Barbara Schett e Mats Wilander até podiam ter mantido sempre a tónica da apresentação no “Nuno Borgués” acentuando o ‘g’ como se existisse um ‘u’ de seguida (a melhor explicação possível para explicar a forma meio estranha como pronunciavam o nome do português) mas esse era o único vestígio de “desconhecimento” em relação ao tenista maiato que, na semana em que ocupava a melhor posição de sempre no ranking, regressou a uma quarta ronda de Grand Slam no US Open, torneio que lhe diz muito pelos quatro anos que passou no país enquanto fazia o curso universitário na Universidade de Mississippi State. Aliás, até pelo adversário, era quase um final de época a regressar ao primeiro Major do ano quando defrontou Daniil Medvedev, atual número 5 do mundo. E era nas nuances entre os dois torneios que havia uma janela de oportunidade.

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Na antecâmara do encontro que marcaria a estreia do português no Arthur Ash Stadium, maior estádio do mundo de ténis que tinha recebido na abertura da jornada o triunfo da norte-americana Jessica Pegula frente à russa há vários anos radicada nos EUA Diana Shnaider, o português perdeu na terceira ronda de pares com Francisco Cabral frente aos australianos Jordan Thompson e Max Purcell (sétimos cabeças de série dessa variante) e admitiu que a parte física também teve o seu peso numa partida onde a dupla nacional partia como outsider. “Não estava tão fresco e isso pode ter pesado em alguns momentos. Senti mais dificuldades na resposta, se calhar não estava tão ágil como gostaria de estar e tão felino como nos jogos anteriores mas é normal, não tive assim tanto tempo para recuperar do encontro. Às vezes, são esses pequenos detalhes que fazem toda a diferença num encontro de pares”, admitiu o maiato no final da partida.

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Percebia-se o porquê. A primeira ronda frente a Federico Coria foi uma grande injeção de confiança a todos os níveis, não só pela vitória mais expressiva de sempre na carreira em Grand Slams (6-1, 6-4 e 6-2) mas pela forma como conseguiu impor o seu jogo frente a um argentino sem forma de contrariar o poderio contrário. No segundo encontro, diante de um motivadíssimo Thanasis Kokkinakis acabado de bater Stefanos Tsitsipas, foi cirúrgico nos pontos chave, puxou quase todas as vantagens para o seu lado e conseguiu voltar a fechar o triunfo por 6-4, 7-5 e 7-5. Numa histórica terceira ronda onde nunca chegara, alcançou mais uma vitória diante do checo Jakub Mensík com 6-7 (5), 6-1, 3-6, 7-6 (8) e 6-0 mas não evitou um enorme desgaste.

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O jogo de Mensík, a ligar e desligar da partida num teste à resistência dos adversários, deixou a sua mossa e nem mesmo o facto de ter salvo três match points recuperava essas quase quatro horas de uma partida muito intensa. Ainda assim, e num contexto diferente da Austrália onde ganhara a Grigor Dimitrov com um jogo de sonho, Nuno Borges reencontrava Daniil Medvedev com a possibilidade muito complicada de chegar a uma inédita presença de um português nos quartos de um Grand Slam num dia que já era histórico para si e para o ténis português, por ter beneficiado da derrota de Tomas Machac frente a Jack Draper para garantir em termos oficiais que iria entrar pela primeira vez na carreira no top 30 do ranking mundial, algo que só João Sousa tinha conseguido (28.º em maio de 2016). Isso estava garantido, o “impossível” vinha a seguir.

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O encontro dificilmente poderia ter começado pior para Nuno Borges, a ter o jogo de serviço inaugural por escolha de Daniil Medvedev. Após um primeiro ponto perdido, o português fez duas duplas faltas seguidas, sofreu o break em branco, consentiu o 2-0 com dois pontos no serviço do russo e sofreu novo break logo de seguida para o 3-0 num jogo onde até começava a dar sinais de uma ligeira melhoria. Entre a habituação a um court muito específico e o encaixe nos pontos fortes do “Polvo”, o maiato ainda conseguiu ir às vantagens pela primeira vez no quarto jogo do set inicial mas nada conseguiu fazer quando Medvedev puxou dos seus melhores serviços, ficando quase refém daquilo que o adversário mostrava para a partir daí tentar contornar os obstáculos. Nem mesmo o serviço funcionava como “tábua de estabilização” no encontro, com o parcial inicial a fechar com uma bicicleta de 6-0 com muito para esquecer e pouco para recordar.

Logo a abrir o segundo set, e ao fim de 28 minutos, Nuno Borges conseguiu ganhar o seu primeiro jogo a servir mas a pressa de fazer mais e melhor acabou por ser um adversário tão grande ou maior do que já era Medvedev. O português percebera o melhor posicionamento na resposta aos segundos serviços do russo, ia colocando outro tipo de problemas ao russo mas não evitava os erros não forçados, as duplas faltas e as bolas que saíam demasiado curtas passando a vantagem para o outro lado. Com isso, e sem ter de forçar muito ritmo a ponto de entrar naquelas espirais em que a personalidade o atraiçoa, Medvedev voltou a fazer um break para o 2-1, segurou o seu jogo de serviço e foi buscar um encontro com 0-40 para nova quebra de serviço que decidiu em definitivo o segundo parcial, que fecharia pouco depois com 6-1 depois de o português ter beneficiado de dois pontos de break não convertidos no então sexto encontro do set.

Estava tudo a tornar-se demasiado fácil para Medvedev mas nem por isso Nuno Borges baixava os braços,  começando a soltar cada vez mais a sua frustração para ver nisso um caminho para “chamar” o público para o seu lado e reencontrar uma qualidade de jogo que ainda não tinha aparecido. A forma como festejou o 1-1 no seu serviço, depois de vários pontos nas vantagens, foi o grito do Ipiranga confirmado de seguida com um primeiro break ao serviço do russo que o colocava em vantagem antes de mais uma paragem no mínimo “insólita” nas vantagens do quarto jogo devido a… um alarme de incêndio na sala de controlo. Não é que a irregularidade tivesse desaparecido a 100% mas o português estava no seu melhor momento da partida antes da paragem, entrando a frio para sofrer o break para 2-2. Pela primeira vez, o set tinha “estabilizado”, com Nuno Borges a passar para cima quando a percentagem de primeiro serviço aumentava mas o oitavo jogo que passou de 30-0 para break acabou por ser fatídico para a derrota por 6-3 no último parcial.