O advogado do ex-presidente da Câmara do Funchal, detido no âmbito de suspeitas de corrupção na Madeira, considerou esta quarta-feira que, perante as preocupações com a demora na inquirição dos detidos, devia haver mais juízes a ouvir os arguidos.
“Se o Conselho Superior da Magistratura está preocupado, e tem boas razões para estar, podia ter mais juízes de instrução para ouvir os arguidos“, afirmou Paulo Sá e Cunha, questionando que se neste momento “há dois juízes a despachar” o processo, porque é que não há dois juízes a ouvir ouvir os arguidos ou três.
“Não vejo nenhum obstáculo a isto e isso tinha aligeirado as coisas e nós não tínhamos entrado no exagero que, de facto, parece que agora começa a ser em termos de tempo excessivo”, acrescentou.
À saída do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), no Campus de Justiça, em Lisboa, após o segundo dia de inquirição de Pedro Calado, Paulo Sá e Cunha respondeu desta forma às questões sobre os 14 dias de detenção dos arguidos sem que conheçam as medidas de coação.
O Conselho Superior da Magistratura (CSM) disse em 31 de janeiro que estava “preocupado” com a demora nos primeiros interrogatórios judiciais, e admitiu estudar “soluções práticas” para fazer face à limitação de um direito constitucional dos arguidos, sugerindo mudanças na lei.
Juízes preocupados com demora nos interrogatórios sugerem mudanças na lei
O advogado de Pedro Calado disse esta quarta-feira que o seu constituinte “está cansado”, mas continua a responder ao juiz e a defender-se dos factos de que está indiciado pelo Ministério Público.
Questionado se a inquirição terminará na quinta-feira, Sá e Cunha respondeu esperar que sim, mas não que não o pode garantir.
“As previsões da duração da diligência até aqui têm saído erradas, dependem de várias coisas”, explicou, apontando nomeadamente haver greve dos funcionários ou do número de perguntas sugeridas pelo Ministério Público.
“A defesa tem tido oportunidade de exercer os seus direitos e acho que isso é bom. Já fiz muitos interrogatórios judiciais de arguidos detidos, que foram feitos à pressa, com muita pouca ponderação dos elementos de prova e coisas que se decidiam às vezes do dia para a noite e isso é pior”, salientou Paulo Sá e Cunha, defendendo, no entanto, que não se caia no exagero, pois “duas semanas já é um tempo excessivo”.
O advogado alertou que as celas da Polícia Judiciária (PJ) apresentam “muito más condições”, pois são pequenas, não permitem visitas ou passeios fora da cela, uma vez que “não estão pensadas para manter lá pessoas ininterruptamente duas semanas”.
Ainda assim, admitiu não lhe parecer que “haja aqui detenções para investigar” e, perante uma operação de buscas “das mais espetaculares e de maior dimensão” na justiça portuguesa, num inquérito que “tem os prazos legais todos ultrapassados”, espera “que o processo conduza rapidamente a uma acusação”.
Sobre uma pedra preciosa encontrada no gabinete de Pedro Calado, o advogado lamentou um exame “feito numa hora” e “sem nenhuma intervenção da defesa”, que devia ter sido notificada, o que pode “ser uma irregularidade”.
Paulo Sá e Cunha disse que continua “convencido, até prova em contrário, que o valor é insignificante” para uma pedra preciosa, que não quis quantificar, mas que estimou numa “coisa na casa das poucas centenas de euros, pouco mais”, e assegurou que “a Casa da Moeda não fez nenhuma avaliação“.
Quinze dias depois de ter sido detido, Pedro Calado cumpriu esta quarta-feira o segundo dia de inquirição a cargo do juiz de instrução criminal Jorge Bernardes de Melo, depois de, na terça-feira, ter sido ouvido perto de três horas na parte da manhã e meia hora à tarde, tendo os trabalhos terminado cerca das 17h30.
Em relação ao teor do interrogatório, Sá e Cunha reafirmou que este “está a ser muito longo” e que normalmente “são mais rápidos e que as medidas de coação são conhecidas a seguir”.
Pedro Calado é o terceiro suspeito do caso de alegada corrupção na Madeira a ser ouvido, depois de terminados os interrogatório aos empresários Custódio Correia e Avelino Farinha, também detidos no âmbito do mesmo processo.
Só no final de todos os interrogatórios serão conhecidas as medidas de coação.
A PJ realizou, em 24 de janeiro, cerca de 130 buscas domiciliárias e não domiciliárias sobretudo na Madeira, mas também nos Açores e em várias zonas do continente, no âmbito de um processo que investiga suspeitas de corrupção ativa e passiva, participação económica em negócio, prevaricação, recebimento ou oferta indevidos de vantagem, abuso de poderes e tráfico de influência.
A operação também atingiu o presidente do Governo Regional da Madeira (PSD/CDS-PP), Miguel Albuquerque, que foi constituído arguido e renunciou ao cargo. A renúncia foi formalmente aceite pelo representante da República na região na segunda-feira e publicada em Diário da República no mesmo dia.
Na sequência das buscas, a PJ deteve o então presidente da Câmara do Funchal Pedro Calado (PSD), o líder do grupo de construção AFA, Avelino Farinha, e o principal acionista do grupo ligado à construção civil Socicorreia, Custódio Correia.