O nosso trabalho ainda não terminou” e “temos de manter-nos vigilantes” perante os riscos de que a inflação possa voltar a subir na zona euro, avisou nesta segunda-feira Christine Lagarde, na abertura do Fórum BCE que se realiza todos os anos em Sintra. Citando o falecido treinador de futebol Bobby Robson, Lagarde salientou que “os primeiros 90 minutos [do jogo] são os mais importantes” e garantiu que o banco central “não irá descansar até que o jogo esteja vencido” e a inflação regresse aos 2%.

No discurso de abertura do Fórum BCE – que, em contraste com as edições anteriores, aconteceu na noite do primeiro dia, em vez de na manhã do segundo dia – Christine Lagarde congratulou-se pelas medidas que o BCE tomou nos últimos anos. “As nossas decisões de política monetária foram bem sucedidas em manter as expectativas de inflação ancoradas [ou seja, controladas] e a taxa de inflação deverá regressar aos 2% na segunda metade do próximo ano”, afirmou a francesa, acrescentando que “tendo em conta a gravidade do choque inflacionista que existiu, esta correção [das pressões inflacionistas] é assinalável“.

Depois de começar a subir as taxas de juro em julho de 2022, quando estas estavam no valor negativo de -0,5%, o BCE avançou com a escalada mais rápida de sempre nas taxas de juro, erguendo-as até 4% em setembro de 2023. Depois disso, vários meses de estabilização e, no mês passado, foi anunciada a primeira descida dos juros deste ciclo. Neste discurso de abertura do Fórum anual, a presidente do BCE trouxe consigo dados novos (análise feita pelo próprio BCE) que mostram que “se não tivéssemos intervindo, o risco de uma desancoragem [das expectativas de inflação] teria sido superior a 30% tanto em 2023 como em 2024“.

Quando falam “desancoragem” das expectativas de inflação, os bancos centrais referem-se ao risco de se gerar uma espiral de inflação indomável que coloca em perigo a credibilidade do banco central e, em última análise, da própria divisa. “Mesmo que tivéssemos tido uma resposta apenas moderada, como se tivéssemos parado de subir os juros aos 2%, o risco de desancoragem ainda teria sido próximo de 24%“, afirmou Lagarde, para justificar a subida agressiva de juros até ao dobro desse nível.

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O BCE admite, contudo, que essa forte subida das taxas de juro trouxe “custos” para a economia e para a vida de muitas pessoas. “Embora as nossas decisões tenham ajudado a controlar a inflação, também fizeram abrandar o crescimento económico”, incluindo uma estagnação económica [na zona euro] que perdurou ao longo de cinco trimestres consecutivos.

Porém, congratula-se Christine Lagarde, “desta vez, os custos associados ao processo de desinflação foram brandos, comparativamente com outros episódios no passado”. Uma “aterragem suave“, termo usado pelos bancos centrais para se referir a um processo de subida de juros sem uma penalização excessiva da economia, “ainda não é um dado adquirido“, mas os indicadores são positivos – sobretudo o comportamento “excecionalmente” benigno do mercado de trabalho.

Quanto ao futuro, o BCE continua a ver “vários motivos de incerteza em relação à inflação futura“, até porque existe o risco de haver novos “choques do lado da oferta”, como aqueles relacionados com a energia, que contribuíram para o surto inflacionista de 2021/2022. “Vai levar algum tempo até que possamos reunir dados suficientes para podermos dizer, com toda a certeza, que foram ultrapassados os riscos de uma inflação acima do objetivo”, sublinha a presidente do BCE.