o Comando Sul, o executivo de Nicolás Maduro afirmou que a “atitude imprudente” de Georgetown abre à “potência imperial” a “possibilidade de instalação de bases militares”, assim “ameaçando a zona de paz que foi delineada nesta região”.

“A Guiana está a arremeter, de forma imprudente, contra o direito internacional, tomando medidas que agravam a disputa territorial e que se somam à sua conduta ilegal de conceder direitos de exploração petrolífera à [norte-americana] ExxonMobil num mar pendente de delimitação com a Venezuela”, afirmou.

Reiterou que Georgetown “mantém uma ocupação de facto” no território em questão e uma “disputa territorial com a Venezuela”, que deve “ser resolvida através do Acordo de Genebra de 1966, o único instrumento jurídico válido entre as partes”.

MP venezuelano quer prender opositores que contestam referendo

O Ministério Público da Venezuela emitiu mandados de detenção contra 14 pessoas, várias deles da equipa da opositora Maria Corina Machado, por alegados vínculos com uma conspiração nacional e internacional contra a o país. O anúncio foi feito pelo Procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, precisando que estes cidadãos estão estariam a conspirar contra o referendo sobre Essequibo.

“O MP solicitou mandados de captura em relação a este plano de financiamento e conspiração relacionado com a ExxonMobil [petrolífera norte-americana que opera no território em disputa] contra a Venezuela para torpedear e tentar fraturar a luta soberana do nosso povo pelo Esequibo”, disse numa conferência de imprensa em Caracas.

Segundo Tarek William Saab foram emitidos mandados de detenção contra Roberto Abdul, Henry Alviárez, Pedro Urruchurtu e Claudia Macero, que integram a equipa de Maria Corina Machado, vencedora das recentes eleições primárias da oposição.

Foram ainda emitidos mandados de captura contra os políticos opositores Jhon Goicochea, Juan Guaidó, Júlio Borges, David Smolanski, Carlos Vecchio e Leopoldo López, identificados como “operadores no estrangeiro”.

Também contra o norte-americano Savoi Jandon Wright, o advogado e ativista venezuelano Lester Toledo, o ex-ministro do Turismo do chavismo Andrés Izarra e o ex-presidente da empresa estatal Petróleos da Venezuela SA (PDVSA), Rafael Ramírez.

Estes cidadãos vão se imputados pelo MP pelos alegados crimes de traição à pátria, conspiração, branqueamento de capitais e associação para cometer crimes.

Por outro lado, precisou que Carlos Vecchio “trabalhou para a ExxonMobil entre o início dos anos 2000 e até 2007 e entrou na política depois de a ExxonMobil” ter deixado a Venezuela “após não ter aceitado as condições das empresas mixtas criadas pelo Presidente Hugo Chávez”.

Segundo Tarek William Saab, as investigações estão numa fase preliminar, mas “existe uma testemunha protegida que está a fornecer informações extremamente importantes sobre as ligações nacionais e internacionais nesta matéria”.

Sobre a origem dos fundos usados para a conspiração precisou que surgiram do “branqueamento de capitais de organizações internacionais e de empresas estrangeiras como a ExxonMobil”.

Também que o financiamento foi materializado através de criptoativos manejados por Damián Merlo, um ex-empresário norte-americano de telecomunicações e antigo assessor de política exterior, vinculado coo ex-Presidente dos EUA, Donald Trump, e assesor de Nayib Bukele [presidente de El Salvador].