Os adeptos portugueses começaram a habituar-se a associar Volta a Itália a corredores nacionais na lista de algo. Na lista dos top 10 em etapas, na lista dos vencedores das etapas de montanha (Rúben Guerreiro em 2020, João Almeida em 2023), até no pódio final da prova como aconteceu no ano passado com o Bota Lume que fechou as três semanas apenas atrás de Primoz Roglic e Geraint Thomas. Agora, tudo será diferente. Na ótica portuguesa, com João Almeida virado para o Tour, Rúben Guerreiro a sair dos inscritos da Movistar e Rui Costa a recuperar da fratura na clavícula direita, haverá apenas um corredor na competição que arranca este sábado, Rui Oliveira (UAE Team Emirates). Em termos globais, na “ressaca” da queda na Volta ao País Basco que levou Jonas Vingegaard, Remco Evenepoel e Primoz Roglic, as prioridades e apostas nesta fase por outras. Estará assim a passadeira estendida para Tadej Pogacar? Para Alberto Contador, sim.
“Para mim, este Giro vai ser do Pogacar. É claro que a Ineos vai novamente com o Geraint Thomas, que no ano passado perdeu no último dia, no contrarrelógio, para o Primoz Roglic. Têm também Thymen Arensman, vamos ver até onde conseguirá chegar, mas não consigo ver que sejam capazes em condições normais de dobrar o Pogacar. Dizer que ele pode ganhar todas as etapas é excessivo mas sim, pode ganhar várias etapas. Agora, temos de tomar sempre em linha de conta que estarão no Giro vários especialistas no sprint, por exemplo, como o Kaden Groves, o Caleb Ewan, o Fernando Gaviria, o Fabio Jakobsen ou o Jonathan Miller, que está muito forte…”, destaca o antigo corredor espanhol, que venceu por duas vezes o Giro em 2008 e 2015 (mais dois Tours e três Vueltas), em declarações ao Observador como comentador do Eurosport.
“Temos de ter em conta um ponto importante: o Pogacar vai tentar a dobradinha [Giro e Tour]. Perante isso, até que ponto poderá estar interessado em lutar por todas as etapas? Ele no final quer ganhar o Giro, quer a seguir lutar pelo Tour e, se calhar, se ganhar a Volta a França, integrar também a Vuelta. Cada esforço que tenha de fazer ou que possa poupar conta. Veremos como vai enfrentar todas essas questões mas é certo que o Pogacar é um corredor muito agressivo, custa-lhe travar. Pensando a médio e longo prazo, talvez seja mais interessante para ele guardar forças para o Tour”, acrescenta ainda o ex-corredor de 41 anos.
“Para ter êxito no Giro e no Tour, o primeiro ponto é tentar esse objetivo um pouco mais jovem e com essa ideia clara em mente. A primeira vez que fiz isso disseram-me em cima da hora que tinha de ir ao Tour, não é uma solução ideal. No segundo ano cometi o erro de ir para altitude depois do Giro e o meu corpo não fez uma recuperação tão boa mas também tive um problema no Giro, que foi a resposta que a equipa não conseguiu dar e que fez com que ficasse sozinho a 40 ou 50 quilómetros da meta, o que levava a que tivesse um maior desgaste. Pogacar tem muitas coisas boas. Primeiro, um calendário adaptado a Giro-Tour. Depois, uma equipa muito potente. Não precisa de andar de forma louca para marcar diferenças, só tem de gerir bem as forças até ao Tour. Este Giro não será tão tradicional como é normal. Há várias etapas de 150 quilómetros, a maior tem 180 à exceção daquelas duas mais para o final acima dos 200… Parece-me que será uma corrida um pouco menos exigente e que permitirá ir guardando energias”, aponta Contador, que tentou por duas vezes Giro e Tour ganhando em Itália mas ficando na quinta posição em França.
Mais espaço para surpresas no top 5 da geral? Sem dúvida. Toda a gente concorda que há um favorito, que é o Pogacar, e que a seguir existe um grupo onde estará o Geraint Thomas. O Ben O’Connor também está bem, pode surpreender porque ao contrário do Thomas e do Romain Bardet não está nos últimos anos da sua carreira. Vamos ver também o que fará o Arensman. A outra grande incógnita é o Nairo Quintana, que sabe o que é ganhar o Giro mas que esteve um ano parado. O Giro tem tendência a ser uma prova que descobre muita gente e agora voltará a ser assim”, refere Contador em relação à lista final de presenças na Volta a Itália.
E sobre as ausências, até que ponto aquela queda no País Basco poderá fazer mossa em toda a temporada de 2024? “Os Jogos Olímpicos acabam aqui por ser secundários porque quando falamos em Vingegaard, Roglic e Evenepoel estamos a pensar de forma clara no Tour. São os três grandes favoritos a par do Pogacar. Em relação a Roglic e Evenepoel parecia estar um ponto acima, o mais complicado seria o Vingegaard mas vamos ver em que condições regressará à competição porque nessa perspetiva aquela queda pode ser um fator importante para o resto da temporada olhando para o que pode ser o Tour”, salientou.
Por fim, poderá Rui Oliveira juntar-se ao lote de vencedores portugueses no Giro depois da quarta posição em Saragoça na última Vuelta e de um segundo lugar ao sprint na Volta ao Algarve? “Tem uma grande competência a nível de sprint. Podes ser um corredor muito rápido mas não é fácil ser um corredor favorito. Também temos de ter em conta que a Emirates vai estar a pensar na geral com o Pogacar, ao passo que outras equipas apoiam elementos como o Groves ou o Caleb Ewan. Vai ser complicado ganhar uma etapa no Giro mas claro que terá sempre as suas hipóteses, sabendo que há outros mais favoritos não porque são mais rápidos mas porque têm as suas equipas a trabalhar para eles”, explica o comentador do Eurosport.