Recuando até ao final de maio ou início de junho, recuperando aquilo que deveria ser a janela de mercado de verão do Sporting e comparando com aquilo que se tornou, não se pode dizer que tudo tenha sido conforme previsto. No entanto, e em paralelo, a forma como decorreram os últimos meses a nível de transferências são também o melhor exemplo da mudança de paradigma que a SAD verde e branca conseguiu enraizar depois dos primeiros sinais deixados em 2023 – e essa acaba por ser a principal ilação em relação ao trabalho feito pelos responsáveis do campeão, que fora reforços para a equipa B tendo em vista uma potencial evolução para chegar ao conjunto principal (Bento Estrela, luso-americano de 18 anos do New York Red Bulls, é um exemplo paradigmático disso mesmo) acabou por avançar apenas para quatro aquisições em 2024/25.

Comecemos então pelo “plano inicial”. Aliás, comecemos com aquele que era um primeiro “problema” de Rúben Amorim enquanto técnico do Sporting depois de ter ficado dissipada por completo a possibilidade de deixar Alvalade. Apesar da conquista do título, o segundo em quatro anos, o treinador percebia que teria de haver uma “renovação” em relação à base que construíra quando chegou aos leões e que valeu as conquistas de um Campeonato, duas Taças da Liga e uma Supertaça e que isso faria com que alguns elementos com quem tinha ligação mais forte teriam de sair. Pela primeira vez na carreira, Amorim tinha de “abdicar” dos seus – e isso não seria fácil pela ligação existente. Acabou por acontecer, de forma natural. Adán e Luís Neto tiveram uma despedida especial no último encontro da Liga, Paulinho foi vendido para um projeto que o próprio achou interessante nesta fase da carreira, Esgaio estava também nas possíveis saídas.

A única nuance acabou mesmo por ser Sebastian Coates. Rúben Amorim contava com o central e capitão por mais uma temporada, admitindo que poderia não fazer tantos jogos como nas últimas épocas, sabendo que em junho de 2025 o central iria sair de forma natural para o Nacional, do Uruguai. Isso daria tempo para Zeno Debast, central que estava há muito referenciado como prioridade para a defesa, ter uma temporada de “adaptação” e colocaria Hjulmand como um sub-capitão a par de Daniel Bragança para assumir de seguida. Contudo, entre a vontade de regressar mais cedo devido a um problema de saúde de um familiar e um raide do conjunto uruguaio a Lisboa quando percebeu que seria possível antecipar a sua chegada, Coates reuniu com os responsáveis leoninos para aferir sobre a possibilidade de sair este verão. A conversa, feita de forma aberta, foi ao encontro do que pretendia, ficando definida também uma homenagem em Alvalade.

Perante essa inesperada baixa, e de acordo com os planos que estavam gizados para reforçar outras posições, o Sporting apostou tudo em segurar Gonçalo Inácio, que pelas características como jogador era um elemento referenciado por vários clubes europeus (e ainda é), e Ousmane Diomande, jovem central marfinense que inicialmente poderia ser uma das vendas possíveis para equilíbrio de contas caso fosse necessário e surgisse uma proposta elevada de Inglaterra ou França. Conseguiu. A ideia de trabalhar com quatro defesas para ter um plano alternativo ainda foi testada na pré-temporada mas a linha de três manteve-se como melhor opção tática dentro das nuances introduzidas na equipa, sendo que Iván Fresneda, Ricardo Esgaio e Matheus Reis foram mais trabalhados para ocuparem (se necessário) as posições de centrais por fora. Nem a nova lesão de Jeremiah St. Juste levou a formação verde e branca a ponderar avançar para outro defesa.

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A chegada de Maxi Araújo, internacional uruguaio contratado aos mexicanos do Toluca (onde joga agora e com sucesso Paulinho), e a afirmação de Geovany Quenda numa ala perante a lesão de Nuno Santos no jogo particular com o Sevilha no Algarve equilibrou as opções para as alas, sendo que a própria polivalência da cara nova foi outro dos fatores que contribuiu para a decisão recente mais difícil para Rúben Amorim tomar: de quem poderia abdicar para equilibrar as contas? Caso ficasse em Alvalade, Mateus Fernandes iria ter minutos mesmo não sendo uma aposta inicial como serão Hjulmand, Morita ou Daniel Bragança, mas o técnico preferiu deixar sair o internacional Sub-21 (ficando com 10% de uma futura mais valia) para manter todas as restantes unidades fulcrais do plantel, contando também com a polivalência de Pedro Gonçalves – que chegou a receber sondagens interessantes sem que as mesmas tivessem continuidade – para o setor.

