Donald Trump, candidato republicano às presidenciais dos Estados Unidos de novembro, fez inversão de marcha em relação aos criptoativos. Se durante anos foi um crítico da criptomoeda mais popular do mundo, justificando que a bitcoin e outras moedas do género “não eram dinheiro” e que tinham “um valor altamente volátil e baseado em ar”, agora assume-se como um defensor do setor.

Este sábado, Donald Trump esteve em Nashville, no estado do Tennessee, na Bitcoin Conference 2024, um evento anual dedicado à criptomoeda. Embora o evento seja apartidário, Trump aproveitou a ocasião para fazer promessas eleitorais.

Trump quer agora garantir que os Estados Unidos da América (EUA) se tornam “a capital cripto do planeta e a bitcoin o superpoder do mundo”, cita a NBC News. “Se não adotarmos a tecnologia cripto e a bitcoin, a China adotará, outros países adotarão. Vão dominar e não podemos deixar a China dominar”. Eles já estão a progredir demasiado”, declarou o candidato, em declarações citadas pela Reuters.

A China tem das regulações mais duras em relação aos criptoativos e desde 2021 que a mineração cripto é proibida no país. Ainda assim, os chineses podem negociar estes ativos em plataformas estrangeiras.

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Durante o discurso, Trump teceu críticas à postura da atual administração Biden e de alguns democratas em relação às criptomoedas. “Prometo à comunidade bitcoin que, no dia em que faça o juramento, a cruzada anti-cripto de Joe Biden e de Kamala Harris vai acabar.”

Caso seja eleito em novembro, quer “nomear um novo líder para a SEC [Comissão de Valores Mobiliários dos EUA] que construa o futuro, não que o bloqueie”. Gary Gensler, o presidente da SEC, não é visto com bons olhos pelos adetos das criptomoedas nos EUA, em parte devido às decisões da agência em relação aos tokens digitais e aos processos movidos contra algumas plataformas de negociação de bitcoins.

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Caso seja eleito, Trump quer criar um conselho presidencial para as criptomoedas e também garantir que seja criada na administração uma reserva de criptoativos de “forma a manter a 100% todas as bitcoins que o governo dos EUA detém ou adquira no futuro”. Atualmente, o governo norte-americano tem alguns criptoativos que foram apreendidos durante ações judiciais, refere a Reuters.

Trump não é o único candidato a falar sobre a bitcoin. Também o candidato presidencial independente Robert F. Kennedy Jr. deixou a promessa da criação de uma reserva de bitcoin. Caso seja eleito, disse que quer indicar ao Tesouro norte-americano que adquira quatro milhões de bitcoins — aos valores atuais de 67.802 dólares a ideia custaria cerca de 271 mil milhões de dólares.

A organização da conferência disse mais tarde que Kamala Harris não aceitou o convite para participar na conferência, sem tecer mais comentários. No entanto, na rede social X, David Bailey, um dos nomes na organização, foi mais longe e criticou a ausência de Harris. “O que é que ela nos pode dizer quando está ativamente a aprisionar programadores, a forçar a nossa indústria para o estrangeiro, a atacar provas de trabalho… Seria um desastre para ela. Todos os olhos em Trump agora”, escreveu na rede social X.

De onde vem esta mudança de ideias de Trump?

Donald Trump fez uma viragem de 180 graus em relação aos criptoativos. Em 2019, quando ainda era Presidente, publicou uma série de mensagens no então Twitter onde dizia que não era fã de criptomoedas, sublinhando que “só existe uma real divisa nos EUA”, o dólar.

Mais tarde, já em 2021, disse à Fox Business que a bitcoin parecia “um esquema”. “Não gosto dela porque é mais uma moeda que compete contra o dólar”, citou a BBC.

A Bloomberg nota que a súbita mudança de ideias de Trump é uma movimentação arriscada, mas que lhe poderá render alguns votos junto da indústria e também algum financiamento. Elon Musk, um entusiasta das criptomoedas, principalmente da dogecoin, já apoiou publicamente Trump. Tyler e Cameron Winklevoss, os cofundadores da Gemini e os gémeos que processaram Zuckerberg na altura da criação do Facebook, avançaram com donativos: cada um doou um milhão de dólares em bitcoin à campanha de Trump. Cameron Winklevoss justificou o donativo com o facto de Trump ser “pró-bitcoin, pró-cripto e pró-empresas” e prometer “pôr fim à guerra da administração Biden às criptomoedas”.

Já o irmão declarou numa publicação mais longa que “é tempo de o exército cripto deixar uma mensagem a Washington”. “Atacarem-nos é um suicídio político”, resumiu na mensagem.

Além dos irmãos Winklevoss, Trump também já conquistou o apoio de outros nomes multimilionários da indústria da tecnologia, como o investidor Marc Andreessen ou Ben Horowitz.

A conferência anual da bitcoin não foi o único evento em que Trump falou sobre criptoativos. Antes disso, já tinha feito em maio um evento em Mar-a-Lago, na Flórida, dedicado a quem comprou os seus NFT (ativos não fungíveis), onde surge em cartas colecionáveis que custam 99 dólares cada uma. Nas imagens, assume a figura de um cowboy, um robô ou até super-herói musculado que emite feixes de luz das mãos.

A Bloomberg refere que terá sido a partir dos “cromos” colecionáveis em formato digital que Trump terá começado a mudar de ideias em relação aos criptoativos. “Os NFT de Trump foram o que realmente o deixou à frente das pessoas das criptomoedas pela primeira vez”, contextualiza à Bloomberg Kristin Smith, a CEO da Blockchain Association, um grupo empresarial que tem assegurado as ligações entre a campanha de Trump e a indústria das criptomoedas.

Após o discurso de Trump, a 27 de julho, a bitcoin atingiu um máximo de 13 de junho, tocando nos 68.225,59 dólares, de acordo com dados da CoinDesk.

Campanha de Harris quer fazer “reset” à relação com o setor dos criptoativos

Enquanto Trump tem usado os criptoativos como uma arma de campanha, a candidata democrata não quer ficar de braços cruzados. O Financial Times escreveu durante o fim-de-semana que os conselheiros de Kamala Harris já abordaram algumas das principais empresas do setor cripto para tentar “reiniciar” as relações e ganhar algum apoio.

De acordo com o jornal britânico, quatro fontes com conhecimento dos contactos revelaram tentativas para marcar reuniões ao longo dos próximos dias com empresas como a Coinbase, a Circle ou ainda o grupo de pagamentos em blockchain Ripple Labs. No entanto, nenhuma das empresas confirmou a existência destes contactos.

O objetivo dos contactos, segundo explica o jornal britânico, tem como intuito passar a mensagem de que os democratas “são a favor das empresas” e também fomentar relações que mais tarde poderão levar a um enquadramento regulatório para a expansão dos criptoativos.