A saúde mental, a cultura das organizações, como a ética e os valores, e o compromisso com a liderança são as dimensões que revelam maior risco para um ambiente de trabalho saudável, segundo um estudo esta quarta-feira divulgado.
Esta análise do Laboratório Português de Ambientes de Trabalho Saudáveis (LABPATS), que envolveu mais de 4.300 participantes, concluiu que a cultura das organizações é a dimensão que mais condiciona o ambiente de trabalho saudável, com os especialistas a sublinharem que a preocupação com o bem-estar e a saúde dos profissionais e da organização “deve estar no ‘ADN'” das empresas.
“O que temos notado é que, muitas vezes, há uma imagem externa de bem-estar, porque hoje em dia a questão do bem-estar e da saúde mental acaba por estar na moda, e as organizações, se forem questionadas, respondem que isso é algo importante (…). Mas, depois, nos planos estratégicos e na cultura passada às novas lideranças e aos novos profissionais isso não está plasmado”, explicou a coordenadora do estudo, Tânia Gaspar de Matos.
A psicóloga, fundadora do LABPATS, sublinhou: “É fundamental que efetivamente nas várias políticas [das organizações], desde a seleção de pessoas, à integração e à escolha dos próprios líderes, tudo tem de ser transmitido de forma muito clara”.
Quanto à cultura das organizações, aponta como fundamentais para o bem-estar dos profissionais a perceção de segurança e de justiça: “É importante o trabalhador sentir que está seguro e que pode participar, que pode dar a sua opinião, que tem canais claros e transparentes para isso e que tem confiança para tal, sem achar que pode ser prejudicado”.
A investigadora reconheceu que as organizações “acabam por ter muita dificuldade em implementar estas medidas, porque a maior parte anda preocupada a responder às necessidades imediatas”.
Defendendo a necessidade de as organizações terem uma visão mais estratégica do seu funcionamento, Tânia Gaspar de Matos preconiza que “deveriam ter dois tipos de líderes”: “Um que estivesse mais ligado à parte operacional do dia a dia, que é importante (…) e outro que tivesse mais uma visão estratégica, que conseguisse ter uma visão global de toda a organização e tivesse tempo para olhar para estes detalhes e fazer um plano para que a mensagem da saúde mental e do bem-estar passasse de forma clara a todos os colaboradores, com grande foco nas lideranças”.
A especialista sublinhou igualmente que, segundo os dados recolhidos, “as organizações da administração pública têm piores resultados do que as organizações privadas”.
“Há aqui uma dinâmica na administração pública que dificulta a implementação de novas medidas. Esta visão de que nós temos que parar, olhar e alterar aquilo que tem que ser alterado, há muita dificuldade [de o fazer] na administração pública”, disse.
Segundo os dados do estudo do LABPATS, apesar de ligeiramente inferior, os dados relativos à saúde mental continuam preocupantes: três em cada quatro (76%) profissionais apresentam pelo menos um sintoma de ‘burnout’ e quase metade (48%) manifesta três sintomas (exaustão, irritabilidade e tristeza).
Mais de metade dos profissionais refere que não tem as competências necessárias para gerir as situações de ‘stress’, tais como a perceção de controlo e a confiança nas suas capacidades, e mais de um terço tem comportamentos de saúde pouco saudáveis.
Quase metade (46%) não pratica exercício físico e 35% tem maus hábitos de sono. Há ainda cerca de 25% que toma medicamentos psicotrópicos.
São as mulheres que revelam um maior risco no que se refere à saúde mental. Elas são quem manifesta maior envolvimento, mas também quem se mostra menos assertivas quanto às suas necessidades.
Num ambiente de trabalho saudável, o que os profissionais mais valorizam é a autonomia, a flexibilidade (conciliação), a transparência e a existência de “lideranças próximas e justas” que valorizem o seu trabalho e promovam o desenvolvimento de carreira.
A preocupação com a saúde mental e as atividades de promoção de bem-estar e de relações interpessoais positivas entre colegas são igualmente valorizadas.
O Laboratório Português de Ambientes de Trabalho Saudáveis estuda de forma aprofundada e sistemática a saúde e o bem-estar dos profissionais e das organizações, contribuindo para a intervenção e definição de políticas nestas duas áreas.