“É uma medida política para silenciar os moçambicanos”, acusou, em declarações à Lusa, a ativista Quitéria Guirengane, representante do grupo que se reuniu nos últimos dias com o Instituto Nacional das Comunicações de Moçambique (INCM), entidade reguladora, avançando este sábado para as ruas, face à falta de respostas.

“Queremos exigir a revogação total da resolução que aprova estas tarifas, que são completamente insensíveis, imorais, anticoncorrenciais, desumanas, insustentáveis e improporcionais, porque violam gravemente os nossos direitos fundamentais, quer o direito do acesso à informação, o direito à educação, ao trabalho, à identidade, consignados na Constituição”, acrescentou, durante a marcha deste sábado.

Em causa está a publicação pelo INCM, em 19 de fevereiro, de uma resolução a estabelecer novas tarifas mínimas no setor das telecomunicações, de voz, mensagens e dados, cuja adaptação pelas três operadoras, desde 04 de maio, levou ao aumento real das tarifas e ao fim dos pacotes ilimitados.

Os promotores da marcha deste sábado garantem, contudo, que “não é uma medida proposta pelas operadoras” e que resulta da intervenção, apenas, do regulador.

“O INCM, ao mesmo tempo que diz que não é responsável pela medida, dá todos os sinais que ele é que está a insistir”, acusou Quitéria Guirengane.

“Queremos a cabeça das ordens superiores que impedem que a vontade dos cidadãos seja materializada”, disse ainda a porta-voz da marcha, recordando que as consequências dos aumentos das tarifas, sobretudo pelo fim dos pacotes de dados ilimitados, se faz sentir em todas as áreas.

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Como na agricultura, em que as sementes são “importadas, compradas pela Internet”, ou para tratar de um bilhete de identidade e de um passaporte, no estudo ou na criação de emprego.

“É por esses que nós lutamos”, assumiu Quitéria Guirengane.

Da marcha deste sábado saiu o apelo a uma “operação geral de cancelamento e bloqueio” das páginas das operadoras nas redes sociais das operadoras de telecomunicações, seguindo-se uma “ação judicial contra o INCM”.

“É uma decisão ausente de fundamentação. Já percebemos que não existe nenhum estudo. Segundo, mata a ideia de uma concorrência leal, terceiro, o próprio regulamento exige que haja uma auscultação pública e não houve”, explicou.

Xavier Nhanala, 28 anos, é professor e juntou-se à marcha deste sábado porque o custo das telecomunicações tornou-se insustentável.

“Nem livros nós temos, a Internet é o único veículo para buscar informação e conhecimentos”, explicou, assumindo que dos 1.000 meticais (14,3 euros) que gastava por mês para ter internet e fazer chamadas, passou a gastar quatro vezes mais.

“Ao fim de duas ou três a Internet acaba. E note que nada mudou na minha forma de trabalhar”, relatou, afirmando não compreender as decisões: “A não ser que haja uma agenda política para limitar a informação ao cidadão moçambicano”.

Também Zaquia Tuacal, mediadora cultural de 32 anos, diz que a medida “é um meio de limitar os jovens”, a “geração futura, que quer mudança”

“Antes eu gastava 500 meticais [7,2 euros] mensais, hoje posso dizer que até ao momento, desde a subida de preços, já gastei 800 meticais [11,5 euros], numa semana e pouco (…) Antes transformava 1 GB com 15 meticais [21 cêntimos de euro], hoje custa 70 meticais (um euro), que é o preço de quilo de açúcar, do quilo de arroz. É um absurdo”, atira, de cartaz em punho.

Com a bandeira moçambicana às costas, Francisco Tembi, 39 anos, produtor de um programa televisivo, descreve as novas tarifas como uma “aberração”, sobretudo pelo acesso limitado que passou a existir à Internet, que “não é um capricho”, mas “uma grande necessidade” e uma “garantia do sustento de muitas famílias”.

“Em 24 horas gastava cinco meticais [sete cêntimos], agora tenho de gastar 50 meticais [72 cêntimos], para fazer o mesmo. É incomportável.

O presidente do INCM disse anteriormente que orientou as operadoras das telecomunicações a retirar os pacotes ilimitados de dados e de voz para evitar o “colapso do mercado” e a “concorrência desleal”, visando também permitir maior abertura do mercado para atração de investimentos no setor.

“Estavam a prejudicar a economia. Os pacotes de 30 dias continuam, mas o consumidor não pode falar de forma ilimitada a ponto de lhe custar zero”, esclareceu Tuaha Mote.