A líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, criticou esta noite políticos que “incendeiam um discurso securitário” numa sociedade “já muito agressiva” e distanciou-se das declarações do autarca socialista de Loures, que considerou “juridicamente inaceitáveis”.
“Acho que, francamente, e agora vou falar em abstrato, quem incendeia um discurso securitário — estou a falar em abstrato, sublinho — não presta um bom serviço a uma sociedade que em geral, no mundo inteiro, já está muito extremada, polarizada, agressiva e aos políticos cabe baixar a pressão e não aumentá-la”, considerou Alexandra Leitão no programa “Princípio da Incerteza”, transmitido na noite de domingo na CNN Portugal e na TSF.
Durante o programa, a socialista rejeitou responder se a direção nacional socialista, liderada por Pedro Nuno Santos, deve pronunciar-se sobre as declarações do autarca da Câmara Municipal de Loures e presidente da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) do PS, que ameaçou com despejo inquilinos de habitações municipais com participação nos distúrbios em Lisboa.
A líder da bancada do PS distanciou-se destas declarações, considerando-as “juridicamente inaceitáveis”, afirmou que não se revê nelas politicamente e realçou que “a declaração de princípios do PS também não aponta neste sentido”.
Interrogada sobre a polémica, Alexandra Leitão começou a sua análise pelo plano jurídico, salientando que “a primeira norma em causa, não é a do regulamento de Loures, do Código Civil, ou de outras normas, mas sim a da Constituição“, no seu artigo 30.º, afirmando que está em causa “uma norma basilar do Estado de Direito”.
“E essa norma diz sensivelmente isto: ninguém pode ser privado de direitos políticos, civis e fundamentais na sequência da prática de crimes“, sublinhou, dando como exemplo o facto de os presos não serem impedidos de votar ou estudar.
Na ótica da socialista, está também em causa “o princípio da pessoalidade das penas”: “Um pai de família pratica um crime, vai tudo para a rua?”, questionou.
No plano político, Alexandra Leitão realçou que “há um problema de perceção de insegurança maior do que a verdadeira insegurança, mas os políticos não ajudam se incendiarem esse fogo”.
“Segurança sim, de proximidade, com integração, humanismo e trabalho nestes bairros e isso é o oposto daquilo que algumas destas coisas que se têm dito apontam. Isto só radicaliza, isto só torna as pessoas ainda mais revoltadas, isto só põe gasolina numa fogueira e é por isso que isso também me preocupa no plano político”, criticou.
Na quinta-feira, o presidente da Câmara de Loures esclareceu que só defende o despejo de inquilinos de habitações municipais que tenham sido condenados e o caso transitado em julgado, assegurando que o município “irá sempre cumprir a lei”.
O esclarecimento do autarca surgiu na sequência de declarações que proferiu na quarta-feira, na reunião pública da Câmara de Loures, durante a qual defendeu o despejo “sem dó nem piedade” de inquilinos de habitações municipais que tenham participado nos distúrbios que têm ocorrido na Área Metropolitana de Lisboa, após a morte do cabo-verdiano Odair Moniz, baleado por um agente da PSP.
“É óbvio que eu não quero que um criminoso que tenha participado nestes acontecimentos, se for ele o titular do contrato de arrendamento é para acabar e é para despejar, ponto final, parágrafo”, afirmou na ocasião Ricardo Leão.
O autarca falava no final da discussão de uma recomendação do Chega de alteração do regulamento municipal de habitação, permitindo despejar de casas municipais quem comete crimes, que acabou aprovada com votos favoráveis do Chega, PS e PSD e contra da CDU.
As declarações de Ricardo Leão já foram publicamente criticadas por vários socialistas, nomeadamente pelas deputadas Cláudia Santos e Isabel Moreira, pelo ex-ministro da Educação João Costa, e pelo eurodeputado Francisco Assis.