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Rita Chantre / Observador

Rita Chantre / Observador

Dez anos de Observador em 80 fotografias, numa exposição que é “a consciência contemporânea do tempo que vivemos”

Uma exposição, 80 fotografias e "um caminho enorme que foi percorrido" ao longo de 10 anos. Foi inaugurada a mostra que celebra uma década de existência do Observador, em todas as suas dimensões.

“Informar tudo o que é importante de forma independente, informar de forma diferente, informar de forma mais exigente e mais respeitadora da inteligência dos nossos leitores.” É esta frase que brinda quem desça as escadas da Galeria Pintor Fernando de Azevedo da Sociedade de Belas Artes, em Lisboa, para ver a exposição Observador 10 Anos. Mais do que declaração de intenções, esta é a celebração de uma década com uma mostra de mais de oitenta fotografias.

Patente até 8 de dezembro e de entrada livre, a exposição — com curadoria de Patrícia Reis — espelha o rumo do jornal ao longo de 10 anos, demonstrando o que de bom e de mau, surpreendente e comovente, ocorreu no país e no mundo, captado pela lente dos seus fotojornalistas. E foi ao Observador que a jornalista, editora e escritora — além de curadora de outras mostras de fotografia, como a de Alfredo Cunha — explicou como foi preparar uma iniciativa assim.

Tudo começou com uma sugestão de João Porfírio — editor de fotografia do Observador e autor de muitas das imagens que adornam esta exposição —, sabendo da experiência e predileção de Patrícia Reis por este meio. “Achei, ‘caramba, isto é perfeito’, é juntar jornalismo, que é uma paixão minha, com a fotografia, que é outra”, conta. “Claro que eu não sabia que cada mês de cada ano de existência do jornal tinha para cima de 2.600 fotografias em arquivo. Claro que eu não fazia a mais pequena ideia desta realidade”, confessa em tom de brincadeira, entre risos.

Rita Chantre / Observador

Foi, portanto, difícil proceder a uma seleção, “mas ao mesmo tempo gratificante, porque passamos em revista uma década”. “A fotografia é uma primeira consciência contemporânea do tempo que vivemos. É um princípio de um contar de história, é o que te fixa o acontecimento ou o protagonista. É fundamental que exista este trabalho de fixação dos acontecimentos que são mais relevantes para uma sociedade e do desempenho dos seus protagonistas, porque é um princípio de fixação da nossa história contemporânea. E essa é a parte mais importante, porque nós precisamos ter memória”, afirma.

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Uma consideração destas sobre a importância da fotografia enquanto medium foi, de certa maneira, o que levou João Porfírio a recomendar Patrícia Reis à direção do Observador para montar esta exposição. “Não é uma curadora de arte, não é uma curadora de exposições artísticas, é uma curadora que tem a vertente jornalística, que percebe a diferença entre uma fotografia que tem importância jornalística e outra que nem tanto. Portanto, achámos que a escolha era a ideal porque é uma pessoa, lá está, que tem experiência a montar exposições, e também tem este cunho jornalístico”, explica o editor de fotografia do Observador.

Seguindo esse princípio, Patrícia Reis teve de encarar dois desafios ao preparar esta mostra. Um foi “mostrar a forma como o Observador olha e se interessa pelo mundo e se interessa pelos protagonistas da nossa história contemporânea, os acontecimentos de hoje”. O outro, de mãos dadas com o primeiro, é fazê-lo sem cair na tendência de escolher as fotografias mais dramáticas. “O jornalismo é mais sobre ‘o homem que mordeu o cão do que o cão que mordeu o homem’, e nós temos uma tendência muito grande para a desgraça e para as coisas que fogem à vida normal. Portanto, esse equilíbrio era difícil de fazer — mas claro que escolher é excluir e tinha de se fazer uma escolha”, afirma, destacando ainda o trabalho de Pedro Leitão, por todo o trabalho de design que fez para esta mostra.

Ao entrar pela galeria da Sociedade de Belas Artes, esse equilíbrio fica bem patente logo na primeira sala, onde se encontra uma cronologia de alguns dos mais importantes acontecimentos dos últimos 10 anos. Nela encontramos imagens da conquista do Europeu de 2016, da realização da Eurovisão em Portugal em 2018 e das comemorações dos 50 anos do 25 de abril deste ano, tal como dos traumáticos incêndios de Pedrógão Grande em 2017, das sufocantes medidas de segurança durante a pandemia da Covid-19, em 2020, ou de uma criança a despedir-se do pai na Guerra da Ucrânia, em 2022. Tragédia e rejubilo, dor e alegria, lado a lado.

