O Governo vai alterar o limite a partir do qual sujeita rendimentos mais elevados à taxa adicional de IRS. Assim, a chamada taxa adicional de solidariedade, criada durante o período da troika, vai passar a ser paga pelos rendimentos a partir de 81.199 mil euros, em vez dos 80 mil atualmente em vigor. Governo fala em ajuste técnico.

Essa é pelo menos a intenção do Governo que aproveitou o pedido de autorização legislativa, entregue no Parlamento, para o IRS Jovem para também incluir na proposta a mudança do montante mínimo a partir do qual é pago um adicional de imposto. E com isso livra do pagamento os rendimentos entre os 80 mil euros e os 81.199 euros, voltando o adicional a incidir apenas no último escalão do IRS, tal como acontecia até este ano.

Ao Observador, o Ministério das Finanças confirma que o pedido ao Parlamento, ainda que tenha sido feito na proposta sobre IRS Jovem, incide sobre todos os contribuintes com esses níveis de rendimentos. E justifica a proposta de alteração precisamente com o facto de a lei do orçamento do Estado de 2024 ter alterado a tabela de IRS mas sem atualizar a das taxas adicionais, dizendo tratar-se de um “ajuste técnico”.

“A Lei do Orçamento do Estado 2024 atualizou a tabela de taxas gerais (cfr. artigo 230.º da Lei do OE 2024, alteração ao artigo 68.º do Código do IRS) não tendo, porém, atualizado a tabela de taxas adicionais de solidariedade (artigo 68.º-A do Código do IRS)”, diz o Ministério das Finanças. E acrescenta: “Este desalinhamento nas atualizações, que cremos ter-se devido apenas a um lapso, sujeita parcialmente os rendimentos do penúltimo escalão à taxa adicional de solidariedade, que é um regime excecional, criado de forma temporária, e que sempre se aplicou apenas aos rendimentos do último escalão”. Assim, conclui: “esta incoerência ficará corrigida pela via legislativa”.

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No Orçamento do Estado para 2024 foram atualizados os escalões de IRS e o oitavo passou de um limite máximo de rendimentos de 78.834 euros para 81.199 euros, mas a taxa de solidariedade manteve-se a partir dos 80 mil euros. O que significou que este escalão (o penúltimo) foi apanhado por esse adicional. E é essa correção que o Governo quer fazer, estabelecendo os 81.199 euros, rendimento a partir do qual se aplica o nono escalão (com uma taxa de 48%) do IRS, como limite a partir do qual também recai o adicional.

Taxa adicional de IRS para ricos arrasta-se no tempo e agora vai atingir penúltimo escalão de imposto

Segundo o Código do IRS, essa taxa adicional é de 2,5% para rendimentos entre 80 mil e 250 mil euros e de 5% para valores acima de 250 mil euros.

O Governo faz, agora, a proposta para que os 2,5% passem a aplicar-se a rendimentos entre os 81.199 euros e os 250 mil. E fá-lo na proposta de autorização legislativa que prevê várias alterações ao Código do IRS como a criação de “um regime estrutural e definitivo do IRS Jovem”, diz o Ministério das Finanças. Além desse regime, “quer o diploma de autorização, quer a proposta de diploma autorizado referem, além da criação do regime estrutural e definitivo do IRS Jovem, um ajuste à redação do n.º 1 do artigo 68.º-A (taxa adicional de solidariedade)”. E, assim, “confirmamos que esta alteração ao artigo 68.º-A do Código do IRS abrange todos os contribuintes (independentemente de estarem ou não no âmbito do IRS Jovem) relativamente aos rendimentos que aufiram entre 80.000 euros e 81.199 euros”.

O número de agregados e a liquidação de IRS da taxa adicional voltou a subir em 2022. No país houve 26.757 agregados que tiveram de pagar o adicional, garantindo ao Estado uma receita de 66,33 milhões de euros, mais 17% que em 2021, segundo as estatísticas da Autoridade Tributária.

A taxa adicional de solidariedade foi criada em 2011, no âmbito do Orçamento do Estado para 2012, no início do programa de ajustamento de Portugal que teve de viver sob intervenção da chamada troika (Comissão Europeia, FMI e BCE) por ter recebido dinheiro emprestado. A taxa, criada por Vítor Gaspar, então ministro das Finanças de Pedro Passos Coelho, pretendia aplicar aos “contribuintes do último escalão” uma taxa adicional de 2,5%. No ano seguinte, o rendimento a partir do qual se aplicaria a taxa foi diminuído para os 80 mil euros. Mais tarde foi criada uma nova taxa, de 5%, para rendimentos acima de 250 mil euros. A taxa acabou por ficar conhecida como o adicional para os mais ricos.