A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, admitiu a possibilidade do processo de pré-triagem nas urgências de ginecologia e obstetrícia, que começou a ser aplicado esta segunda-feira em 11 Unidades Locais de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e no Hospital de Leiria e em três unidades que aderiram voluntariamente ao projeto (Hospital de Gaia, Hospital de Portalegre e Centro Materno Infantil do Norte), vir a ser alargado a outras zonas e a outras especialidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Em entrevista à CNN, a governante reforçou ainda este “é um modelo que há muitos anos devia ter começado a ser aplicado em Portugal” e é mais um passo para lidar com uma urgência de obstetrícia “desorganizada”.

Para a ministra da Saúde, esta pré-triagem “garante maior orientação para as grávidas e garante que, em situações de doença aguda ou sintomas que preocupam a grávida, esta tem encaminhamento para o sítio que deve ter”. Em terceiro lugar, acrescentou, “principalmente num período do Inverno que há mais pressão sobre as equipas de urgência, permite que as equipas possam ficar reservadas realmente para os casos urgentes ou muito urgentes”. O projeto é experimental e será avaliado ao final de três meses. “Vai ser uma aprendizagem para poder generalizar não só nesta área, mas também em outras e a nível nacional”, confirmou.

Ana Paula Martins sublinhou que este não foi o primeiro passo dado no reajustamento da “desorganizada” urgência ginecológica, dizendo que o plano aplicado no verão permitiu encaminhar “mais de 11 mil grávidas para cuidados de saúde primários, ou para uma consulta aberta ou de facto para a urgência”. E definiu este processo como “o próximo passo”, que não se aplica apenas a esta pré-triagem: “Há também uma outra possibilidade de pré-triagem feita por enfermeiros e enfermeiras especializadas em saúde materna e obstétrica”.

Uma das preocupações do Governo é “explicar muito bem aos utentes que não se estão a retirar cuidados, mas sim a garantir que quem precisa de um cuidado urgente ou emergente o vai ter e que quem precisa de um cuidado que pode ser administrado nas horas seguintes também o terá”. “Estamos a trilhar um caminho difícil”, assumiu Ana Paula Martins, acrescentando que “a meta, no caso da obstetrícia, é conseguir manter as equipas no SNS, porque muitos médicos têm saído para o privado”. “Estas equipas não podem gastar todo o seu horário de trabalho praticamente na urgência”, alertou.

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Um problema que acaba por se cruzar com outro, apontado como o que é preciso resolver com mais premência. “Ainda estamos a sair da pandemia do ponto de vista da saúde e nós temos muita falta de médicos de família. Essa é a grande mudança e transformação que precisamos: conseguirmos ter medicina de proximidade. Estamos a chegar ao pico das aposentações dos médicos de família, que chegaram à idade da reforma, e estamos a infetar novos recursos”, acrescentou.

“A grande esperança” num acordo com os médicos e a confiança em Sérgio Janeiro

“Difícil” está também a ser o processo negocial do Ministério da Saúde com o Sindicato Independente dos Médicos. Ainda assim, Ana Paula Martins assume ter “uma grande esperança” de conseguir terminá-lo até final deste ano. “Relativamente à valorização salarial, diria que estamos a chegar muito perto”, continuou, destacando a necessidade de um equilíbrio entre essa valorização e “aquilo que é possível dar tendo em conta o orçamento e as contas públicas”. “Além do mais, existem outras profissões na saúde e temos procurado valorizar todas elas”, acrescentou.

“Os médicos precisam de ser valorizados do ponto de vista salarial, mas também precisam de ter uma carreira que se adeque mais ao que vivemos hoje. Temos vindo, ao longo dos anos, a criar um sistema que tem disfuncionalidades, desorganizações e falta de eficiência. Temos atualmente quatro gerações muito diferentes a trabalhar no SNS. E as gerações mais novas têm um olhar diferente para o projeto de vida. O SNS continua a atrair mas é preciso ter flexibilidade no que diz respeito à contratação, é preciso novos regimes de trabalho, ser mais competitivo no salário”, continuou, assumindo que, ao SNS, “não é possível muitas vezes chegar ao que se paga no privado”. Logo, “há outras coisas que têm que atrair: a investigação, a formação e garantir-se a especialidade”.

Seis utentes da Maternidade Alfredo da Costa chegaram sem pré-triagem à urgência

Já relativamente ao Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), a governante reafirmou que refundar o instituto, que definiu como sendo “um desígnio nacional”, significa que “precisa de funcionar sem problemas”, através de uma nova lei orgânica com mais autonomia, de poder dispor das suas receitas próprias e de ter profissionais motivados e com salários adequados.

Questionada sobre a manutenção no cargo do presidente do INEM, Ana Paula Martins referiu que os dirigentes que estão em funções têm a sua confiança, o que inclui Sérgio Janeiro, e recordou que está a decorrer um concurso para o conselho diretivo do instituto. “O que posso dizer é que desde que fiquei com a tutela direta do INEM tenho trabalhado muito bem com a equipa que está”, afiançou. Sobre as investigações que estão a decorrer a alegadas falhas no socorro em novembro, que terão resultado em mais de uma dezena de mortos, disse que iria manter o que já tinha dito: “Os inquéritos serão lidos e vão ser interpretados exatamente na medida que são as responsabilidades de cada um de nós. E é isso que faremos sem nenhuma sombra de dúvida”.