Quando vemos George Clooney e Brad Pitt juntos num filme, sabemos que é uma receita pré-cozinhada. No novo Wolfs junta-se outro nome: o de Jon Watts, que depois de dois filmes indie bem esgalhados — Clown e Cop Car — saltou para a liga dos grandes com os três Homem-Aranha versão Tom Holland (e em breve entrará no franchise Star Wars). Agora, tenta a possível alternativa a super-heróis: um filme com superestrelas. Mas juntar Clooney e Pitt gera consequência inescapáveis. A prova mais óbvia é da trilogia Ocean’s. Lembra-se de como era tão divertido?
Eis então o primeiro passo desta megaoperação da Apple, que (nada surpreendentemente) já tem em linha uma sequela: convidar-nos a entrar em Wolfs despertando a exata e inevitável memória de como aqueles dois vão tão bem juntos. Como eles são notáveis quando fazem aquilo que se espera deles, que sejam simplesmente George Clooney e Brad Pitt, enfiados num contexto em que a imbatível beleza e simpatia do duo triunfam, em fusão com um certo humor de quem gosta de ser auto-consciente: Clooney a fazer bem de Clooney, Pitt a fazer bem de Pitt. Dois egos desta magnitude, juntos num quarto de hotel.
[o trailer de “Wolfs”:]
Portanto, pouco de novo aqui. O filme era para ter uma estreia mais vistosa em cinema, mas acabou por ter um lançamento limitado nos Estados Unidos. As reações no Festival de Veneza, onde se estreou, ficaram aquém das expectativas também. Quer isto tudo dizer que perderam a piada, o seu charme e etc.? Nem por isso. Wolfs aguenta-se até se começar a pensar em Ocean’s, até o elemento déjà vu entrar pelos olhos e percebermos que já vimos isto, que as desventuras de dois fixers (pessoas que resolvem problemas, como Harvey Keitel foi em Pulp Fiction, ele que tinha o nome de Winston “The Wolf” Wolfe) numa situação de conflito geram, afinal, uma sensação de assalto revertido, capitalizando na memória, na nostalgia. O elemento “filme de grupo” não existe, mas a verdade é que o grupo só foi construído para suportar as respetivas duas maiores estrelas. E ei-las, a fazerem aqui e ali o mesmo tipo de papel.
Nesse bom estilo, Clooney e Pitt interpretam dois homens sem nome, ambos associados à pessoa que os contratou. Clooney foi pago por Margaret (Amy Ryan), uma advogada que decide ter uma aventura com um miúdo (Austin Abrams) na penthouse de um hotel em Nova Iorque e a coisa termina de forma inesperada. Foi-lhe dado o número de Clooney para resolver um problema, caso surgisse — não é que surgiu? — e ela decide usá-lo. Clooney é o tal fixer. O trabalho dele naquela situação é ir ao hotel, resolver o que há para resolver e fazê-lo de forma a que nunca se perceba o que se passou.
Acontece que Pam, que gere o hotel, viu tudo através de uma câmara instalada no quarto e tem outras ideias: ela não confia no tipo que presta o serviço a Margaret e contrata o seu próprio fixer, Pitt, para fazer desaparecer a questão. Neste tipo de trabalho, como se pode adivinhar, a solidão, mais do que um gosto, é uma exigência. E a partir daí surgem uma série de outros problemas até finalmente se entenderem e a coisa ficar mais ou menos assim combinada: Clooney resolve o problema de Margaret e Pitt o de Pam — garantir que nada do que se passou seja ligado ao hotel.
Cena simples, direta, que durante os primeiros quinze/vinte minutos cria uma série de diálogo inofensivos, até divertidos. Mas depois, claro, surge o problema 2: Pitt descobre que no meio da confusão há ilegalidades desconhecidas. Parece ser chato porque de repente a noite de ambos vai dar mais uma meia-hora de filme. Até que se revela o problema 3, que não podemos identificar aqui, correndo o risco de eliminar de vez o interesse pela outra meia hora de filme extra. Ao longo de tudo isto, é quase como se estivéssemos a ver um reality show, porque a imagem que temos dos protagonistas no filme é a que já tínhamos deles na vida real. Estes dois estão de tal maneira embrulhados nas personalidades que aqui representam que juramos estar a ver um concurso: será que eles vão ganhar? Claro que vão ganhar. Mas haverá oura hipótese?
Apesar das quase duas horas de produção afinada, é difícil ver Wolfs para lá da ideia de filme de encomenda, neste sentido: imaginaríamos outros dois atores a protagonizá-lo? E aguentaria sem eles? Provavelmente sim, mas seria (ainda) mais aborrecido. Haverá uma sequela, apesar disto ser só assim-assim? Claro, porque a verdade é que há ali uma força de atração que funciona, com dois bons egos que se confrontam bem, cujo humor se complementa. Mesmo quando enfiados numa história que é uma colagem de lugares comuns que convida a que nem se dê muita atenção ao elenco secundário. Como quase tudo em Wolfs, são só paisagem no pacote Clooney-Pitt.