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"Will & Harper": da empatia à caixa de comentários

Confissões sobre uma transição de género, a exaltação da amizade e os testes da vida real. Will Ferrell numa roadtrip com Harper Steele, num documentário sem guião para ver na Netflix.

Realizado por Josh Greenbaum, premiado já pelo seu trabalho em documentários, Will & Harper tem sempre um tom intimista, nunca reconhecendo as câmaras ou a pequena equipa que rodeia os intervenientes
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Realizado por Josh Greenbaum, premiado já pelo seu trabalho em documentários, Will & Harper tem sempre um tom intimista, nunca reconhecendo as câmaras ou a pequena equipa que rodeia os intervenientes

Realizado por Josh Greenbaum, premiado já pelo seu trabalho em documentários, Will & Harper tem sempre um tom intimista, nunca reconhecendo as câmaras ou a pequena equipa que rodeia os intervenientes

Um homem está tão feliz por estar finalmente num Dunkin’ Donuts que nem sabe que bolo escolher, para exasperação da sua melhor amiga. O donut escolhido acaba por ser banal, como se esperaria de uma loja de cadeia, mas o homem sorve-o com o contentamento infantil que encontramos no conforto, no conhecido. É um momento ligeiro e cómico, mas que acaba por ganhar outro encanto porque aparece quase no fim das perto de duas de Will & Harper, um documentário exatamente sobre o desconforto do desconhecido, da luta contra o que somos e o que fingimos ser.

Will é Will Ferrell, o popular e desbragado ator cómico, o tal homem que só quer enfardar calorias vazias. E Harper é Harper Steele, a sua melhor amiga, que conheceu em 1995 como Andrew Steele, um dos mais prolíficos guionistas do programa de culto Saturday Night Live. Iniciaram-se ambos na mesma semana e depressa criaram uma parceria de sucesso, que resultou em vários sketches e filmes (como Eurovision Song Contest: The Story of Fire Saga, um filme sobre a Eurovisão no qual Salvador Sobral tem uma curta participação).

Ao fim de quase 30 anos de companheirismo, Andrew revelou um segredo da vida toda: sentia-se uma mulher e ia iniciar o processo de transição. Disse-o num e-mail para os mais próximos (ou não fosse ele um guionista, alguém que prefere a palavra escrita), em plena pandemia, que terminou com “instead of an asshole, I’ll be a bitch” (algo como “em vez de um parvalhão, serei uma cabra”). E assinou “Nome Por Determinar”. A reação de Will Ferrell foi a de amor incondicional, mas também de confusão. Nunca suspeitou que o seu amigo vivia uma vida secreta repleta de angústia, tristeza e tentativas de suicídio.

[o trailer de “Will & Harper”:]

O documentário agora estreado na Netflix apanha os dois amigos cerca de dois anos depois desta mudança. Passarão 16 dias a fazer uma viagem de carro que atravessará os Estados Unidos, de Nova Iorque a Los Angeles. A jornada tem dois objetivos: por um lado, que possam usar o tempo ao volante para fazerem todas as perguntas que sempre quiseram fazer — sobre como é ter mamas, sobre a vontade de voltar a ter uma relação, sobre como se escolhe um nome novo. Por outro, fazer com que Harper (que sempre adorou conduzir pela América mais profunda e procurar os bares mais manhosos) teste as águas: será tão confortável fazer este percurso enquanto pessoa trans como era como homem? “Eu não sei se consigo ir aos mesmos sítios como Harper”, apoquenta-se.

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A viagem começa na cidade onde Harper mora, Nova Iorque. Will Ferrell vai ter com ela e a primeira paragem é para tomar o pequeno-almoço com as filhas da guionista. É a primeira ocasião na qual é possível começar a descascar todas as dúvidas desconfortáveis, num momento de grande generosidade e respeito entre todos. Daí seguem para o mítico 30 Rock, a sede da NBC, onde se cruzam com colegas antigos e mais recentes dos SNL, como Tina Fey, Seth Meyers ou Tim Meadows.

O resultado traz bastante proximidade e torna o filme num objeto carinhoso, mas levanta uma questão, assumida pela própria Harper na segunda metade: este é um ambiente altamente controlado, onde toda a gente é simpática e compreensiva, e não o quotidiano real de alguém trans.

Realizado por Josh Greenbaum, premiado já pelo seu trabalho em documentários, Will & Harper tem sempre um tom intimista, nunca reconhecendo as câmaras ou a pequena equipa que rodeia os intervenientes. Os momentos não são guionados e vão rapidamente da lágrima à parvoíce, como uma boa conversa entre amigos. O resultado traz bastante proximidade e torna o filme num objeto carinhoso, mas levanta uma questão, assumida pela própria Harper na segunda metade: este é um ambiente altamente controlado, onde toda a gente é simpática e compreensiva, e não o quotidiano real de alguém trans. Exemplo disso é a cena em que, após um jantar entre ambos publicado nas redes sociais, os comentários descambam, num claro contraste com as conversas cara a cara até com o mais empedernido dos burgessos numa sala de snooker perdida nos arrabaldes.

Will Ferrell apresenta-se como o amigo protetor e atento que, apesar disso, pode dizer uma provocação a qualquer instante (“Conduzes pior por seres uma mulher?”). Está ali para mostrar que está tudo OK fora da zona de conforto, como quando Harper lhe diz que detesta a sua voz tão masculina e ele a leva a um karaoke. É um filme encantador para quem tem empatia. Para os outros, há sempre as caixas de comentários.

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