Não é possível salvar épocas, dizem os treinadores. Mas é possível encontrar tábuas de salvação, reza a história. E esta quinta-feira, em França, o Benfica procurava agarrar-se à maior das tábuas de salvação: a Liga Europa. Afinal, mesmo sem Campeonato, Taça de Portugal e Taça da Liga, uma época com Liga Europa nunca é uma época que se salva. É uma época que se recorda.

Depois da vitória na Luz na primeira mão e em vantagem na eliminatória, os encarnados visitavam o Marselha no Vélodrome numa semana em que ficaram a sete pontos da liderança do Sporting, ou seja, numa semana em que a reconquista do Campeonato ficou ainda mais difícil. Um contexto que tornava a campanha na Liga Europa ainda mais premente e importante, face a uma temporada que internamente poderá mesmo só ter a Supertaça para acrescentar ao palmarés, e que voltava a alimentar o sonho de mudar a história recente e repetida das finais europeias perdidas.

Ficha de jogo

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Marselha-Benfica, (1-0, 2-2 no conjunto das duas mãos, 4-2 após grandes penalidades)

Quartos de final da Liga Europa

Stade Vélodrome, em Marselha (França)

Árbitro: Felix Zwayer (Alemanha)

Marselha: Pau López, Mbemba (Michael Amir Murillo, 45′), Leonardo Balerdi, Samuel Gigot (Raimane Daou, 100′), Emran Soglo (Luis Henrique, 59′), Iliman Ndiaye (Joaquín Correa, 75′), Kondogbia, Amine Harit (Gaël Lafont, 110′), Ounahi (Moumbagna, 59′), Veretout, Aubameyang

Suplentes não utilizados: Rubén Blanco, Kassim Abdallah, Said M’Madi

Treinador: Jean-Louis Gasset

Benfica: Trubin, Alexander Bah, António Silva, Otamendi, Fredrik Aursnes, Florentino, João Neves, Di María, Rafa (Arthur Cabral, 102′), David Neres (João Mário, 61′), Tengstedt (Kökçü, 61′)

Suplentes não utilizados: Samuel Soares, André Gomes, Álvaro Carreras, Morato, Benjamín Rollheiser, Marcos Leonardo, Tiago Gouveia, Adrian Bajrami, Diogo Spencer

Treinador: Roger Schmidt

Golos: Moumbagna (79′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a António Silva (38′), a Mbemba (45+2′), a Tengstedt (60′), a Amine Harit (88′), a Samuel Gigot (89′), a Kökçü (109′), a Florentino (113′)

“É importante para o Benfica chegar às meias-finais. Já é um desafio grande chegar aos quartos de final, mas as meias-finais são diferentes e é apenas um passo até à final. Isso significa um grande jogo no final da época. Este é o nosso sonho, do todo, da equipa. Temos muitos jogadores jovens, alguns mais experientes, uma boa mistura. Nos últimos na Liga Europa mostrámos que temos qualidade para estar nesta fase e agora cabe-nos confirmá-lo outra vez. Mostrar bom futebol e boa mentalidade, a partir daí tudo é possível. Seria ótimo para todos nós”, explicou Roger Schmidt, que podia chegar às primeiras meias-finais europeias da carreira, na antevisão da partida.

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Neste contexto, e depois de ter feito muitas poupanças na vitória do fim de semana contra o Moreirense, o treinador alemão regressava à matriz que tem sido mais habitual: Neres, Rafa e Di María no apoio a Tengstedt, João Neves e Florentino no meio-campo e Kökçü no banco, com o jovem central Adrian Bajrami a ser a novidade na convocatória. Do outro lado, num Marselha que vinha de cinco derrotas seguidas e não vencia há mais de um mês, Jean-Louis Gasset apostava em Amine Harit e Ounahi nas costas de Aubameyang.

Numa primeira parte que terminou sem golos, o Benfica até teve a primeira aproximação perigosa à baliza, com Neres a surgir na área e a rematar contra um defesa (4′). O momento, porém, não foi ilustrativo de nada do que se passou a seguir. O Marselha criou duas oportunidades consecutivas, com Trubin a parar um pontapé de Ndiaye (7′) e Mbemba a cabecear ao lado na sequência de um livre (16′), e os encarnados até reagiram com um desequilíbrio de Neres que culminou num remate por cima de Rafa (16′) — mas o jogo travou nesse momento.

