Reconhecer o período experimental (de cinco anos) a quem está há 10 na carreira de investigação científica com contratos precários foi uma das propostas que as estruturas sindicais apresentaram esta quarta-feira ao ministro da Educação. Frente a frente, Governo e sindicatos discutiram a criação do apelidado “novo” Estatuto da Carreira de Investigação Científica. Esta estatuto já existe, mas está desde 1999 sem ser revisto. Nas negociações foram feitos “progressos”, dizem os sindicatos ao Observador. Mas ambas as partes — investigadores e Governo — reconhecem que há “profundos desacordos” em certos aspetos.
“Há pontos de vista antagónicos em que não chegaremos a acordo; há um profundo desacordo no âmbito da aplicação do estatuto” da carreira, conta José Moreira, presidente do SNESup (Sindicato Nacional do Ensino Superior), e diz que a proposta do Ministério tutelado por Fernando Alexandre é que o estatuto seja “só aplicado às instituições privadas de modo facultativo”.
Ministro quer novo estatuto da carreira de investigação aprovado em julho
“Na maioria dos casos, estas instituições são uma espécie de sucursal, o que lhes permite sair do controlo mais rígido orçamental. E os ‘donos’, os únicos intervenientes na sua gestão, são instituições públicas. Ou seja, grande parte da sua atividade é financiada por dinheiros públicos, pelo que nos parece que os investigadores destas instituições deveriam estar mais sujeitos ao mesmo estatuto”, argumenta.
Mas “o Governo dificilmente cederá”: “De acordo com o Governo, tem de haver uma separação clara de água”, diz.
No final da negociação, o ministro Fernando Alexandre também reconheceu: Há “dimensões em que não conseguiremos aproximar a nossa posição da dos sindicatos, mas penso que as diferenças não são assim tão grandes e há sempre áreas em que poderemos melhorar.”
Governo contra reconhecer tempo a quem se “arrasta no sistema” em situação de precariedade
Outras das exigências do sindicato do Ensino Superior é que seja criado um “período transitório” para os investigadores que se “arrastam no sistema há mais de 10 anos com contratos de bolsa ou a termo”. A ideia, explica José Moreira, era que “fosse reconhecido todo o seu percurso em termos experimental, porque foram sempre avaliados e submetidos a concurso e muitos estão sempre a voltar ao princípio”, sendo afetados pela precariedade da carreira.
Uma vez mais, “o Governo dificilmente aceitará”, diz: “Não pareceu estar aberto a criar um mecanismo de transição que contemple quem se arrasta neste sistema de precariedade. Mas esta é a realidade de mais de 80% dos investigadores… O número de contratos aumentou bastante, mas são contratos de trabalho a termo certo.”
Já a FNE critica a proposta do Ministério de Fernando Alexandre de permitir a investigadores no estrangeiro (portugueses ou não) concorrer à posição de investigadores principais “sem fazer a agregação”.”Parece-nos um veículo de ultrapassagem. Compreendemos que há muitos investigadores noutros países com currículos muito relevantes, mas “as regras têm de ser identificas para quem trabalha em Portugal e no estrangeiro”, diz José Luís Abrantes.
“Substituiriam a agregação por um reconhecimento técnico que seria votado no Conselho Científico na Faculdade ou Escola onde estivesse aberto o concurso. A nosso ver, devem tirar a agregação e não abrir-se uma exceção”.
Proposta dá entrada no Parlamento em setembro
A avaliação da ronda negocial desta quarta-feira por parte de ambos os sindicatos foi positiva, com o líder da organização do Ensino Superior a destacar, por exemplo, a proposta de que “todos os investigadores em regime normal de contratação estejam em dedicação plena“. “É bom a nível de direitos e deveres e remuneração.”
Já o sindicalista da FNE ficou satisfeito com a possibilidade de, “os investigadores que desenvolverem patentes e direitos de autor, poderem criar a sua start-up ou empresa sem perderem o regime de exclusividade durante cinco anos”, o que lhes garante alguma segurança.
Ministro da Educação e Ciência admite que precariedade na investigação atingiu ponto inaceitável
No que toca à próxima ronda negocial, nenhuma das organizações sindicais ficou esclarecida sobre um possível encontro, mas aguardam pelo documento final. Segundo o líder da pasta da Educação, “a proposta deverá dar entrada na Assembleia da República no início de setembro“. “É muito importante que aconteça, porque vamos ter um concurso bastante grande, com mil investigadores a entrar na carreira de investigação científica”, diz.
Queremos ter “uma proposta de estatuto que, por um lado, responde às questões de precariedade e torna a carreira mais atrativa. E, por outro lado, dá as instituições um enquadramento para poderem beneficiar da contratação de novos investigadores”, resumiu Fernando Alexandre.