Dali apenas vem comunicação boa de quem é bom a comunicar. Rúben Amorim faz também a diferença pela forma como fala com os jornalistas, antes e depois dos encontros. Não diz tudo tudo o que pode – até porque existem coisas que não se podem mesmo dizer para fora –, não se furta a dizer tudo o que acha que deve. Nas entrelinhas de algumas conferências estão pistas para decisões que toma, seja na equipa, seja a título pessoal, como aquela viagem a Londres para se encontrar com responsáveis do West Ham. Naquilo que é mais fácil analisar, sobram explicações de um treinador eternamente insatisfeito que aponta sempre a algo mais. Agora, esse algo mais passava pelo crescimento do Sporting em termos europeus e é recuando ao pós-jogo do AVS que estavam as principais achegas para aquilo que sabe ser necessário para essa mesma evolução.

Sporting resgata empate frente ao PSV a seis minutos do fim e soma mais um ponto na Champions

No final dessa partida, mesmo perante um triunfo concludente que teve como ponto extra a estreia na equipa inicial logo a marcar e a assistir de Conrad Harder, o técnico dos leões mostrou-se menos satisfeito com os últimos 20 minutos da partida. Porquê? A formação verde e branca perdeu intensidade, não conseguiu ter a mesma reação à perda, deixou de ser rápida nos movimentos ofensivos. Para o encontro em causa não seria isso que faria a diferença, tendo em conta que Franco Israel foi pouco mais do que um espectador ao longo dos 90 minutos, numa ótica de Champions pode ter influência. Em termos nacionais, o Sporting defronta quase sempre equipas com blocos mais baixos, que não obrigam à mesma amplitude de campo dos jogos europeus, e só mesmo mantendo essa agressividade é possível ir preparando encontros com outras características. Contra o Lille em Alvalade, o Sporting não deslumbrou mas ganhou. Agora seguia-se o PSV.

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“Não perdem há 41 jogos em casa? “Isso não entra na preparação porque não sabia. Estarem a dizer isso não é agradável… O PSV é um clube dominador, marca muitos golos. Estudámos estes jogos e da Liga dos Campeões do ano passado, apesar de algumas diferenças. Cada vez que jogamos em Alvalade não vamos a pensar que vai ser fácil. Quando estamos do outro lado acreditamos que podemos ganhar sempre em qualquer campo. Como a nossa fortaleza pode ter um mau dia, pode ser o caso do PSV, é para isso que vamos lutar. Semelhanças entre Liga portuguesa e neerlandesa? A qualidade é similar, em Portugal temos um mindset diferente. Aqui é futebol total. São boas ligas, bons treinadores, bons jogadores. São semelhantes em qualidade, com bom ambiente, boas academias e que gostam de futebol”, apontara Amorim na antevisão.

“Dá para perceber que estamos num patamar diferente. Costumava dizer-se que não chegávamos ao Natal, que não lutávamos pelo Campeonato. Acho que já provámos que somos competitivos, tirando o ano em que estragámos tudo. Já temos essa consciência. Agora esperam que possamos dar o passo seguinte na Europa. Também temos de perceber que há equipas que jogam num patamar similar ao nosso e lutamos contra campeonatos e equipas que têm posicionamentos diferentes. Tentamos provar que podemos ser mais competitivos. Queremos melhorar aquilo que fizemos com o Lille, ter outra capacidade a construir. Sinto que as pessoas esperam isso e vamos tentar corresponder a esse pedido dos adeptos”, acrescentara o técnico.

Rúben Amorim fazia um ensaio a uma espécie de evolução na continuidade, tentando prolongar o momento que atravessa em termos nacionais com sete triunfos consecutivos e um total de 25-2 em golos para aquilo que é uma realidade europeia diametralmente oposta mas que constituía também um desafio para a fase de crescimento que a melhor versão de Sporting nos últimos anos apresenta. Correu melhor do que devia face a tudo o que aconteceu em campo: entre muitas escorregadelas, inúmeros passes falhados no primeiro terço e uma estranha incapacidade de levar bola até à área contrária, os leões conseguiram sair dos Países Baixos com um ponto resgatado a seis minutos do final com um golo de Daniel Bragança, o jogador que o técnico tinha descrito na véspera como o mais injustiçado desde que chegou a Alvalade mas que acabou por escrever um resultado injusto perante o que aconteceu mas justo face ao que a equipa tem feito até aqui.

