Se no verão a Póvoa de Varzim é muito concorrida pelas praias, no inverno dão à costa quase uma centena de escritores e público à procura de livros ou do contacto com quem os escreve. A 17.ª edição do festival Correntes d’Escritas começa esta terça-feira e, até sábado, há muito para ver e fazer, entre debates, apresentações, passeios literários e, claro, uma feira do livro. A pensar nos diferentes públicos, dividimos o programa a pensar nas preferências de cada um.

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Uma das principais atrações dos festivais literários é a oportunidade de falar cara a cara com alguns escritores, seja para partilhar o feedback de um livro, seja para saber de que trata uma nova obra ou até aproveitar fazer algumas questões. Nesta edição vão estar presentes cerca de 80 autores, de Portugal, Espanha, Brasil, Angola, Argentina, México, Peru, Chile à Guiné, com destaque para Porto Rico, que pela primeira vez participa no encontro através da escritora Mayra Santos-Febres. Alguns aproveitam para apresentar o que andaram a escrever nos últimos tempos.

Na sexta-feira às 12h00, por exemplo, apresentam-se três novos livros que valem a pena manter debaixo de olho. O primeiro é Céu Nublado com Boas Abertas, o primeiro romance de Nuno Costa Santos, publicado pela Quetzal. O segundo é O Sexo Inútil, que Ana Zanatti publica pela Sextante e onde dá o seu testemunho sobre o conceito de “tolerância” em relação à comunidade LGBTI, com passagens do seu diário da adolescência. Já Luís Filipe Castro Mendes mostra o seu novo livro de poesia, Outro Ulisses Regressa a Casa.

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a resistência julian fuks

Quem gostou de “O Irmão Alemão” de Chico Buarque” também vai gostar da mistura entre a realidade e a ficção de “A Resistência”, do também brasileiro Julián Fuks.

Um escritor ansioso por se tornar rico e famoso. Um avião cheio de personagens literárias, com um bomba a bordo. Um pai criando um mar de livros através do qual a filha possa voltar para ele. O que fazem os escritores de festival em festival. Tudo isto e muito mais pode ser lido em Desnorte (Dom Quixote) uma coleção de 14 contos de Inês Pedrosa que chegam esta semana às livrarias. A apresentação está marcada para sexta-feira às 17h00, também no Cine-Teatro Garrett, em simultâneo com Os Navios da Noite, novo livro de João de Melo (Dom Quixote) e Narrativylirica, de José-Alberto Marques (Caleidosópio).

Para o último dia, sábado, às 12h00, estão reservadas duas apresentações de dois autores da América do Sul. O brasileiro Julián Fuks traz, via Companhia das Letras, A Resistência, misto de romance e de realidade do percurso da sua família e do seu irmão adotado num período conturbado da história da Argentina, pouco antes da instauração do regime militar de 1976. Depois, é a vez de o colombiano Héctor Abad Faciolince falar de Oculta, novo romance saído pela Quetzal e com o qual venceu recentemente o Prémio Cálamo, em Espanha.

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A Conferência de Abertura, que decorre no Cine-Teatro Garrett às 15h00 desta quarta-feira, vai ser conduzida por José Tolentino Mendonça e é o primeiro momento de conversa a não perder. O autor de A Mística do Instante falará ao público sobre “o silêncio dos livros“. Mais tarde, às 17h30, há uma conversa em torno do complexo tema “a literatura é uma catarse filosófica”. Os participantes estão à altura: à conversa vão estar Eduardo Lourenço, Hélia Correia, Manuel Alegre, Antônio Torres e José Carlos de Vasconcelos.

Depois do jantar, às 22h00, são os membros do Governo Sombra — Carlos Vaz Marques, João Miguel Tavares, Pedro Mexia e Ricardo Araújo Pereira — que vão estar a conversar perante o público sobre… Bom, não sabemos. A mesa em que participam chama-se apenas “Não me interpretem mal”.

