A pintora Graça Morais inaugura esta sexta-feira em Bragança a exposição “Obras Escondidas, Obras Escolhidas”, no assinalar dos 50 anos de vida artística, a contar da sua estreia em nome próprio, em 1974, no Museu Alberto Sampaio, em Guimarães.
Num encontro com jornalistas no Centro de Arte Contemporânea Graça Morais em Bragança, que acolhe a exposição, a pintora revelou que vão poder ser vistas pela primeira vez 80 pinturas, numa mostra que não é exatamente comemorativa, mas simbólica. Ao todo, são cerca de 160 as obras expostas.
“Este é o ano das comemorações. Do 25 de Abril, muito bem. De Camões, muito bem. Eu não tenho de comemorar os 50 anos, tenho é de mostrar obras de qualidade, que realizei ao longo de 50 anos de vida artística. Mas não tem o caráter de uma exposição nem antológica nem retrospetiva”, esclareceu a pintora.
As obras inéditas estavam “guardadas em gavetas e em pastas há 40 anos”, descreveu Graça Morais, e delas procurou escolher o melhor — daí o nome da exposição.
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O que fez com que as pinturas saltassem agora para as paredes, como Graça Morais continuou a explicar, foi a atividade do Laboratório de Artes na Montanha Graça Morais, do Instituto Politécnico de Bragança, impulsionado pelo ex-ministro da Ciência Manuel Heitor, que se dedica ao estudo da obra da pintora.
Esse facto levou-a a abrir o arquivo para o partilhar com a investigadora Joana Baião.
As pinturas mais antigas datam de 1975, vêm do período tumultuoso pós-revolução e foram feitas em Guimarães, cidade onde a artista transmontana estava a dar aulas de Educação Visual. As mais recentes são do ano passado.
“Procurei fazer um fio condutor entre obras que realizei a partir desta região no fim do século XX para o XXI”, um século “que continua com cenas muito dramáticas que todos nós, infelizmente, temos assistido”, afirmou, referindo-se guerras, crises e conflitos, doenças e pandemias que afetaram as populações ao longo destas cinco décadas.
Está também patente a região de Trás-os-Montes, que Graça Morais conheceu primeiro através da sua aldeia natal, Vieiro, no concelho de Vila Flor, com a dureza da vida de antigamente, marcada pela emigração.
A sua pintura é, segundo a própria enfatizou, dramática, porque “a vida não é simples”.
“Claro que eu podia pintar flores e fazer uma pintura decorativa. Se calhar, estava milionária e não estou. Mas não é o meu papel no mundo”, afirmou a artista de 76 anos
Muitas vezes inspirada por fotografias dos jornais, que disse continuar a preferir em papel, frisou que as suas obras não se tratam de ilustrações, mas antes da realidade tratada pelos seus olhos.
“A minha pintura não tem nada a ver com ilustração. Mas tem a ver com o meu percurso de vida pessoal e com a grande reflexão que faço sobre o mundo. No fundo, é o meu testemunho”, partilhou a autora.
Para a artista, as obras dialogam com quem as observa, e elas entre si também falam.
“São obras que vão falar com as pessoas, tenho a certeza. Até porque vivemos numa Europa que está com muitos problemas políticos e sociais. E falo de migrações, de sofrimentos, de doenças. Estas obras falam muito sobre estas pessoas que vou encontrando também”.
Na exposição, há representações de pietàs, a mãe com o seu filho morto nos braços, inspiradas em cenas reais, que permanecem constantes, com as guerras sempre em curso.
“A guerra na Ucrânia é uma grande preocupação para a Europa. Mas o que se está a assistir na Palestina é um massacre de inocentes, sobretudo de crianças. E não conseguimos que os donos da paz consigam vencer os donos da guerra”, considerou a pintora.
Com esta exposição, Graça Morais quer dizer que continua “viva e atenta” e partilhou o desejo de chegar pelos menos aos 100 anos.
“Eu acho que as pessoas quando querem fazer muitas coisas, ajuda a viver. E quando vivem com intensidade e sem falsidade. Um artista não pode ser falso, não pode enganar-se a si próprio. Aquilo que se faz tem de ser muito autêntico”, rematou Graça Morais.
“Obras Escondidas, Obras Escolhidas”, a exposição, é inaugurada esta sexta-feira à tarde no Centro de Arte Contemporânea Graça Morais, em Bragança, e vai poder ser apreciada até 26 de janeiro de 2025.
A primeira exposição individual de Graça Morais data de janeiro de 1974, no Museu Alberto Sampaio, em Guimarães. Em 2008, foi inaugurado em Bragança o Centro de Arte Contemporânea Graça Morais.