A Comissão Nacional de Proteção de Dados considera que a proposta do Governo que cria a unidade de estrangeiros e fronteiras na PSP “suscita dúvidas” e “é pouco clara” sobre a partilha e proteção de dados, recomendando a revisão.

“A CNPD recomenda a revisão da proposta, conformando-a ao regime de proteção de dados pessoais e às exigências normativas da União Europeia”, refere a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), num parecer enviado ao parlamento sobre a proposta de lei que cria a Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras (UNEF) na Polícia de Segurança Pública, altera o regime de retorno e regula o novo sistema de entrada e saída para o reforço do controlo das fronteiras externas.

Esta proposta foi esta sexta-feira discutida e votada na Assembleia da República, passando agora a ser discutida na especialidade em sede de comissão parlamentar, tendo baixado à comissão sem votação.

No parecer, feito a pedido da comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a CNPD recorda que “o regime jurídico de estrangeiros e controlo de fronteiras tem sofrido nos últimos três anos sucessivas alterações legislativas de grande alcance e impacto, com a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e a criação da Agência para a Integração, Imigração e Asilo (AIMA) e da Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros (UCFE), bem como pela transferência de competências, até 2023 concentradas no SEF, para várias outras entidades”.

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“Tal circunstância acarreta uma grande fragmentação legislativa a nível nacional, promovida pela multiplicidade de diplomas e pela sua alteração parcelar, sendo que estas alterações tiveram um grande impacto na perspetiva do direito fundamental à proteção de dados, na medida em que implicaram modificações no plano dos sistemas de informação nacionais e nas partes nacionais dos sistemas de informação europeus de larga escala”, lê-se no documento.

Esta nova unidade a criar na PSP vai assumir “responsabilidades no controlo de fronteiras aéreas, inspeção e fiscalização de permanência e atividade de estrangeiros em território nacional, decisão e execução das ações de retorno, gestão dos espaços de instalação temporária e equiparados e, ainda, a segurança aeroportuária e de fronteiras”.

A criação da UNEF procede à transferência de algumas das competências atribuídas à AIMA para a PSP, passando as competências sobre processos de afastamento, readmissão e retorno para esta polícia, sem prejudicar as competências da AIMA, GNR ou da Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros (UCFE), que funciona no Sistema de Segurança Interna.

Esta competência parece “indiciar um novo tratamento de dados pessoais a efetuar pela PSP nos termos das competências que lhe são agora atribuídas, uns de caráter policial e criminal e, outros, de caráter administrativo”, mas a CNPD indica que na proposta nada é dito quanto à finalidade de tais tratamentos.

Este órgão manifesta reservas quanto às novas competências da PSP, tendo em conta que a proposta “não explicita qual a informação em causa, se se trata de dados pessoais, ou de dados estatísticos”.

“Por outro lado, fica por esclarecer a quem são transmitidos os dados ou quem pode aceder-lhes, em que contexto e para que finalidades, o que não pode deixar de ser enquadrado, pela razões já atrás indicadas”, refere a CNPD, sublinhando que a dupla vertente da atuação da PSP no contexto do regime de estrangeiros e fronteiras (policial e administrativa) “careceria de maior densificação normativa no que respeita à proteção de dados”.

Ainda sobre a transferência de algumas das competências da AIMA para PSP, a CNPD sustenta que a redação “é pouco clara e pode suscitar dúvidas quanto ao teor da comunicação a efetuar”, ficando “por determinar se os atos objeto de comunicação são desprovidos de dados pessoais ou se implicam a transmissão daqueles, como parece ser o caso”.

Esta proposta estabelece a passagem para o ordenamento jurídico português da entrada em funcionamento do Sistema de Entrada/Saída (SES), sistema informático automatizado de registo das entradas e saídas de cidadãos de fora do espaço Schengen.

No parecer, a CNPF refere ainda que “não se encontra previsão legal” no regulamento a “identificação das autoridades nacionais competentes para acesso ao SES e com que fins”, a autoridade responsável pelo tratamento de dados do SES, designação das autoridades nacionais competentes para consulta aos dados para efeitos de prevenção, deteção e investigação de infrações penais graves.

Na manhã desta sexta-feira no parlamento, o ministro da Presidência alertou que Portugal “precisa desta lei para cumprir as obrigações europeias” para que no dia 10 de novembro o país não esteja fora do espaço Shengen.