Rita Chantre / Observador

A mesma tendência pode ser observada na sala do piso de baixo, repleta de fotografias das grandes figuras da década e de alguns dos momentos que as marcaram. De Marcelo Rebelo de Sousa a consolar um homem idoso após os incêndios de outubro de 2017 a Rui Rio a tocar bateria na Quinta da Malafaia; do olhar desolado de Fernando Medina após perder as Autárquicas de 2021 a Luís Montenegro coberto de tinta verde. Lá fora, as idas dos Antónios — Costa e Guterres — a Kiev, durante a guerra, ou a eleição de Jair Bolsonaro no Brasil.

Patrícia Reis opta também por destacar uma das paredes desta sala, dominada por artistas e intelectuais, de Eunice Muñoz a Ricardo Araújo Pereira, das vindas de Taylor Swift e Chris Martin a Portugal até à consagração de Salvador Sobral. “Há várias imagens que são de protagonistas da nossa década, fotografados pelo Observador, e que são fotografias felizes. São fotografias de reconhecimento de talento, e isso é incrível, não é? Teres um jornal que dá esse privilégio à cultura”, comenta. Talvez não haja maior prova disso do que a fotografia em grande plano, cobrindo toda uma parede, de Maria do Céu Guerra, tirada em abril deste ano.

Uma exposição fruto de um jornal “que quer estar lá”

Num dos discursos de inauguração desta exposição, José Manuel Fernandes, publisher e um dos fundadores do Observador, partilhou uma pequena mas reveladora história acerca da génese do projeto e da sua relação com a fotografia.

“Imaginem lá, que arrancámos o Observador sem um fotógrafo de raiz”, contou aos presentes na Sociedade de Belas Artes. No início, quando o jornal ainda tinha como base de operações o Bairro Alto, a ideia passou por dotar os jornalistas que fizeram parte do arranque com telemóveis capazes de tirar fotografias. “Encontrámos um fotojornalista profissional que andou pelo Bairro Alto com os jornalistas da equipa inicial do Observador, que não chegavam a 40, a explicar como é que com o iPhone se podia remediar a falta de fotojornalistas”, revelou, para depois atirar: “isto não durou muito tempo, como devem imaginar”, arrancando sorrisos da sala.

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Apesar de ainda fazer parte do ADN do projeto a lógica dos próprios jornalistas fotografarem e gravarem quando tal é necessário — “isso não desapareceu, essa cultura não é tabu”, frisou —, desde então que o Observador passaria a investir fortemente na componente visual do jornalismo. “De imaginar que era assim que se ia resolver o problema da fotografia até àquilo que vão ver aqui há um caminho enorme que foi percorrido e ainda bem que foi percorrido, porque senão não teria sido possível aquilo que nós temos feito, que é procurar sempre fazer diferente e melhor”, terminou.

A opinião é partilhada pelo editor de fotografia do Observador, João Porfírio, que reflete como eram esses tempos e que mudanças houve desde então. “Tenho mesmo a sensação de que a fotografia tem sido mais valorizada. Sou prova disso. Quando entrei no Observador, o fotojornalista não tinha o papel que tem hoje. Isso também mostra que houve uma reeducação, digamos assim, por parte das chefias em perceber que vale a pena investir nisto”, defende.

Segundo o editor de fotografia do jornal, uma exposição como esta apenas é possível devido “a um grande investimento por parte da empresa em não mandar só jornalistas redatores, mas também ter como enviados especiais fotojornalistas e repórteres de imagem da equipa de multimédia”. A seu ver, tal aposta até pode ter um custo financeiro associado, mas “no fim de contas, isso compensa, porque o leitor reconhece o trabalho como sendo do Observador e cada vez mais o Observador posiciona-se num papel de notoriedade”.

