A candidata indicada pelo PSD para juíza do Tribunal Constitucional (TC), Maria João Vaz Tomé, ficou esta sexta-feira longe dos dois terços de votos necessários para ser eleita, obtendo 76 votos a favor, 86 brancos e 42 nulos.

Esta votação indica também que a candidata escolhida pelo PSD ficou distante do pleno dos deputados que votaram e que fazem parte das bancadas social-democrata, Chega, CDS-PP e Iniciativa Liberal.

O anúncio deste resultado, pelo secretário da mesa da Assembleia da República, o social-democrata Jorge Paulo Oliveira, foi saudado com uma salva de palmas por vários deputados das bancadas da esquerda.

Juíza conselheira do Supremo Tribunal de Justiça desde 2018 e com longa carreira na Faculdade de Direito da Universidade Católica do Porto, Maria João Vaz Tomé foi indicada pelo PSD para substituir no TC José Teles Pereira, que terminou o seu mandato em julho passado.

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Maria João Vaz Tomé foi ouvida na quinta-feira, ao início da tarde, em sede de Comissão de Assuntos Constitucionais. E após essa audição o Bloco de Esquerda lançou um apelo aos deputados para que a chumbassem por causa das suas posições sobre o aborto.

PS e BE questionam candidata ao Tribunal Constitucional sobre aborto e propriedade privada

Pouco depois, a direção do Grupo Parlamentar do PS comunicou que tinha dado indicações aos seus deputados para que não votassem a favor da candidatura da juíza conselheira do Supremo Tribunal de Justiça.

Durante a audição, a candidata proposta pelo PSD foi questionada pelo líder parlamentar do Bloco de Esquerda, Fabian Figueiredo, e pela deputada socialista Isabel Moreira sobre a questão do aborto em Portugal.

A juíza conselheira do Supremo admitiu então que um eventual alargamento do atual prazo de dez semanas para a prática da interrupção voluntária da gravidez possa ser objeto de apreciação por parte do TC. O PS quer alargar o prazo para as 12 semanas e o Bloco de Esquerda para as 14 semanas.

A candidata ao TC referiu-se a estes dois projetos sobre interrupção voluntária da gravidez dizendo que, tal como na questão da eutanásia, se está perante um tema que continua a não ser pacífico na sociedade portuguesa.

“Na minha perspetiva, há um conflito entre a vida intrauterina e o direito da mulher, desde logo, a dispor do seu corpo. Portanto, reconheço a vida intrauterina e acho que há um conflito com essa vida. Acredito que se for para a frente essa extensão do período em que se não seja punida a interrupção voluntária da gravidez, isto regresse ao TC”, declarou.

Esta manhã, perante a posição do PS contrária à eleição de Maria João Vaz Tomé, o líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, pediu aos socialistas para fazerem uma “avaliação justa” da candidata e assim reverterem a intenção anunciada de votarem contra.

PS vai chumbar candidata do PSD ao TC por causa das posições sobre aborto

“Queria por isso apelar ao PS para que possa fazer uma avaliação justa do percurso e do currículo da candidata que nós apresentámos e que possa por isso ainda ir a tempo de inverter aquela que é a orientação dada aos seus deputados”, disse Hugo Soares, em declarações aos jornalistas na Assembleia da República.

PS afirma que recusou candidata do PSD a juíza do TC por falta de perfil

O PS afirma que a candidata revelou falta de perfil para as funções e recusa ter colocado em causa o prestígio das instituições democráticas.

Esta posição consta de um comunicado do Grupo Parlamentar do PS que esta sexta-feira foi divulgado pouco depois de a mesa da Assembleia da República ter anunciado que a candidata proposta pelo PSD tinha falhado a sua eleição para juíza do TC.

Em comunicado, o PS sustenta que a decisão de não eleger Maria João Vaz Tomé “resulta de uma análise criteriosa da sua audição no parlamento” e que a “rejeição de candidaturas faz parte da normalidade democrática”.

“A decisão do Grupo parlamentar do PS no sentido de não eleger Maria João Vaz Tomé para o Tribunal Constitucional é fundamentada e surge na sequência de uma análise criteriosa da audição da senhora juíza, proposta pelo PSD, realizada ontem [na quinta-feira] na Comissão de Liberdades, Direitos e Garantias na Assembleia da República”, justifica-se.

BE saúda rejeição da candidata indicada pelo PSD ao Tribunal Constitucional

Já o líder parlamentar do BE saudou esta sexta-feira a rejeição da candidata  criticando Maria João Vaz por posição conservadora sobre o aborto.

Em declarações aos jornalistas após ser conhecido o resultado da votação para a juíza do TC – que contou apenas com apenas 76 votos a favor – Fabian Figueiredo saudou que não só deputados das bancadas de esquerda, como também dos partidos à direita se tenham oposto à nomeação de Maria João Vaz.

“Ainda bem que uma juíza que tem um entendimento particularmente conservador e estranho à jurisprudência e àquela que é a lei e o entendimento maioritário da sociedade portuguesa não vai assumir funções”, atirou.

O bloquista afirmou que “ao contrário do entendimento desta juíza conselheira do Supremo e que era candidata à juíza do Tribunal Constitucional, [o aborto] não é uma questão polémica em Portugal, não é uma questão divisiva”, sublinhando que “desde 2007 há uma lei que está em vigor, que garantiu mais segurança às mulheres”.

“O apelo que nós fazemos é que o que seja consensual continue a ser consensual, que não seja indicado mais nenhum candidato para o Tribunal Constitucional que ache que deve haver recuos nos direitos, liberdades e garantias em Portugal, como era o caso da Maria João Vaz Tomé”, sublinhou.

Fabian Figueiredo disse ainda que a juíza indicada pelo PSD é “dirigente de uma associação que se dedica ao combate ao aborto legal e seguro”.

O líder parlamentar bloquista quis também frisar a necessidade de “garantir que o aborto legal e seguro está acessível a todas as mulheres que dele necessitem” em Portugal e reiterou a vontade do Bloco de alargar o prazo do aborto legal para as 14 semanas.

“Preocupa-nos a notícia de que há um crescendo de mulheres que têm que ir para o estrangeiro para terem acesso à interrupção voluntária da gravidez, isto demonstra, aliás, a oportunidade de promover alterações legislativas”, disse.