O jogo começou com aquela versão que Rúben Amorim menos queria e talvez mais temesse: um Sporting curto em campo, a ter grandes dificuldades para saltar as zonas de pressão altas do PSV que não só estavam a bloquear os dois médios como pressionavam a circulação entre centrais, incapaz de gerir a partida com bola e a errar inúmeros passes em zona proibida fruto dessa incapacidade de esticar na frente. Na primeira vez, com Gonçalo Inácio a fazer um passe errado em zona central à saída do primeiro terço, Luuk de Jong viu bem a desmarcação de rutura de Til mas o remate foi travado por Franco Israel (14′); na segunda, com Debast a tentar sair com novo passe arriscado em zona central para Geny Catamo, Schouten antecipou-se ao jogador moçambicano (que ficou no chão), arriscou a meia distância de fora da área e fez mesmo o 1-0 (15′).

O PSV imperava em tudo. O facto de ter 12 faltas apenas em 25 minutos poderia ser um sinal de dificuldade para travar a posse do Sporting mas representavam apenas a maior intensidade e agressividade do conjunto neerlandês, a empurrar por completo os leões para o seu meio-campo como mais nenhuma equipa fizera até ao momento esta época. Os visitados não conseguiam ter tanta bola nem domínio mas faziam mais do que suficiente para manterem o perigo longe da baliza de Benítez, que teve apenas de segurar um cruzamento rasteiro de Nuno Santos da esquerda na meia hora inicial. Tudo acontecia aos leões e, como um mal nunca vem só, Diomande fez uma entorse no tornozelo após travar um remate de Tillman e teve mesmo de ser substituído por Eduardo Quaresma, saindo em ombros até ao banco numa lesão que pode ser grave (32′).

A dez minutos do intervalo, Francisco Trincão teve a primeira boa arrancada pela direita, conseguiu fazer o cruzamento atrasado mas o remate de Gyökeres ficou prensado nas pernas de Flamingo. Não foi dessa que o Sporting conseguiu finalmente esboçar um remate que fosse ao alvo mas ficou patente nos minutos seguintes que o PSV ficava mais desconfortável quando as iniciativas verde e brancas chegavam ao último terço mesmo que não tivessem finalização. Os minutos passavam sem alterações no resultado, com os leões mais estáveis na partida mas com muito para corrigir ao intervalo: Geny era um corpo estranho jogando numa posição mais ofensiva à esquerda, os médios não tinham bola, os alas nunca conseguiram desequilibrar, Gyökeres andava perdido na frente. Pior que tudo, o número de passes errados (e as zonas) era assustador.

Daniel Bragança ainda esteve em exercícios de aquecimento mas Rúben Amorim decidiu manter numa fase inicial a mesma equipa, acreditando que as correções feitas ao intervalo poderiam ser suficientes para darem outra imagem no segundo tempo. Na teoria até podia ser, na prática houve quase uma autosabotagem nos três minutos iniciais com uma perda de bola logo na saída, mais um passe errado de Debast que deu a oportunidade a Saibari de testar a meia distância rasteira ao lado e uma jogada previsível com bola entre lateral e central pela direita que terminou com um remate na passada na área por cima. Não funcionou, foi Bragança para jogo no lugar de Geny Catamo para reforçar o meio-campo e colocar Gyökeres e Trincão mais móveis na frente mas voltou a ser o PSV a criar perigo, com Luuk De Jong a ter uma receção que saiu bem melhor do que a tentativa, a ficar isolado na área enquadrado com a baliza mas a atirar ao lado (55′).

Apesar desse lance, havia algo que de forma paulatina começava a mudar. Fosse em ataque organizado, fosse em saídas que acabavam depois por partir o jogo aumentando o risco, o Sporting esboçava uma ténue reação que não era suficiente ainda para criar oportunidades mas que colocava mais unidades verde e brancas a jogarem mais metros à frente. A partir daqui, seria importante entrar em campo a eficácia… que foi o que falhou: Eduardo Quaresma recuperou uma bola, viu o buraco no corredor central, isolou-se após um passe de Morita e escorregou à entrada da área quando ia rematar para o 1-1 (75′). Tudo mudou nesse momento.

Com o PSV mais reforçado com a entrada de Noa Lang a voltar a ter oportunidades para ampliar a vantagem, entre uma grande defesa de Franco Israel a um desvio de cabeça e um lance em que Bakayoko aproveitou um erro de Eduardo Quaresma para passar o uruguaio mas atirar depois ao lado, o Sporting tentou fintar todos os azares em busca de um momento de sorte e alcançou mesmo o empate a seis minutos do final, com Maxi Araújo a cruzar da esquerda e Daniel Bragança a surgir entre os centrais a desviar de pé direito na área para o 1-1. O jogo mudara de vez, sendo que entre a anarquia total ainda foi Harder a ver Benítez travar a reviravolta no segundo minuto de descontos num lance que iria penalizar ainda mais os neerlandeses.