A partir dos 20 minutos, o Benfica deixou de conseguir passar do meio-campo e limitou-se a controlar a posse de bola do Marselha. Os franceses dominavam as ocorrências, colocando a linha mais recuada na zona intermédia do relvado, e os encarnados demonstravam dificuldades na hora de ligar os setores, ganhar segundas bolas ou construir jogadas com pés e cabeça. Roger Schmidt mantinha-se calmo na zona técnica, mas a equipa ia sofrendo em campo e parecia estar mais a jogar para não perder do que para ganhar.

Ainda assim, o domínio do Marselha era algo inconsequente. Os franceses voltaram a criar perigo por intermédio de Aubameyang, que aproveitou uma perda de bola de Di María para rematar por cima de fora de área (24′), mas o lance foi um oásis num autêntico deserto de oportunidades. O Benfica estava bem posicionado, ainda que quase inexistente ofensivamente, e não permitia grandes espaços ao adversário no último terço.

O controlo do Marselha esmoreceu a partir da meia-hora, com os encarnados a conseguirem subir as linhas e ter maior presença no meio-campo adversário, mas a verdade é que Pau López não voltou a ser assustado e Aubameyang ainda teve mais um remate por cima do outro lado (44′). Ao intervalo, Marselha e Benfica estavam empatados sem golos num jogo pouco entusiasmante, mas que ia deixando os encarnados ainda na frente da eliminatória.

Jean-Louis Gasset mexeu logo ao intervalo e trocou Mbemba por Murillo, adaptando a equipa a um 4x4x2 mais claro e procurando equilibrar o lado direito da defesa, por onde o Benfica foi conseguindo atacar na primeira parte através de Neres. A lógica do jogo manteve-se durante os 10 minutos iniciais da segunda parte, com o Marselha a ter mais bola mas sem grandes aproximações perigosas à baliza de Trubin, e as dinâmicas só agitaram a partir do momento em que Kondogbia rematou por cima à entrada da área (57′).

O Benfica respondeu através de Aursnes, que combinou com Neres na esquerda e atirou à malha lateral à saída de Pau López (57′), e Gasset voltou a mexer ao lançar Moumbagna e Luis Henrique. Harit voltou a colocar o resultado em causa logo a seguir, com um pontapé forte que Trubin parou (60′), e Schmidt procurou responder ao trocar Neres e Tengstedt por João Mário e Kökçü, colocando o turco na posição que era de Rafa e o próprio Rafa enquanto referência ofensiva. Ou seja, retirando o elemento mais desequilibrador, Neres, para tornar a equipa ainda mais frágil defensivamente.

E o Marselha aproveitou. Veretout ia marcando na sequência de um erro de Trubin (67′), Aubameyang rematou ao lado logo depois (67′) e o guarda-redes ucraniano redimiu-se com uma defesa enorme a um pontapé rasteiro de Kondogbia na área (69′). O Benfica ia afundando, muito devido às substituições feitas por Roger Schmidt, e os franceses iam acreditando. Quando a qualidade individual vinha ao de cima, porém, os encarnados mostravam que eram a melhor equipa: e foi assim que Rafa e Di María iam marcando, consecutivamente, com Pau López a defender os remates de ambos (74′).

A cerca de 10 minutos do fim, o Vélodrome explodiu. Num dos muitos ataques do Marselha pela esquerda, Aubameyang cruzou para a área e encontrou a cabeça de Moumbagna, que se antecipou a Aursnes e atirou para inaugurar o marcador e empatar a eliminatória (79′). Já nada mudou até ao fim do tempo regulamentar, apesar de um pontapé perigoso de Kökçü que foi à malha lateral (81′), e tudo seguiu para prolongamento.

Os primeiros 15 minutos tiveram uma oportunidade para cada lado, com Di María a cabecear para defesa de Pau López (98′) e Aubameyang a rematar ao lado (101′), e Gasset aproveitou para lançar Daou enquanto que Schmidt tirou Rafa para colocar Arthur Cabral e recuperar a referência ofensiva. O Benfica teve a única ocasião de perigo da segunda parte do prolongamento, com um remate que Pau López defendeu (108′), mas já nada mudou — e ninguém conseguiu evitar as grandes penalidades.

Aí, Di María acertou no poste no primeiro penálti, António Silva falhou o quarto e os franceses converteram as quatro oportunidades: no fim, o Marselha venceu o Benfica nas grandes penalidades e eliminou os encarnados, carimbando o apuramento para as meias-finais da Liga Europa e marcando encontro com a Atalanta. Assim, e já a sete pontos do Sporting no Campeonato, o Benfica vai muito provavelmente terminar a temporada sem qualquer título para lá da Supertaça e sem qualquer final disputada — e Roger Schmidt passou uma noite em França, impávido e sereno, a fazer apenas três substituições e a retirar de campo o principal inconformado da equipa.