A intervenção não estava prevista — ou pelo menos não tinha sido comunicada antes da manhã deste sábado — e foi recebida, como seria de esperar, com fortes aplausos e entusiasmo na audiência de delegados do PCP. Depois de há dois anos ter abandonado a liderança do partido, retirando-se a meio do mandato devido a complicações de saúde, Jerónimo de Sousa subiu ao palanque em Almada para pedir ao partido que “não vacile”. E lembrar que o “segredo” do PCP é ser “diferente” dos outros — por isso é que “continua de pé”.
Não faltaram, durante a declaração de dez minutos, momentos de reconhecimento sobre a situação difícil em que o partido está: enfrenta “grandes exigências“, vive um “tempo exigente, de resistência e acumulação de forças”, tem “grandes desafios pela frente”, foi registando Jerónimo. Mas para tentar que o partido não desanime, o antecessor de Paulo Raimundo foi buscar a história do PCP, desde a sua existência na clandestinidade durante o tempo da ditadura, e lembrou: “Este partido nunca teve uma vida fácil, mas nunca desistiu” nem “aceitou a sentença da sua liquidação”.
Ora se na altura o partido “correu os maiores riscos, sem vacilar nem se deixar intimidar”, agora tem de fazer o mesmo — e tornar-se “mais forte”, encontrando força para “se erguer e avançar”. Foi nesse ponto que o antigo secretário-geral se dedicou aos avisos para fora, avisando de todas as formas possíveis que o PCP não vai desistir — nem sequer modificar-se ou esconder os princípios que defende, por mais que se sinta isolado e “cercado“.
“Desiludam-se todos os que utilizam as mais graves mentiras, falsificações e deturpações sobre o nosso partido, mas também o silenciamento das nossas posições, e acham que nos desencorajam e desanimam”, avisou. “Desenganem-se os que pensam ser possível levar o PCP a dissimular os seus princípios e fraquejar”. Até porque, para Jerónimo, o “segredo da longevidade” do partido passa precisamente por “ser diferente”.
Depois, defendeu as conquistas que essa diferença tem trazido, perguntando “onde iria já o processo contra-revolucionário” se os comunistas não desempenhassem o seu papel — e aproveitando para deixar uma farpa mais atual, acusando o Governo de ter as “costas quentes” graças ao alinhamento com Iniciativa Liberal e Chega. No caso de Jerónimo, não houve farpas lançadas contra o PS, ao contrário do que aconteceu nas intervenções de outros dirigentes.
O PCP “é diferente e diferente quer continuar a ser”, rematou, anunciando: “Aqui continuamos de pé, para lutar de pé e enfrentar a ofensiva contra Abril”. Quando saiu da liderança, numa conferência nacional realizada há dois anos, Jerónimo tinha avisado que os tempos eram de “vento duro” e que o PCP precisaria de se concentrar sobretudo em “resistir”, mais do que crescer. Quando desta vez saiu do palanque, por entre aplausos de pé e gritos de “PCP”, a ideia pareceu manter-se.
Dezoito anos depois, o dia em que Jerónimo saiu (quase) pareceu um dia igual aos outros