Rita Chantre / Observador

“Desde 2014 que o Observador faz uma cobertura intensiva, e cada vez mais, sobre aquilo que se passa no país e no mundo. Ou seja, não nos limitamos a ficar sentados na redação a ver as coisas a acontecer. Não temos problemas nenhuns em ir aos sítios. Prova disso é que estivemos quase quatro meses de seguida na Guerra da Ucrânia, temos feito a cobertura de todas as eleições que dizem bastante aos portugueses, como as francesas, as espanholas, as norte-americanas, as brasileiras, as britânicas. Portanto, vamos a esses sítios todos e por isso é que o Observador também se distingue dos outros órgãos de comunicação social e sobretudo dos outros jornais, que cada vez mais têm tido um papel de retrocesso em relação a isso, a estar lá. Para mim, o jornalismo é estar lá, e o Observador tem feito isso e cada vez mais”, aponta.

As várias facetas do universo Observador

Fazendo jus ao seu nome, há 10 anos que o jornal dá a ler e ver — mas também dá a ouvir há cinco. Parte intrínseca do projeto desde 2019, a Rádio Observador não podia ficar de fora das celebrações, merecendo uma sala com uma iniciativa muito particular. Com os sinais “on air” à entrada e com a primeira emissão de sempre a passar em loop, o segundo espaço da exposição conta com dois cadeirões, computador e, claro, microfone, para quem deseje experimentar envolve-se na magia da rádio.

“Há a possibilidade, aos sábados, das pessoas chegarem  à exposição e lerem notícias como se fossem jornalistas do Observador — é gravado e esse ficheiro é enviado aos visitantes, posteriormente. É um momento meramente simbólico, mas eu acho que é uma interação que pode ser interessante para muitas pessoas, nomeadamente para visitantes mais novos, a experiência de ler uma notícia de rádio”, afirma Patrícia Reis. De resto, “era evidente que a rádio tinha de estar presente, nós fizemos um esforço muito grande para dar-lhe um espaço próprio”, conta a curadora.

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Há, no entanto, mais dimensões do Observador em destaque nesta exposição — dos prémios ganhos ao longo de 10 anos aos vários livros já lançados por jornalistas e colaboradores ligados ao projeto, tal como as várias revistas que foram sendo lançadas. “é muito interessante, porque a exposição, no fundo, acaba por mostrar o universo Observador, as suas diferentes mais-valias, sejam as revistas — a de lifestyle, a dos 10 anos, as dos aniversários — seja nos livros. Portanto, há um bocadinho de tudo, o que dá bem a ideia da multiplicidade de dimensões”, observa. “É um bocadinho sairmos da nossa redação, no número 7 da rua João Saraiva, para levarmos o nosso jornal até às pessoas”, acrescenta João Porfírio.

A melhor súmula de tudo o que representa o Observador está reservada para quem vê a exposição até ao fim, encontrando na última sala um vídeo a contar a história dos 10 anos do projeto. Já exclusivo a quem esteve na inauguração da exposição foram as palavras de António Carrapatoso, presidente do Conselho de Administração, que lembrou um conversa com Vasco Pulido Valente. “Uma vez perguntei-lhe o que é que ele achava importante que o nosso projeto tivesse. Ele respondeu que tivesse graça. Realmente, ser enfadonho, ser chato, ser boring, é das coisas piores que há. É melhor ser irritante, é melhor ser agressivo do que ser apenas chato. Nós procuramos ter graça, procuramos fazer as coisas também com um certo estilo, com uma certa elegância, quando é possível”.

Lembrando que o jornal nasceu “baseado na independência, antes de tudo, mas também na qualidade, na defesa do interesse público, na defesa dos interesses dos cidadãos, aberto, com diversidade, mas também com ponto de vista”, frisou que a exposição demonstra aquilo que tem sido a postura do jornal desde a sua génese. “Às vezes temos de ser um bocadinho mais brutos, mas mesmo na brutalidade gostamos de ser elegantes e esta exposição também mostra isso, tem muito a ver com a marca Observador e com o nosso posicionamento enquanto projeto de comunicação social, mas que basicamente, pretende ser um projeto da sociedade e dos cidadãos”, terminou.

  • A exposição inaugura a 7 de novembro e estará patente ao público até 7 de dezembro na Sociedade Nacional de Belas Artes (Rua Barata Salgueiro, 36, Lisboa)
  • De segunda-feira a sábado, entre as 12h00 e as 19h00 (ao sábado as portas abrem às 14h00). Entre os dias 12 e 16 de novembro, a hora de fecho é às 21h00 e no domingo, dia 17, a exposição também pode ser visitada, entre as 14h00 e as 21h00.
  • A entrada é livre.

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