“Contas equilibradas” não significam, necessariamente, ter um superavit no Orçamento do Estado, sublinha António Horta Osório. O gestor defende que, numa altura em que outros países europeus têm défices elevados, Portugal atingiu uma situação que permitiria ao Governo tomar medidas “corretas, com efeito multiplicador” – como baixar o IRC ou a TSU – com o objetivo de “melhorar os salários e a qualidade de vida das pessoas“, mesmo que isso signifique um “pequeno défice“.
Numa conferência organizada pelo Jornal Económico, nesta quarta-feira, o gestor salientou que, embora “nem tudo sejam rosas” e a dívida (total) continue num nível comparativamente elevado, Portugal está hoje numa situação “estável”. “Temos a possibilidade, finalmente, de controlar o nosso próprio destino“. O equilíbrio das contas públicas, disse o gestor, até está a permitir que Portugal se consiga financiar nos mercados de dívida mais barato do que França ou Espanha, com juros abaixo de 3%, apesar de os ratings serem inferiores aos desses países.
“A Alemanha está com um pequeno défice, Espanha ainda está com um défice de quase 3%, França deverá fechar o ano entre 5,5% e 6% e só voltará aos 3% em 2027, provavelmente – o que, em conjunto com a situação política, augura perspetivas muito complicadas para França”, comentou o gestor, que tem feito carreira sobretudo na alta finança europeia mas nesta fase está envolvido na gestão de empresas de vários setores.
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Em contraste, “Portugal, depois do impacto da pandemia, recuperou e estamos com um superavit orçamental” e “está numa trajetória muito positiva na dívida face ao PIB”. Segundo as previsões do FMI, citadas por Horta Osório, “a este ritmo, atingiremos uma dívida de 80% do PIB”.
É fácil perceber porquê: se temos um défice zero, o PIB cresce 2%, a inflação (objetivo) é de 2%, ou seja, temos um crescimento nominal de 4%. Se nos financiamos a 2,75% ou perto disso, a dívida sobre o produto [PIB] vai decrescendo”, explica Horta Osório.
“Sem fazermos nada, dado que estamos a crescer nominalmente 4% e pagamos juros abaixo de 3%, a dívida sobre o PIB reduz-se por si própria”, repetiu, salientando que, neste contexto, “contas equilibradas não significam um superavit orçamental”.
Horta Osório diz que o país “tem um excedente orçamental que não precisa de ser zero, até podia ser um pequeno défice”. Isso dá ao Estado “uma capacidade que deve ser utilizada para benefício das condições de vida dos portugueses“.
Agora que temos as contas equilibradas – finalmente, ao fim de 50 anos – o que temos é outro desafio que é que os nossos salários e a qualidade de vida dos portugueses é muito pior do que noutros países comparáveis”, sublinhou António Horta Osório.
Nesta fase, “como temos esta capacidade, há que a utilizar, da maneira correta, com efeito multiplicador, para melhorar os salários e a qualidade de vida dos portugueses”, insistiu.
“Aquilo que a sociedade devia exigir ao Governo é que utilizasse esse excedente para aumentar a produtividade com medidas como, por exemplo, baixando o IRC”, disse Horta Osório, sugerindo, também, que uma medida que “teria impacto direto sobre a produtividade” era “baixar a Taxa Social Única”, ou TSU.
É tomando medidas que ajudem as empresas, defendeu Horta Osório, que “estas irão poder exportar mais, contratar mais pessoas e é apenas isso que pode conduzir a um aumento dos salários”. Salários que, acrescentou, estão em risco de ser superados por cada vez mais países do grupo daqueles que entraram na União Europeia mais recentemente e, nos últimos 26 anos, cresceram quase o triplo do que Portugal, sublinhou Horta Osório.