No ataque, aquilo que era uma necessidade tornou-se quase uma novela que esteve para não ter um último capítulo sem que, em termos internos, fossem ligados botões de alarme. Porquê? Fotis Ioannidis, avançado grego que foi sempre o plano A para reforçar o ataque por ser um nome com muitos pontos em comum com Viktor Gyökeres sendo compatível na equipa com o sueco, não saiu do radar do Sporting mas há algumas semanas que os responsáveis verde e brancos tinham percebido que seria muito complicado garantir o jogador perante a intransigência do Panathinaikos, que não mudou com uma oferta de 25 milhões mais variáveis e percentagem de mais valia futura. Ainda assim, nunca deixaram cair a possibilidade por jogarem com essa hipótese então bem mais remota de haver uma abordagem final a Viktor Gyökeres este verão.

Vítor Roque também foi uma hipótese, com o Barcelona a dar até prioridade ao Sporting por estar em cima da mesa uma cedência a título definitivo, mas o agente do jogador apontou sempre para uma continuidade na Liga Espanhola como acabou por acontecer (Betis). Assim, as atenções viraram-se para Conrad Harder, um dos jovens avançados a atuar em ligas escandinavas que o departamento de scouting estava a seguir há algum tempo (Orri Steinn Óskarsson, islandês do Copenhaga, era outro dos nomes, tendo assinado pela Real Sociedad na última semana por 20 milhões de euros). Hugo Viana deslocou-se à Dinamarca na quarta-feira para encetar negociações, pelo meio houve o interesse do Brighton e de outro conjunto inglês, no final o destino foi mesmo o Sporting com a nuance de chegar mais “caro” do que se pensava inicialmente.

Com a entrada do jovem internacional Sub-19 dinamarquês, e perante a permanência de Marcus Edwards no plantel apesar de ter perdido a posição para Francisco Trincão (e também face à inexistência de propostas por valores que levassem o Sporting a ponderar a venda, algo que no plano inicial do mercado era colocado como possibilidade), o plantel já estava fechado conforme tinha sido delineado nas reuniões preparatórias da nova temporada entre Rúben Amorim, Hugo Viana e Frederico Varandas e o último dia de mercado chegava com a única dúvida em relação à hipótese de Esgaio poder ainda sair ou não para Braga.

O mercado fechou com os mesmos passos definidos na última temporada (para ser “igual”, Ioannidis tinha sido reforço já neste verão, como não aconteceu): poucas contratações, alvos definidos, um scouting que não só analisa potenciais reforços em forma de mais valia como procura jogadores que se enquadrem com a ideia de jogo de Rúben Amorim num plano A ou B. A par disso, houve valores “indiretos” que ajudaram a fazer um maior equilíbrio das contas, casos de Fatawu (Leicester accionou cláusula, 9,1 milhões), Palhinha (saiu do Fulham para o Bayern, 3,3 milhões) ou Renato Veiga (trocou Basileia pelo Chelsea, 1,66 milhões). Contas feitas, juntando os 4,8 milhões do novo guarda-redes, Kovacevic, o Sporting gastou cerca de 53 milhões de euros em contratações e realizou quase 40 milhões em vendas neste mercado de verão.

O regresso à fase de grupos da Liga dos Campeões, a “folga” ganha com a revalidação de obrigações por parte de subscritores que tinham assinado o plano 2021-2024 (o que faz com que o pagamento passe apenas para 2027) e o maior alívio das obrigatoriedades bancárias em termos de mercado que existiam no acordo com Millennium BCP e Novo Banco permitiram que o Sporting consolidasse o projeto para o futebol profissional, percebendo também que o contexto para a tentativa de revalidação do título como o clube não consegue desde a década de 50. No mercado de janeiro, entre a “montra” que será a Champions, a evolução da equipa e os resultados conseguidos, poderá haver uma reavaliação mas, por ora, tudo ficou como previsto.