Amilcar Cabral era o “inimigo” que não queria a guerra, mas cooperação com Portugal, sem colonizadores e colonizados, na perspetiva de alguns ex-combatentes portugueses que voltaram à Guiné-Bissau, mais de 50 anos depois de estarem no ultramar.

Nunca nenhum do grupo de seis antigos militares, que a Lusa encontrou em Bissau, viu o líder histórico da luta armada pela libertação da Guiné e Cabo Verde do jugo português, mas todos se recordam “bem do dia em que ele foi morto”, a 20 de janeiro de 1973.

“Ouvimos pela rádio, quando estávamos no quartel”, contou à Lusa Fernando Ansiães, lamentando o assassinato do rosto da luta armada durante a guerra colonial, antes de a Guiné-Bissau proclamar a independência de Portugal.

Amílcar Cabral completaria este ano cem anos se fosse vivo e a morte, aos 49 anos, “foi pena” para o antigo combatente português, porque “a ideia dele era de se manter com Portugal, não era a ideia de guerra, mas de haver uma cooperação, a continuidade de Portugal [na Guiné-Bissau] como irmãos e não como colonizadores e colonizados”.

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Uma ideia de igualdade com cooperação, essa era a ideia inicial do Cabral e ele tentou isso, (…) [mas] o poder em Lisboa, nessa altura, pelo menos, não estava muito aberto a isso”, considerou.

A abertura que havia do lado português era do general Spínola, “que fez algumas reuniões à revelia do poder central”, afirmou.

“Isso é da história, foi ao Senegal encontrar-se com representantes [guineenses]”, atalhou o comandante Filipe Lopes, um capitão de Abril, que se juntou ao grupo nesta visita à Guiné-Bissau.

Quando estavam na luta, Cabral “era o inimigo”, como observou Carlos Henriques, secundado por Pinto Carvalho, que falou de Cabral como “líder do movimento de libertação”, mas ressalvando que “não era só ele”.

Pinto Carvalho esteve na guerra colonial numa zona da Guiné-Bissau em que o chefe da artilharia era Nino Vieira, que proclamou a independência da Guiné-Bissau, em 1973, e veio a ser presidente do país, entre 1994 e 1999 e entre 2005 e 2009.

No dia em que Amílcar Cabral foi assassinado, o ex-combatente português estava a comandar o pelotão de africanos (que combatiam por Portugal), que, contou à Lusa, se dirigiram a ele “todos satisfeitos a dar a notícia”.

“E eu disse-lhes, eu não comungo desse vosso entusiasmo, porque, para já, foi uma pessoa que morreu, e depois a guerra não vai ser a mesma”, afirmou.

E efetivamente, como contaram, “a partir da morte do Amílcar Cabral, teve outro caminho”, com “mais agressividade”, a guerra que só terminaria mais de um ano depois, com o 25 de Abril em Portugal.