Os bancos a operar em Portugal vão apresentar, nos próximos dias, lucros historicamente elevados – os mais elevados, pelo menos, desde a crise financeira de 2008. Para as instituições financeiras, que têm de prestar contas aos acionistas, os resultados são motivo de orgulho. Porém, sendo anunciados em plena pré-campanha eleitoral, estes lucros já estão a levar vários partidos, do Chega ao PCP, a dizer que querem usar parte estes lucros para atenuar as dificuldades das famílias. O setor está a movimentar-se para evitar ser arma de arremesso no combate político.
Vítor Bento, presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), escreveu no final da semana passada, num artigo no jornal Público, que os lucros de 2023 podem ter sido uma “rendibilidade transitória” e falar em aumentar taxas sobre os bancos “será não só contraproducente, mas também agressivo dos interesses das empresas e das famílias que dependem de uma banca sólida e rentável para as apoiar”.
Apesar dos lucros milionários, dados compilados pela APB colocam a banca como um dos setores menos rentáveis da economia portuguesa, em proporção do capital que é investido. Este é um argumento há muito usado pelos banqueiros, que sublinham que é enganador falar em centenas ou milhares de milhões de euros em lucros quando não se enquadra esses valores no montante de capital que é empregado para obter essa rentabilidade.
Os dados, retirados do Banco de Portugal, são relativos a 2022 – ano em que os bancos tiveram lucros inferiores a 2023 – mas, ainda assim, colocam a banca como um setor com uma rentabilidades dos capitais próprios (RoE) de 8,7%. Esse valor terá subido para 13,2% no final do primeiro semestre de 2023, em média, mas, ainda assim, é apenas uma fração das taxas de rentabilidade superiores a 40% nas atividades de “espetáculos e desporto” e 30% nas “atividades imobiliárias (dados de 2022).
Estes são os dados para os quais o setor está a sensibilizar, depois de vários partidos terem dado a entender que nos seus programas eleitorais vão estar propostas para aumentar mais a taxação sobre os resultados dos bancos. Esses são resultados que a banca sublinha serem fruto de uma conjugação positiva de acontecimentos que lhes foram favoráveis em 2023 – subida das taxas de juro e atividade económica resiliente – mas que podem não se repetir nos próximos anos.
Aliás, embora existam indicadores que apontam para que pelo menos o primeiro semestre de 2024 seja ainda muito positivo para os bancos, a desaceleração da concessão de crédito e a (perspetivada) descida das taxas de juro faz com que no próximo ano a banca possa não ter lucros tão elevados para apresentar (e para taxar).
Mas é precisamente isso que vários partidos – desde o Chega até ao PCP – querem fazer: taxar estes lucros para, de alguma forma, compensar as famílias que sentiram na pele o aumento das taxas de juro. Embora não tenha ainda vertido essa proposta no programa eleitoral, o partido de André Ventura já indicou que o Chega “quer usar uma taxa sobre os lucros da banca para servir para baixar o crédito habitação”.
Também o PCP (CDU) planeia “responsabilizar” os bancos pelo aumento das prestações de crédito hipotecário. E Mariana Mortágua, líder do Bloco de Esquerda, já disse, no passado recente, que os “bancos têm de abdicar de pequena parte de lucros escandalosos para baixar [as prestações do] crédito à habitação”. No programa eleitoral do Bloco advoga-se “o aumento da contribuição sobre o setor bancário criada em 2011”, parcela destinada a financiar políticas de
habitação.
Mais impostos sobre a banca não são “boa ideia”, diz Centeno
Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, veio alertar que a banca nacional já é especialmente sobrecarregada com contribuições e impostos. Em entrevista à agência Reuters, Centeno lembrou que “nós temos um conjunto já de imposição fiscal na banca que vem inclusive desde o período da crise financeira e da crise de dívida soberana”. “Neste momento, um imposto adicional sobre a banca em Portugal não vejo como uma boa ideia”, afirmou o governador do Banco de Portugal.
Nós estamos a resolver, num período muito longo e dilatado de tempo, e eu acho que tem que ser assim, um conjunto de dificuldades que a banca portuguesa viveu há pouco tempo, que a torna menos competitiva do que as suas congéneres europeias. Mas estamos a resolver em casa um problema que criámos em casa, não podemos esquecer isso”, afirmou Mário Centeno à Reuters.
Em concreto, o governador do Banco de Portugal assinalou que “os bancos portugueses pagam para o Fundo de Resolução uma taxa acrescida àquela que todos os bancos europeus pagam para o Fundo de Resolução Europeu, e isso vai ficar connosco durante várias décadas, não nos esqueçamos”. Um encargo que, acrescentou, está relacionado com “todas as responsabilidades que o Fundo de Resolução teve que assumir, em consequência dos problemas que existiram em alguns bancos em Portugal”.
Depois de já o Bankinter (Portugal) ter anunciado, há poucos dias, que os seus lucros duplicaram em 2023, na próxima sexta-feira é a vez do Novo Banco e do Santander Portugal apresentarem os resultados do ano que passou. Na semana seguinte segue-se o BPI e mais perto do final de fevereiro é a vez do Millennium BCP. O maior banco do sistema, a Caixa Geral de Depósitos, ainda não agendou a apresentação de resultados anuais.