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Carlos Vaz Marques, Ricardo Araújo Pereira, Pedro Mexia e João Miguel Tavares vão estar à conversa na Póvoa. © Carlos Manuel Martins / Global Imagens

Na quinta-feira, às 10h00, David Toscana, Harrie Lemmens, João de Melo, João Felgar, Rui Vieira e Ana Sousa Dias falam sobre uma questão que já quase todos se fizeram: “Como fugir ao que já foi escrito?“. Mais tarde, às 17h30, os escritores Inês Pedrosa, Julián Fuks, Luís Carlos Patraquim, Manuel Jorge Marmelo, Nuno Costa Santos e Pedro Vieira discutem a frase “Escrevo o que quero escrever, nunca escrevo o que quero“.

Destaque ainda para o debate em torno do pensamento “O escritor mente, o leitor acredita“, sexta-feira, às 22h00. A falar sobre este constante jogo entre realidade e imaginação vão estar Javier Cercas, Mário de Carvalho, Ana Luísa Amaral, Álvaro Laborinho Lúcio, Jaime Rocha e Carlos Quiroga.

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À frente do Cine-Teatro Garrett vai estar uma tenda com milhares de livros lá dentro. “São cerca de 20 mil”, garante ao Observador a organização, a cargo da Papelaria Locus. É nessa Feira do Livro que os visitantes podem encontrar, sobretudo, as obras dos autores presentes, embora também haja outros escritores representados nas prateleiras. A Feira do Livro vai funcionar durante todo o festival literário, ou seja, entre terça-feira e sábado, das 10h00 à meia-noite. Estão prometidos saldos que podem chegar aos 50%.

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Logo na terça-feira às 21h30 inaugura-se a exposição “O Mundo de Lobo Antunes“, um trabalho fotográfico de Ana Carvalho. “O momento decisivo foi quando, depois de ler na Visão a crónica “O encontro” (e que eu vi sempre mais como um desencontro), a relacionei imediatamente com uma fotografia que tinha tirado antes no pátio do CCB com dois vultos que se cruzam sem se encontrar”, conta a fotógrafa nascida no Porto, na descrição da mostra. Ou seja, à primeira vista, as imagens nada têm a ver com Lobo Antunes. É preciso tirar-lhe as camadas.

Em jeito de antestreia, Jorge Vaz Gomes apresenta na Póvoa a sua curta-metragem “O Quarteirão”, na quinta-feira às 17h00, no Cine-Teatro Garrett. Trata-se de uma adaptação livre do universo criado por Gonçalo M. Tavares na coleção intitulada “O Bairro”, que inclui pequenas histórias inspiradas em vários escritores do séc. XX, como Italo Calvino, Robert Walser e André Breton.

O programa inclui também a apresentação de fotografias de Daniel Mordzinski e estúdio de luz natural de Alfredo Cunha, uma exposição de Helder de Carvalho e a exibição de “A Morte de Carlos Gardel”, de Solveig Nordlund, filme baseado na obra homónima de António Lobo Antunes.

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O Cine-Teatro é a base de todo o evento e, pelo meio, será possível vislumbrar alguns dos encantos do centro da Póvoa de Varzim. Mas vale a pena partir à descoberta de mais. O programa não deixa os passeios de fora e é precisamente com um que começa o Correntes d’Escritas 2016. Às 11h00 desta terça-feira, Isaque Ferreira, João Rios e Rui Spranger vão dar poesia aos presentes, na Câmara Municipal. Depois é hora de partir até ao mercado municipal e à Rua da Junqueira, por exemplo, explica ao Observador o município. A participação é gratuita e não requer inscrição.

Já para as duas visitas culturais que se seguem é necessária inscrição prévia (no Cine-Teatro Garrett), pois os lugares são escassos. A primeira acontece na quinta-feira às 10h30 e, para além da passagem por diversos locais, inclui leituras de Alberto Serra e Aurelino Costa. Na sexta-feira, o passeio terá o bónus das leituras de textos de Mário de Sá-Carneiro por Isaque Ferreira. Ambas as visitas partem do número 35 da Avenida Mouzinho da Silveira.

Para além disso, haverá “Leituras sobre Rodas BMCar“, dando oportunidade de, através de um miniautocarro, todos os que quiserem participar numa visita cultural pelo concelho usufruírem de uma viagem com poesia, ao mesmo tempo que conhecem melhor a cidade.

Ilustrações de Amélia Lageiro e Andreia Reisinho Costa